Domingo, 31 de Julho

Dia de arrumações e reciclagem de papel, porque férias mesmo só a partir da próxima semana. Ao reencontrar alguns jornais com opiniões ou artigos meus desde 2008 reparei como pouca coisa mudou, como um tipo, mais coisa, menos coisa, anda a bater com a cabeça nas paredes há anos, para nada ou para muito pouco. Pelo que já se vai percebendo, as condições de trabalho nas escolas não vão melhorar em 2016-17 e penso mesmo que em algumas situações piorarão. O congelamento na carreira vai fazer um total de 8 anos nos últimos 11, sendo que já vamos em meia dúzia seguida, sem grandes espinhas ou dramatizações. A “agenda de lutas” continua a fazer-se de encenações e tudo está calmo em quase todas as frentes. por isso, em Agosto, passarei por este quintal apenas o essencial para não deixar secar as hortaliças ou quando algum transeunte mais ousado tentar saltar a cerca mais do que o aceitável.

Fiquem bem, fiquem à sombra, bebam muita água (ou outras coisas refrescantes) e não se deixem enganar pelos aspirantes indígenas a trump@.

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Não Convergência

Fiquei mais tranquilo ao saber que a Área Metropolitana de Lisboa decidiu, de forma unânime, manter a sua discordância (já expressa há mais de um ano) em relação ao processo de transferência de competências para as autarquias na área da Educação, incluindo as questões de financiamento enquadradas na medida 10.1 do Quadros Estratégico Comum dos Fundos Europeus Estruturais de Investimento (ver anexo XIII, p. 177), vocacionada para o apoio a “projectos” de combate ao abandono e insucesso escolar. Pelo menos por enquanto, por estas bandas, estamos livres de ir esmolar aos Paços do Concelho para este tipo de iniciativas. Eu que tão crítico sou do poder autárquico em algumas matérias, saúdo a quatro mãos esta divergência.

Thumbs

Desmitos

Em Portugal chumba-se muito? 89,6% dos alunos transitou em 2014/2015…

E eu nem me vou alongar na pura mistificação que é aquele cálculo que anda a enfiar pela goela abaixo de toda a gente sobre o custo das retenções… um valor completamente martelado por gente muito especializada em doutorada em investigações e políticas educativas à la carte para enganar os pategos.

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Muito Recomendável

A crónica de uma década de decadência de um tipo nos seus quarentas avançados, solteiro, desde os seus tempos de patrão de si mesmo num negócio geracional (dono de uma loja de discos) até acabar despejado, na rua, sem abrigo, passando pelo anos de subsídios de sobrevivência. Em França, como por cá. Neste caso sem muitos dos maneirismos nacionais quando os escribas se preocupam mais em mostrar-se do que em contar uma história. Faz lembrar, por analogia, o Nick Hornby, mas em mais cru.

É daqueles livros que um tipo começa a ler, para acompanhar o café numa qualquer fnac, e acaba necessariamente a passar pela caixa com ele. Já tem 2º volume em 2016 (este é de 2015), o que nem sempre é boa notícia, logo se vê.

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Envelhecimento

Respostas completas para a peça de Isabel Leiria, no Expresso de hoje, sobre o envelhecimento do pessoal docente.

– O envelhecimento do corpo docente tem manifestações visíveis nas escolas, quer na relação professor-alunos, quer no próprio desgaste/bem-estar/capacidade do professor no exercício das suas funções?

Sim. A combinação do envelhecimento com a diminuição da redução da componente lectiva por motivo de idade e tempo de serviço tem consequências graves, que só parcialmente podem ser minoradas pela maior experiência. O aumento da diferença etária em relação aos alunos provoca naturalmente uma maior estranheza, por exemplo, na própria forma de falar, no vocabulário usado porque, mesmo quando se tem filhos e netos com a idade dos alunos, há uma crescente divergência comunicacional. Há 20 anos, em algumas zonas do país, os alunos ainda conheciam uma série de termos e realidades que agora praticamente desconhecem, enquanto nem todos os professores conseguem acompanhar a aceleração da modernidade tecnológica e dos códigos linguísticos dos jovens. Isto perturba a comunicação, dificulta a relação pedagógica e introduz um fenómeno de insegurança nos docentes, por vezes mascarado pelo que pode parecer um maior distanciamento ou autoritarismo.

– Foi recentemente chumbado um regime especial de aposentação para os professores. Seria a solução boa para este problema? Acredita que algum governo tenha margem para avançar por aí atendendo à estrutura etária da sociedade portuguesa e aos custos que uma medida desse género necessariamente acarretaria?

Dizem os chavões da política que a governação é a arte de fazer escolhas e estabelecer prioridades. A Educação deixou de ser uma prioridade perante os imperativos da eficácia económica. Qualquer governo teria margem para introduzir um sistema de aposentação digno para os docentes se essa fosse a sua prioridade. Os encargos adicionais não seriam numa ordem comparável à de outras verbas consumidas para assegurar outros encargos do Estado. Até porque a entrada de professores mais novos, em início de carreira, fariam baixar sensivelmente as despesas correntes com o pessoal.

– Com o continuar dos professores em exercício por mais anos, a situação tenderá a agravar-se. Que consequências antevê?

O agravamento dos fenómenos de esgotamento psíquico, de burnout profissional, de absentismo por motivos de saúde e de degradação das condições de ensino na sala de aula, porque um professor que não está bem, só com dificuldade consegue assegurar as suas funções com a mesma qualidade que conseguiria há 10 anos (e a remissão para 2006 não é inocente). A dificuldade em lidar com situações de indisciplina, em assegurar a crescente carga burocrática que em nada na última década, apesar dos recursos digitais, muito pelo contrário e a menor disponibilidade para desenvolver práticas pedagógicas inovadoras e com algum risco reduzir-se-ão progressivamente.

– A redução em um quarto do numero de professores no sistema em 10 anos esteve longe de ser acompanhada por idêntica redução de alunos. As escolas ressentiram-se, nomeadamente em termos de apoio aos alunos ou havia também algum ‘desleixo’ na gestão e afetação de recursos humanos?

O alegado desleixo na afectação de recursos, evocado desde o ministro David Justino para justificar a redução dos professores em exercício, não justifica a forma como os meios humanos têm sido reduzidos e aumentada a sua carga de trabalho. Existia, mais do que desleixo, algum compadrio em práticas de clientelismo local que só residualmente foram controladas, pois nenhum dos modelos de colocação de professores conseguiu eliminar tais práticas, muito menos os que alegam a “flexibilização” das contratações como melhor forma de afectar os recursos. A redução do pessoal docente muito acima da redução de alunos é algo que foi denunciado sempre que cada ministra ou ministro o apresentou como argumento, mas a verdade é que o consenso existente nos últimos 15 anos para domesticar profissionalmente e proletarizar materialmente a classe docente foi transversal aos diversos governos, em alguns casos com a própria cumplicidade sindical em troca de outro tipo de entendimentos.

up+main

Para Fechar o Ano

No Público, a última versão de um texto já aqui publicado, mas que cujos temas acho importante sublinhar.

Educação: o processo de mistificação em curso

A médio prazo perceberemos que é um sucesso ilusório, mas então já os relatórios de gerência e contas estarão encerrados e ninguém será responsável.

PG PB

E os Outros?

Nunca o conhecimento deste tipo de traficâncias ficará vagamente completo se não quiserem que saibamos quem também recebeu (nada de milhões, bastavam 3000, quiçá 300, em espécie ou passeios por conta) para que ficassem calados, não noticiassem, fizessem parangonas, dessem prémios, abanassem o rabinho e estendessem a patinha, anos a fio, a estes senhores, que podem ser justos alvos da nossa ira mas que não podem esconder todo o rol de figurinhas que se acoitaram longamente na sua sombra e ainda hoje beneficiam do estardalhaço em torno dos que caíram em desgraça para que muito do mesmo pudesse continuar e muitos pudessem sobreviver.

O mais ridículo é ler por aí – nas afamadas “redes sociais” – quem ainda ande a tentar branquear parte da coisa, dizendo que para uns há provas de fraude e para o outro – o santo –  não há. Ou seja, benefício de dúvida selectivo, conforme a cor.

Lama

 

Desigualdade em Economia ou Educação

Saiu na Gradiva um livrinho de Harry Frankfurt (autor de um texto muito bom sobre a conversa de merda, a que chamamos treta quando não queremos ferir sensibilidades) acerca da desigualdade económica.

Para ele, mais do que nos preocuparmos em querer promover a igualdade ou em reduzir a desigualdade económica, deveríamos preocupar-nos essencialmente em reduzir a pobreza. O “conceito” é interessante, mas tem algumas limitações (são várias as críticas que lhe fizeram quanto à superficialidade da análise), visto que “pobreza” é um conceito relativo em muitos casos, quase tantos quanto aqueles em que é definida em termos de desigualdade em relação à riqueza e os mais pobres e os mais ricos são definidos, de algum modo, pela relação de grandeza estabelecida entre o topo e a base da hierarquia material.

Mas o que eu aqui queria destacar é que existe actualmente a tendência para importar “conceitos” e tendências da análise económica (mesmo que apenas filosófica) da Educação para a Economia e este é dos casos mais evidentes em que tal é desajustado. A tentação “liberal” para argumentar por analogia é que mais do que promover a igualdade ou diminuir a desigualdade, as políticas educativas devem diminuir a “pobreza educativa” leia-se “insucesso” ou “maus resultados” dos alunos).

O “problema – se é que o chega a ser – é que em Economia, a “riqueza” é algo sem um limite definido, pode ser sempre aumentada, pelo menos em tese, pelo que a eliminação da pobreza até pode acontecer – em tal perspectiva – ao mesmo tempo que aumentam as desigualdade socio-económicas (no fundo é a trse central associada à bondade dos efeitos da globalização).

Só que em Educação, a “riqueza” tem limites objectivos (100% de sucesso é algo dificilmente suplantável, assim como ter nível 5 ou nota 20 em todas as disciplina), pelo que a redução da “pobreza” implica mais tarde ou mais cedo a diminuição da desigualdade. Existindo um topo a cima do qual não é possível aceder, a subida da base leva a uma diminuição da desigualdade.

Parecendo que não, isto está relacionado de perto com as políticas de promoção agressiva do sucesso escolar e, como outra face dessa moeda, com a estratégia de alguma interesses privados no sector de reduzir o impacto dessas políticas ou de sublinhar as suas insuficiências. Ou seja: em primeiro lugar, se todas as escolas conseguirem atingir um sucesso pleno, ao desaparecer ou reduzir-se muito a desigualdade, desaparece ou reduz-se muito a capacidade de atracção das escolas que se consideram diferenciadas nesse parâmetro; em segundo, se esse acréscimo do “sucesso” for conseguido através de estratégias que levantem dúvidas, permanece o capital diferenciador de tais escolas.

Por isso é que eu acho que as tais políticas muito agressivas de imposição do sucesso escolar a todo o preço nas escolas públicas, se não forem baseadas em processos consistentes e focados na qualidade e transparência dos desempenhos e seus resultados, dificilmente conseguem prestar um bom serviço à Escola Pública e acaba por, mesmo que involuntariamente, manter (ou dar mesmo mais) créditos aos seus críticos e concorrentes.

WhiteFeminismTM1