Leio muita gente a defender que devemos reparar no “contexto” das afirmações de António Costa sobre a boa ideia que seria para os professores de Português aproveitarem a possibilidade de darem aulas em França, atendendo ao facto de terem pouco emprego em Portugal por causa dos factores demográficos. A declaração é praticamente igual à de Pedro Passos Coelho em finais de 2011.
De acordo com os teorizadores do “contexto”, quem não percebe as diferenças é burro, demagogo ou, mais simplesmente para os simplistas, “é de Direita” (sim, chegámos a este ponto raso de argumentação nestes tempos de maniqueísmo exacerbado) como li num grupo de professores de “uma rede social”. Em outros ambientes li que quem não percebe a diferença de “contexto” ou não sabe ler ou não sabe interpretar.
Pronto. Ponto. Final.
Discordo em grande parte.
Sim, o contexto é diferente: António Costa estava a falar em França, onde defendeu a língua portuguesa falando grande parte do tempo em francês (nunca vi governantes franceses a falar português quando nos visitam) e, ao que parece, feliz pelo facto de Hollande (esse vulto da coerência pessoal e política ao nível da palavra dada e das promessas assumidas) reconhecer a importância da língua portuguesa em França. Para além disso, António Costa estava a falar num momento histórico singular, em que o governo tem o apoio explícito e praticamente incondicional da maior central sindical de professores, em que nos querem fazer acreditar que cortar subsídios a 40 colégios é a maior medida de defesa da Escola Pública desde que o Egas Moniz ensinou o Afonso Henriques a assinar de cruz e em que, dizem os economistas optimistas, estamos num “novo ciclo” que se afirma de “crescimento”.
Realmente, o “contexto” é diferente, até porque Passos Coelho falava numa entrevista a um jornal, em recato, com poucos meses de governação e ainda um razoável estado de graça para Nuno Crato que se preocupara em “despachar” a questão da avaliação do desempenho docente (com assinatura de sete sindicatos e declarações de Mário Nogueira que, apesar de não assinar, afirmou para os professores se preocuparem com outras coisas e “seguirem em frente”) e ainda não fizera um décimo das tropelias que marcariam o seu mandato. Sim… é preciso lembrarmo-nos de que Dezembro de 2011 não é Dezembro de 2014 e que, por exemplo, o massacre dos professores de EVT acontecera ainda no mandato de Sócrates. E Crato só assumiu claramente que iria deixar de contratar muitos professores em entrevista ao Sol em Setembro de 2012.
A esta distância pode já tudo parecer-nos um borrão, com fronteiras indefinidas, mas há que saber – ainda – distinguir “os contextos”. Já para não falar da troika e essas coisas. O problema do “contexto” é que quando chamamos por ele devemos conseguir contextualizá-lo em termos de factos e datas. Não basta invocá-lo e dizer umas generalidades a propósito.
Que se entenda uma coisa: não estou a defender PPC que sempre se mostrou muito disponível para dizer disparates sobre Educação, área de que ele não percebe mais do que alguns assessores lhe dizem ser verdade. PPC é uma nulidade na matéria e nunca isso esteve em causa. O seu apelo à emigração dos professores para os PALOP fazia para ele(s) imenso sentido e até acredito que ficou chocado por não termos acolhido de braços abertos tão generosa sugestão.
Agora que também fique claro que espero que António Costa não esteja sempre a pensar que ainda está na Quadratura do Círculo e que pode dizer coisas que parecem giras que daí não há consequências práticas. Que ele tivesse dito que está a tomar medidas para redignificar a situação profissional dos professores de Português junto das nossas comunidades de emigrantes, que está a estabelecer acordos para a expansão da presença de algumas dezenas (centenas, muito dificilmente) de professores em França, tudo bem… agora afirmar que isso é uma janela de oportunidade de emprego ou algo parecido para as dezenas de milhar de professores no desemprego é de uma enorme demagogia.
Não foi isso que ele disse? Estou a ser radical? Não sei ler? Não sei interpretar e fazer a exegese de meia dúzia de frases bem claras e preciso que me explicitem o “contexto”?
Olhem que não, olhem que não…
Em breve serão marcadas “as reuniões do grupo técnico que existe entre Portugal e França para o alargamento da presença do português” como língua de aprendizagem nas escolas francesas, salientou o PM, que destacou que isto é obviamente muito importante para a difusão da nossa língua. É também uma oportunidade de trabalho para muitos professores de português que, por via das alterações demográficas, hoje não têm trabalho em Portugal e que podem encontrar aqui, mas é também um grande desafio para a nossa tecnologia e para a capacidade de fomentar o ensino à distância”, considerou, citado pela Lusa.
Em 2011, Passos Coelho foi criticado por ter mandado os professores emigrar. “Sabemos que há muitos professores em Portugal que não têm nesta altura ocupação e o próprio sistema privado não consegue ter oferta para todos. Nos próximos anos haverá muita gente em Portugal que ou consegue nessa área fazer formação e estar disponível para outras áreas ou querendo-se manter, sobretudo como professores, podem olhar para todo o mercado de língua portuguesa e encontrar aí uma alternativa”.
