Marketing e Encenação

O CDS fez uma excelente estratégia de marketing ao convidar Maria de Lurdes Rodrigues para a sua “escola de quadros” porque o que seria um não-acontecimento ganhou dimensão mediática nos noticiários. Já Maria de Lurdes Rodrigues demonstrou até que ponto é capaz de ir na defesa do seu “legado” e na tentativa de condicionamento do PS em matéria de Educação, anos depois de ter saído da pasta.

Perante a mini-polémica em torno desta “participação especial” assistimos a duas estratégias de justificação. A abrir, MLR sentiu-se na obrigação de dizer a abrir que ia apresentar as suas ideias que são conflituantes com as do CDS e ainda defender algumas medidas (ou “reversões”) deste governo. A fechar, Adolfo Mesquita Nunes sentiu necessidade de dizer que, sendo “uma escola de quadros”, o convite destinava-se a levar alguém com quem o CDS não concorda e com quem seria possível confrontar as boas ideias do seu partido. Ou algo parecido, pois não achei ainda as declarações sem ser nuns segundos televisivos. Pelo meio, MLR declarou que, em tempos de maioria relativa, devem ser feitos “compromissos” e serem alcançados consensos. Ora… eu julgava que esses “compromissos” e consensos já terão sido feitos e alcançados com o PCP e o Bloco para que o governo tenha apoio maioritário no Parlamento. Pelo que percebo, MLR fala de outros compromissos, mais à Direita. O que não me espanta.

Ora bem… o que eu gostava aqui de analisar brevemente é até que ponto o CDS e MLR não estão de acordo em muito e até que ponto o governo PSD/CDS manteve mais do “legado” de MLR do que aquilo que, em seu tempo, “reverteu”.

Sem ser exaustivo, eu diria que o governo de que o CDS fez parte, com representantes na equipa do ME, “reverteu” apenas as Novas Oportunidades e o ritmo das obras da Parque Escolar, tendo introduzido como medida radicalmente nova as “provas finais” do 4º ano, maior motivo de polémica no mandato anterior.

Em contrapartida, o governo PSD/CDS manteve muitas das políticas herdadas dos mandatos do PS ao nível da redução da rede escolar e da sua concentração macrocéfala, acentuou processos de emagrecimento curricular destinados a reduzir o número de docentes (manutenção da separação EV/ET e do fim do par pedagógico), manteve o congelamento das progressões na carreira docente e toda a matriz do modelo de avaliação do desempenho docente, assim como o modelo único de gestão escolar. Em alguns casos, aproveitou a legislação já existente e aplicou-a como aconteceu com os casos da PACC e da mobilidade docente, assim como a própria BCE apenas veio agravar disfunções no concurso de professores que pré-existiam.

Fazendo um balanço, repito o que já afirmei várias vezes… indo além das aparências e de um par de medidas mais discordantes, o mandato de Crato prolongou a generalidade das medidas tomadas quando MLR foi ministra. Recordemos ainda que no caso de apoio ao ensino privado, os cortes decretados em tempo de governo do PS foram durante o mandato de Isabel Alçada e não no de MLR.

Pelo que a ida à “escola de quadros” do CDS não é algo assim tão fora do normal quanto se poderia pensar. A encenação do conflito tem sido uma parte essencial da degradação do debate político, com o exacerbamento das discordâncias em público a ocultar a convergência real de muitos dos objectivos da acção governativa. Em especial na área da Educação. Eu sei que há muita gente, a começar por pessoal ligado a sindicatos outrora aguerridos na luta, a dizer que discorda desta análise. Mas, como já disse, o que por aí há mais é encenação.

PALCO DE CAIXA DE PAPELAO

7 opiniões sobre “Marketing e Encenação

  1. Encenação barata.
    Verdade se diga o PSD e o CDS adoram a BRUXA.
    O saco de batatas com olhos continua ai…
    Qual confronto de ideias, qual quê? Tudo farinha do mesmo saco…

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  2. ” acentuou processos de emagrecimento curricular”! Exato! E com uma aberração extraordinária: programas que deveriam ser leccionados em 180 minutos semanais, a serem-no em 150! Em nome da autonomia da escola, uns alunos dão o mesmo programa em x horas, outros da escola ao lado dão em x+30minutos semanais! !!! Que aberração é esta! ? Programas submetidos a exame a nível Nacional.

