Dia: Outubro 23, 2016
Preconceito Pessoal
Tenho-o em relação à multiplicação de grupos de trabalho e estruturas de missão que se criam para apresentar propostas maravilhosas em relação a diversos problemas que estão inter-relacionados e que assim passam a ter propostas que raramente batem certo umas com as outras, como que em forma de manta de retalhos.
Temos hoje mais uma investida em torno do Ensino Especial, matéria que eu acho merecer um pouco mais de decência do que falar em inclusão quando se pratica o contrário. E nem vos quero dizer quanto me agonia a demagogia de, quando as coisas apertam, recorrerem àquela governante invisual para dar uma espécie de legitimidade acrescida às posições que querem impor.
Vejamos uma coisa: o Ensino Especial, a Educação Especial é uma área que, pelas suas características específicas de apoio muito individualizado aos alunos, é naturalmente cara. O “custo unitário” de cada um destes alunos é muito mais elevado do que de uma aluno “regular”. Por isso, quanto mais se incluem estes alunos nas turmas regulares, com menos apoios em pequeno grupo ou individualizados, mais baixa esse “custo”.
Há muito poucos meses atrás tivemos direito a uma barreira de propaganda em torno da bondade da solução de os incluir o tempo semanal quase todo nas turmas regulares, porque o contrário seria praticar a discriminação ou a exclusão. E, pelo caminho, levantaram-se dúvidas (como no passado) acerca da forma como os professores e outros técnicos envolvidos no procedimento de sinalização e elaboração dos chamados PEI (programa educativo individual) ou CEI (currículos específicos individuais) tratariam esses processos. Assim como voltou aquela dúvida existencial sobre o facto de, ao que parece, termos valores acima da média europeia ou da OCDE de alunos com este tipo de necessidades, como se uma média deste tipo fosse obtida somando valores todos iguais e dividindo pela imbecilidade de certos analistas, que essa é infinita.
Ao mesmo tempo, assistimos à promoção de planos para o sucesso educativo que, em grande medida, promovem a criação de grupos de nível dentro das turmas, com alunos que se considera terem perfis ou patamares de desenvolvimento homogéneo (alto ou baixo), que podem mesmo sair das turmas durante períodos de tempo variáveis para trabalharem com os seus pares, sejam de mais alto rendimento ou mais baixo desempenho. Ou seja, o que antes seria uma estratégia discriminatório, exclusiva e eventualmente atentatória da auto-estima de boa parte dos alunos, torna-se uma prática recomendada e quase generalizada, caso as escolas e agrupamentos quisessem meios adicionais para a coadjuvação em sala de aula ou outras estratégias de combate ao insucesso escolar.
O que temos agora? Uma tentativa de reformar de novo o modelo de enquadramento das crianças com nee, mas numa perspectiva de voltar a reduzir os apoios específicos, neste caso sendo o principal alvo as unidades especializadas de apoio a alunos com dificuldades específicas:
O que o David Rodrigues afirma em tom de denúncia exigiria uma monitorização do funcionamento dessas unidades e não a reformulação do funcionamento de todas, de acordo com a lógica do levam todas pela mesma medida. Para além de que me parece que continua completamente ausente toda e qualquer consulta às preferências dos próprios alunos e famílias. Como DT de uma turma com quatro alunos com nee e muitos anos de trabalho com estes alunos (o meu recorde está em 8 alunos ao abrigo do então chamado “319” no meu ano de profissionalização, como DT), sei o quanto eles apreciam os espaços que sentem como ser seus, achando que isso é um direito especial, uma espécie de privilégio, e não um gueto. Sendo que, em diversas situações, a sua permanência quase forçada com o resto da turma em algumas aulas é encarada como algo pouco apelativo ou mesmo vantajoso.
Mas voltando ao essencial da incongruência deste tipo de propostas, atiradas para a comunicação social a ver no que dá, que críticas suscitam e que reacção tem a opinião pública (sendo que nestas matérias quase não reage), temos que se quer praticar uma espécie de “inclusão à força”, reduzindo estruturas, técnicos e pessoal docente ligados à Educação Especial, e os professores “regulares” que mostrem o que valem, mesmo que isso seja feito sem o diagnóstico precoce das situações mais complicadas ou o apoio de pessoal técnico (terapeutas, psicólogos) com tempo para elaborar os tais “planos específicos” sem ser a chamada chapa 5.
Acho fantástico que se afirme que se pretendem respostas “individualizadas”, mas sem querer “dar muito enfoque à deficiência ou à Necessidade Educativa Especial”, preferindo dar “às medidas de apoio à aprendizagem que permitam que determinado estudante aprenda. O objetivo da escola é ensinar”. O que eu não percebo é como posso eu delinear medidas de apoio se não souber exactamente o que é para apoiar ou que problema existe a resolver.
Agora reparem no paradoxo que é afirmar tudo isto e a peça terminar com a afirmação de que “medidas comuns a todos os alunos, como a anunciada flexibilização dos currículos, também são encaradas como essenciais”.
A sério? As “medidas comuns a todos os alunos” são essenciais para o apoio “individualizado”?
Andamos a brincar com as palavras? E com a vida escolar destes miúdos?
E chamam a isto “inclusão” e invocam a declaração de Salamanca e mais uns quantos documentos que nem sempre dizem aquilo que nos querem fazer passar como sendo a verdade única e absoluta. A menos que seja na parte seguinte:
Neste particular, traria aqui a posição da Pin-ANDEE sobre a recente legislação relativa aos subsídios da Educação Especial: