Banalização

Esta tarde, alguém – psicólogo? – estava numa televisão a analisar a entrevista dos filhos do embaixador iraquiano e a afirmar que eles pareciam não revelar grandes emoções.

Sim, é verdade. Mas quem cresceu – mesmo que em berço privilegiado – num país em guerra (civil ou outra) permanente desde que nasceram, com mortes às dezenas por dia, dificilmente se emociona por ter desfigurado alguém que lhes dirigiu umas ofensas verbais e até acha que isso é uma reacção proporcionada e compreensível, como se depreende do comunicado oficial.

Fight

Idades

Acredito que todas as gerações tenham as suas razões de queixa em relação ao seu “contexto”. Mas parece-me justo que me preocupe ligeiramente mais com a minha, a dos nascidos a meio dos anos 60, que ainda foram educados à moda antiga, devendo respeito aos mais velhos, e que quando foi o 25 de Abril não tinham idade para fazer merda à grande a acabarem com ministros, deputados, comissários europeus, presidentes da UE ou dominarem décadas a maioria dos postos de comando do regime democrático (caramba, não se justifiquem sempre com os anos de fascismo que viveram… já foram pagos com créditos a triplicar pelas vossas fugas para Paris e Londres para respirar a liberdade enquanto os meus parentes iam respirar os esgotos dos bidonville ou o frio de toronto para não serem presos e ainda darem de comer à família). A minha geração é a daqueles que, chegando à idade, não se renderam ao oportunismo jotista dos coelhos e seguros, dos sócrates e dos pintos, entrando na idade adulta com o Bloco Central e o FMI em cima e apenas beneficiando do delicioso decadentismo da música dos anos 80 para esquecer os anos de ferros dos euromísseis e outras coisas animadas de então que davam sentido ao negrume dos joy aos bauhaus, dos clash aos cure, mas também aos delírios dos neo-românticos que não eram assim tão maus quanto pintaram os human league, os duran duran ou os soft cell, mesmo se quem se queria intelectual só admitisse ouvir smiths, echo ou o que o mec escrevesse que valia pena a ouvir por muito chato que fosse se alguém falar em durutti column eu nego, que até tenho o vinil de estreia da virgínia astley que, não, não é parente da laura sem t dos trapinhos de marca).

A verdade é que já andamos todos pelos 50 e quem se manteve numa linha não cartonada sente que agora já se tornou arcaica e anacrónica, quase a fazer parte de uma amaldiçoada geração grisalha que atrapalha os orçamentos feitos para salvar bancos e pagar a consultores da geração seguinte, em especial a dos que já se tornaram especialistas em gestão e finanças para engabelar o povoléu com aeroportos e têgêvês a darem quase tanto dinheiro como se fossem mesmo feitos. E começamos a sentir-nos um “fardo” que entrava o “rejuvenescimentos” da economia e, muito em especial, dos serviços públicos onde há quem acuse de nos termos refugiado em vez de nos tornarmos empreendedores especializados em criar empresas destinadas a falir depois de absorvidos os subsídios.

E agora, sem o estatuto de senadores que foi monopolizado pelos anarquistas e farroupilhas de outrora, aquel@s que eram contra os privilégios e as castas, ainda temos de aturar a ascensão arrogante da geração dos que nunca assumem a responsabilidade por nada, a não ser o direito a tudo.

Se isto é conversa de velho, recorrente em tos aqueles que sentem que o tempo está a começar a atropelá-los? É bem possível que sim, só que antes era feita por gente bem mais velha e agora nem nos vale que os 50 sejam os novos 40 ou 35, porque isso parece que só é válido para as retocadas das capas de revista e os seus pares, servos do ginásio (muito comum nos ainda aspirantes a algo da classe média descendente) ou escravos da banda gástrica.

Descontam-se aqui (desculpem lá, amig@s, que sei que @s há por aí) os que acham que ser jovem é ir todos os anos a um concerto dos xutos, fumar um charrito na feira da atalaia ou andar de bicicleta ao fim de semana com lycra flamejante. Nada contra, desde que não nos confundamos.

Imunidades

Existem demasiadas, não apenas as diplomáticas. Rimam com impunidades. Em todo o lamentável caso de Ponte de Sor, julgo perceber o que se tenha passado, mesmo sem recolhas periciais. Até acredito que os iraquianos tivessem razões para se sentir incomodados com eventuais parvoeiras racistas de 3º escalão de frequentadores noctívagos, quase imberbes, de bares de província (ou de cidade).

Agora o que é inaceitável é que queiram fazer passar por “legítima defesa” um acto premeditado de agressão, em que vão buscar um carro para se poderem vingar de um dos elementos do grupo que os terá assediado. A “legítima defesa” corresponde a um defesa, no momento, perante uma agressão. Não a ir buscar, depois das ocorrências, os meios para se vingarem. Tratou-se claramente de uma “vingança”. Mais valia estarem calados se era para nos fazerem passar por estúpidos. Embora seja verdade que, talvez por viverem cá há algum tempo, terem achado que é assim que os “imunes” e impunes actuam por cá.

Alcatrao2