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    1. Pois foi! O mesmo aconteceu com as opções do 12º ano: diminuiram a carga horária e nem se deram ao trabalho de adaptar os programas. Deixaram isso ao crit´rio de cada um. Porquê: porque tais opções serão, na opinião do Dr. Crato, na esteira da D. Lurdes e do Sr. Walter Lemos (este senhor, com uma só portaria adulterou completamente os currículos do ensino secundário!) perfeitamente dispensáveis…

      A propósito: como se diminui um currículo sem grande oposição (a não ser dos diretamente prejudicados? Primeiro lança-se uma campanha a dizer que “as crianças estão muito sobrecarregadas”, “os alunos do 12º ano não têm tempo para estudar e preparar os exames”, as disciplinas técnicas são “uma perda de tempo, nas empresas ensinam tudo”. Depois, eliminam-se uma data de disciplinas e dá-se uma horita mais ao Português e à Matemática, que são a única coisa importante. Ao mesmo tempo multiplicam-se os “referenciais” de “educação para”: a Saúde, a Educação Financeira, a Educação Rodoviária, a Educação para os Direitos Humanos, etc. etc.

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  3. Um reparo: as “Novas Oportunidades” não sofreram uma reversão assim tão grande. Inicialmente, assim como todas as outras modalidades de educação de adultos (Ensino Recorrente, Cursos EFA, …) os processos de RVCC – Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências – foram apenas paralisados. Primeiro, através do encerramento dos Centros Novas Oprtunidades através de um processo perfeitamente ilegal, que deu origem ao primeiro despedimento coletivo em larga escala do setor público (e, nessa altura, não vi os promotores dos “amarelos” indignarem-se muito. Nem os outros, por acaso…). Depois, transformou-se a Agência Nacional para a Qualificação (ANQ) na Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional (ANQUEP) e nomeou-se para a dirigir um senhor cuja missão, ao que consta, seria o de liquidar o RVCC, a mando do Dr. Crato, o que encontrou naturais resistências dentro da Agência. Publicou-se, então, uma portaria onde: 1) se criavam os CQEP (Centros para a Qualificação e o Ensino Profissional), que alargava as competências e obrigações dos antigos CNO ao infinito, diminuindo, ao mesmo tempo, significativamente os seus recursos humanos e materiais; 2) se alterava o processo de RVCC no sentido da sua “credibilização”. Através de quê?

    Adivinharam: exames, escritos e orais no fim do processo!…E, para evitar facilidades, as provas teriam de ser elaboradas segundo matrizes da competência da ANQEP. Que nunca as fez. E porquê? Porque quem tem contacto com o processo sabe ser impossível. Como se pode elaborar uma prova de exame se não existem conteúdos programáticos nem objetivos de aprendizagem e as competências a validar variam de formando para formando, segundo a sua experiência de vida?

    Sim, porque todo o restante processo se continuou a desenrolar como dantes: elaboração de portefólio, que seria analisado segundo os mesmíssimos referenciais do tempo das “Novas Oportunidades”.

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      1. A massificação certificadora foi, efetivamente, travada, mas apenas porque o novo programa arrancou aos soluços e também porque, na minha modesta opinião, já não há assim tanto público interessado no processo e, o que existe, é mais fraco do que o que inicialmente acorria aos Centros. Atenção que a lógica da massificação continua presente, por exemplo, na fixação de metas, sob pena de corte de financiamento.
        E atenção também ao que aí vem! Já existem uns projetos-piloto que envolvem, entre outros, o grupo Sonae e os centros de formação da UGT que transportam o processo para as empresas. Vai ser uma certificação pegada, e desta vez em termos profissionais, o que pode ser muito perigoso em determinadas profissões (por exemplo certificar como eletricistas caroqueiros que apredenderam “de tarimba”).

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