Foi numa entrevista ao Correio da Manhã que o actual líder do PSD deu conta da sua opinião sobre o tema. “Angola, mas não só Angola, o Brasil também, tem uma grande necessidade ao nível do ensino básico e do ensino secundário de mão-de-obra qualificada e de professores”, salientou Passos Coelho. O ex-primeiro ministro recusou depois que tenha convidado alguém a emigrar.
O que é preocupante para mim é que o “contexto mental” dos dois PM (um destro, outro canhoto, politicamente, claro) é muito semelhante. Quando se lhes ocorre singularizar um grupo profissional para emigrar do país parece só lhes ocorrer o dos professores. É com a melhor das intenções? Sim, sim… e o Inferno e tal.
Tem toda a razão. E que ensina Português ou Francês , ou foi leitor de Português, sabe muito bem que o Instituto Camões cada vez tem menos leitores em grande parte do mundo ( o português do Brasil é muito mais procurado pelos estudantes do superior), e, os professores para o Ensino Básico, pois…. a nova geração dos filhos de emigrantes e mesmo os que para lá agora emigram, querem é falar rapidamente o francês para se integrarem. Não por acaso, são muitos os casos que fui /vou tendo dos que partem ou partiram para a Suiça, Luxemburgo e se inscreveram nas escolas públicas desses países, tendo direito, como cá, os que vieram há anos da rússia ou países que foram da URSS, a aulas de compensação para apreenderam a nova língua.
Sim, o Costa disse o mesmo que o Passos Coelho e acredito mais depressa na ingenuidade deste, do que na de Costa. Não há pachorra.
Ironia última: muitas escolas públicas , que quando forem grandes querem funcionar como colégios, já oferecem aulas dadas em inglês ou francês pelos professores portugueses que, por razões diversas, saibam falar fluente/ essas línguas estrangeiras e zás, turmas de elite a terem a geografia, a história, a matemática, a serem dadas numa língua estrangeira. Não é mau. O problema é que poucas turmas mesmo dentro dessas escolas têm acesso a tal, formando-se as famosas turmas VIP’s, com muitos filhos dos …nossos colegas….. Eis a democracia no seu esplendor.
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E se fossem eles, os políticos TODOS a emigrar? De preferência para algum lugar muuuuuito distante?
Mas todos é mesmo TODOS! Já imaginaram como ficaria o nosso país sem políticos profissionais? E não me digam que é impossível, que precisamos muito que nos parasitem, blá-blá-blá. Tentem lá imaginar o país sem essa escumalha, só com gente a trabalhar.
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Esta história faz-me lembrar uma visita de Crato a Londres. Em Portugal circulou a notícia de que estaria na mesa a proposta de Portugal colaborar na formação de professores britânicos de português. O que imagino que aconteceu foi o ex-ministro ter feito a proposta e ter ouvido um “very interesting”, que em português significa “não faço ideia do que estás para aí a falar”. A proposta, claro, nasceu e morreu ali. Por razões várias, um governo britânico jamais apoiaria a promoção de uma só língua e nunca num modelo centralista (à medida da implementação do inglês no primeiro ciclo em Portugal). O contexto francês é diferente mas a situação não andará longe desta.
Quanto à emigração, é sempre um projecto pessoal. Dificilmente poderá ser um projecto político sustentável. Em última análise, é querer fechar o país.
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http://expresso.sapo.pt/internacional/2016-03-14-Portugal-quer-tirar-ensino-da-lingua-portuguesa-do-gueto-em-Franca
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Mas quem o meteu no gueto? Em França…. na Suiça… na Bélgica… na Alemanha?
Em 2006 já existiam problemas:
http://www.rtp.pt/noticias/pais/aulas-de-portugues-no-estrangeiro-vao-comecar-sem-atraso_n31348
Em 2009 eram 500 em toda a Europa:
http://www.dn.pt/arquivo/2009/interior/professores-emigrados-com-salarios-atrasados-1148888.html
http://www.acorianooriental.pt/noticias/ver/189494
Em 2015 eram 317:
http://www.tvi24.iol.pt/sociedade/jose-cesario/governo-reconhece-diminuicao-de-professores-de-portugues-no-estrangeiro
http://dnoticias.pt/actualidade/pais/517908-sindicato-mantem-greve-dos-professores-do-ensino-de-portugues-no-estrangeiro?quicktabs_2=2
Todos têm culpas no cartório. “Limpa” alguns de responsabilidades quem achar que deve.
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Por aqui… tudo na mesma!
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Até o regresso da lesma.
Ou de um dos invertebrados do costume, que nem o nome gostam de dar, de tão corajosos que são na “luta”.
Ó thierry ou tierry faz-te à vida.
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Acontece… principalmente aos invertebrados, coitados!
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Sabes que eu estou habituado a pau mandados, sabes? A tipos como tu que só fazem o que lhes manda. Vai à tua vida antes que choques com uma parede.
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Eu assumo que falei no “contexto”, porque me pareceu ter alguma pertinência para a análise. E explicito em que sentido eu referi essa variável: PC falava num contexto diverso do de AC, o de uma orientação governativa geral que defende o desemprego como medida estrutural para baixar o valor dos salários.
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Vou levar, Paulo.
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É sina…! Já em 1983, enquanto alunos, ficámos chocados com a predição de Malaca Casteleiro, no âmbito de uma conferência realizada no Anfiteatro I da Faculdade de Letras de Lisboa: ” aqui não vão encontrar trabalho mas têm essa possibilidade em África”.
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