Um dos aspectos paradoxais desta pré-campanha eleitoral é o desfasamento entre a capacidade de atrair eleitorado por parte dos candidatos presidenciais com um discurso mais populista e que compete, no seu justicialismo, com aquele tipo de conversa de mesa de esplanada contra os ladrões da política e a corrupção-assim-definida-por atacado.
Henrique Neto e Paulo Morais nem sequer podem queixar-se de falta de espaço mediático porque, nos últimos anos, ambos têm disposto (em especial o segundo) de abundante presença na comunicação social, jornais ou televisões, onde puderam repetir à exaustão a sua mensagem anti-sistémica e anti-corrupção que é muito do agrado da vox populi e que a mim também atrai, em especial quando se tem a coragem necessária para dar um passo adiante e deixar de se ficar pelas enunciações de princípios e referências vagas, que qualquer um de nós pode fazer.
E é isso que eu acho que falta a ambos. A capacidade para, após tantos anos de denúncias generalistas, serem capazes de levantar uma – uma só, que seja – lebre concreta e não se ficarem pelo que o chamado “cidadão anónimo” também poderá dizer, porque embora possam reflectir o que muita gente pensa, a verdade é que não trazem praticamente nenhum valor acrescentado ao bitaite de café. O que eles dizem, eu ou o meu prestável Joaquim das Couves podemos dizer.
Sim todos sabemos que as obras públicas, os contratos com o Estado, as intermediações de privatizações, as assessorias e consultorias, os escritórios de advogados, as administrações de empresas (ex-)públicas ou de grandes grupos privados são elementos de uma rede imensa de desaparecimento de dinheiros públicos em bolsos privados, perdas irreversíveis para o interesse público e factor determinante para a permanência de uma rede clientelar em torno dos negócios público-privados. Quase toda a gente sabe disso e agora já se podem ler alguns elementos bem identificados em obras de jornalistas de investigação. Em termos de arquitectura da corrupção, devemos, entre outros, a Saldanha Sanches, a Maria José Morgado e a Carlos Moreno denúncias feitas em tempo útil. O que nos falta é ir além disso e descobrir – ou fazer descobrir – as coisas antes de ela serem passado. E é nisso que eu acho que Henrique Neto e Paulo Morais falham, porque se parecem cada vez mais com carpideiras que choram qualquer defunto, repetindo até ao enfado o mesmo discurso – um pouco como Medina Carreira sempre com os mesmos gráficos – que agrada a quem berra por Justiça mas parece incapaz de fazer algo em termos pessoais, denunciando aquele tipo que ele conhece que rouba que se farta mas não digas a ninguém porque é amigo da prima do cunhado da minha tia. Ou seja, são uma variante de Marinho Pinto, mas com um pouco mais de civilidade.
É curto, muito curto, para quem pretende ser PR.
Sabe-se, grosso modo, o que esses candidatos não querem – que é, afinal, o que toda a gente diz não querer, corrupção, compadrio, favorecimentos… -, mas não o que querem, em termos políticos (que é aqui o essencial: não se trata de eleições para o DCIAP), para desempenharem o papel de primeiro magistrado da nação (não de magistrado do Ministério Público).
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