O Magnânimo

Rui Rio é, claramente, alguém que se considera predestinado. Mesmo não compreendendo bem a base do regime democrático liberal, representativo, em que o poder dos governos e dos legisladores emana dos eleitores e não o contrário, ele lá vai falando porque há alguém que o quer promover e a sua vaidade é imensa. Portanto, meu caro, os governos não dão direitos aos cidadãos. Insustentáveis para si ou quaisquer outros. Os cidadãos é que deram, por via eleitoral, o direito a alguns políticos para governarem. Se fizeram porcaria da grossa ao renderem-se aos interesses da elite “empreendedora” nacional, a começar por banqueiros de vão de escada, se fizeram nomeações e negócios desastrosos no sector público ou se tomaram decisões a contar com empregos futuros, à custa dos interesses da maioria da população, é toda um outro assunto. Se o Assis montou uma carreira a partir de umas chapadas mal recebidas, este montou a sua sobre a sua oposição ao pintodacosta. Não chega.

orio

Bloqueio

Como seria de esperar o duopólio editorial na área dos manuais escolares declara o seu bloqueio à questão da reutilização. Não me interessa agora se a razão está parcialmente do seu lado ou se eu defendo antes que essa reutilização nunca deverá ser obrigatória, muito menos se eu adquirir os manuais com o meu dinheiro. O meu problema é que ao longo das últimas duas décadas se tenha permitido que dois grandes grupos tenham conseguido dominar quase por completo qualquer concorrência nacional, num processo de concentração que, se escavarmos um pouco terá servido alguns interesses, mas certamente não o das próprias “leis do mercado”. A cartelização deste sector há anos é uma evidência que só não vê quem não quer. Assim como não verão as conexões existentes entre o mundo editorial e o  mundo da política. Que eu até considero normais na medida em que é assim que funcionam os interesses privados que pretendem ter influência nas políticas públicas. E estou bastante à vontade para o afirmar porque já publiquei pela Porto e por uma chancela pertencente à Leya, embora não manuais escolares (já o fiz, pela Texto, mas há quase um quarto de século). E não sou parvo ao ponto de achar que seria apenas pelos meus belos olhos e escorreita prosa. Há quem enfie esses barretes, mas no meu caso, sei o momento em que a cabeça se deve desviar.

Dito isto e resumindo … independentemente da minha posição sobre a forma como os manuais devem ser usados pelos alunos num país de atraso educativo em muitos ambientes familiares, acho perfeitamente inaceitável que se tenham deixado crescer dois impérios que podem bloquear a acção governativa como, por exemplo, não o conseguiu quase toda a classe profissional dos professores.

passagemdenivel

American History X

Há quem goste imenso de nos esfregar na cara com a excelência da qualidade do sistema de ensino americano, até chegarem ao momento em que dizem que o povo americano é estúpido e mal educado. Embora tenham votado em Trump pessoas de todas as condições económicas e não apenas pobres e pouco letrados ou ricalhaços ignorantes. Há quem ache que o sistema americano é o maior exemplo de democracia para o mundo até perceber que quem tem mais votos pode não ganhar (e não apenas não governar), pois é um sistema indirecto com um colégio eleitoral à moda do liberalismo burguês e racista de finais do século XVIII e início do século XIX. Mas também é verdade que há gente que anda por aí a afirmar a sua imensa repulsa quando, lá bem no fundo, são apenas trumpinhos só que sem balls para o assumir.

Como complemento, veja-se um dos grandes filmes do século passado sobre a realidade da América profunda, por muito que nos desagrade, tão legítima quanto a que lê o NY Times a tomar descontraídamente um latte, enquanto planeia o jogging de fim de dia no Central Park, antes de ir a um memorial do Cohen.