Dia: 22 de Maio, 2016
Uma História Como Outras
Esta foi conhecida há pouco tempo, próxima, não sendo de proximidade. A filha no colégio privado de elite, daqueles com propinas de muitas centenas, porque o plano é que vá para Medicina. O filho, que “tem menos capacidades” nas palavras de alguém da própria família, vai para a escola pública, porque não é preciso mais. E depois os professores discriminam, segregam e os especialistas querem igualdade de oportunidades e de resultados quando o darwinismo educacional começa em casa, sem traumas de separação de irmãos..
É um só um caso? Talvez…
Carta Aberta ao ME
Neste espaço não é (nem será) minha prática publicar, de forma mais ou menos regular, materiais alheios. Mas as regras têm excepções e uma dela é esta carta que a autora (MAria do Rosário Cunha) me enviou com autorização de divulgação: Carta Aberta MRCunha.
Consultores Científicos
Observo, abismado, a extensão da prática de apresentar consultores científicos em manuais escolares. No caso de História/HGP a coisa chegou ao 2º ciclo. Não vou criticar por aí além quem aceita dar a sua chancela e o seu nome para o efeito pois, afinal, sempre satisfaz uma certa vaidade e certamente dará algum crédito bancário. Sinceramente, critico quem acha (editoras, autores) que é necessário tal chancela para os seus projectos terem credibilidade. Se já no caso do 3º ciclo achava despropositado que aparecessem professores catedráticos a garantir que o manual estava em condições de usar (que raios, será que eles leram mesmo o dito cujo?), parece-me absolutamente delirante que isso aconteça com manuais do 2º ciclo que transmitem um nível de conhecimentos muito básico, que qualquer licenciado na área deveria dominar sem ter necessidade de supervisão científica. Mas os tempos andam propícios a tudo, neste ambiente de generalizada falta de confiança.
Com sinceridade, excepto casos de fidelização ou admiração académica mais extrema, não vejo qualquer professor com bom senso a adoptar este ou aquele manual por causa do(s) “consultor(es)” ou certificadores “científicos” exibidos na capa. Até porque, como também todos sabemos, a larga maioria não vê uma sala de 2º ciclo desde que foi aluno ou se, por acaso, teve de ir a uma reunião de encarregados de educação. E dificilmente saberá o que, no concreto, é um manual que funciona em sala de aula. Lamento, sinceramente, que existam autores que se prestem a esta menorização do seu trabalho e da sua competência, ficando só por saber se, no final, ainda não receberão menos pelo seu enorme trabalho (fazer um manual agora é produzir quase uma enciclopédia) do que alguém que apenas marcou um visto nas páginas (mesmo que seja meu conhecido e até amigo).
Jogo de Espelhos
A agitação corporativa em trono das escolas privadas com contrato de associação continua. São as vaias que, feitas por outros, seriam próprias de arruaceiros. É a preocupação com a angústia de uns quando se estiveram sempre nas tintas para de muitos outros. É até a hiperbolização dos efeitos numa linguagem dramática. Até uma muito divertida acusação de traição sindical, de que escapa uma FNE que se tem especializado em voar baixinho por estes dias.
Mas há mais, muito mais. Sendo que a mobilização tem ido buscar algumas menoridades locais e diversas personalidades infelizmente nacionais, na área do do PSD (aquele indescritível Duarte Marques, o Montenegro, mais uns quantos que aparecem a justificar apoios e dívidas políticas) e do CDS (aqueles jovens sóiferes e o Almeida, maus, tão mauzinhos que até custa ouvi-los, não por deles discordarmos, mas pela indigência do que dizem e escrevem), tudo com muita cobertura pelos articulistas séniores do Observador e pela artilharia ligeira da blogosfera de Direita que achou muito bem encerrar escolas públicas por significarem despesa desnecessária ou despedir professores (alegando que eram apenas contratados, no que me faz lembrar uma canção dos GNR que termina com mortos em lagos, mas que eram apenas gente no desemprego). Para as televisões, um Rodrigo Queiroz e Mello a desempenhar o seu papel de porta-voz da micro-corporação subsidiodependente, finalmente a merecer o que lhe pagam, com especialistas na rectaguarda a fornecer os dados e o argumentário truncado para a discussão.
Basta ver a enorme confusão que por aí vai com o custo relativo das turmas no ensino público e privado. Tudo depende dos valores que colocamos ou retiramos do cálculo, da estrutura do corpo docente, dos horários por prencher, da incidência de alunos com necessidades educativas especiais, das características dos edifícios, etc, etc. Já aqui publiquei que, se recebesse 80.500 euros por turma, o orçamento da minha escola seria superior em centenas de milhares de euros do que é. É errado agarrar em valores globais do orçamento, que incluem a estrutura administrativa do ME que serve públicos e privados, e dividir pelo número de alunos. Ou fabricar valores para o custo salarial dos professores, alegando regras contabilísticas. Tudo se tornou um simulacro estatístico da realidade, uma construção ocasional, com estudos feitos de forma mais ou menos manhosa, conforme quem encomenda e para que fim.
E agora pergunto eu: vale a pena debater mais este assunto com seriedade, quando do outro lado se aposta na histeria, na manipulação da miudagem, na diabolização das escolas públicas como destinos indesejáveis para gente que se acha acima do vulgo, como se fossem incapazes de – se lhes forem dadas as mesmas condições – prestar um serviço tão bom ou melhor? A mim já não apetece muito entrar em tais polémicas, quanto muito apontar o dedo às incoerências e desonestidades mais evidentes de gente que se destaca pela hipocrisia, cinismo e por uma falta de princípios só comparável ao excesso de interesses. Que também se encontra do lado de cá desta disputa, porque há gente do PS que agora bate no peito em defesa da Escola Pública quando fez beija-mão ao engenheiro e a MLR durante os anos em que a festa da Parque Escolar para amigos, projectistas e empreiteiros se fez à conta dos professores, para que tivessemos uma rede pública a duas ou três velocidades. A mim não dá especial gozo ver intelectuaisvitais e daniéisoliveiras a defender, de forma ocasional, uma posição que partilho. Porque tenho memória e sei do que são capazes só para agradar aos senhores do momento.
(e já alguém se questionou acerca de certas posições de autarcas do PS ou do próprio Galamba mais velho?)
Infelizmente, há poucos inocentes em toda esta estória. E são tão mais culpados quanto têm a falta de vergonha de se esconder atrás do interesse dos alunos.