Brisas e Ventos

Li com desgosto a última crónica do José Vítor Malheiros no Público. Porquê? Porque, não o conhecendo, era uma das permanências no jornal que me faziam lê-lo, concordando (na maior parte das vezes) ou discordando (menos vezes). Não era a maior concordância que me fazia estimar o que escrevia, mas a transparência e seriedade das ideias e da escrita, mesmo quando discordava. O fim da sua coluna de opinião é apenas mais um dos sinais dos tempos numa comunicação social em fase de novo reajustamento, financeiro e não só.

Ao longo dos anos, mantive uma relação mais regular (2008-10) ou esporádica com alguns órgãos de comunicação social, escrevendo, comentando ou respondendo ao que me perguntavam. Nunca me ofereceram nada por isso, para além de espaço para a voz, nem eu nunca lhes pedi fosse o que fosse em termos materiais. Apesar de maior ou menor afinidade com as pessoas com que contactei, tive sempre a mesma atitude de confiança, em alguns casos construída com o tempo, apesar deste ou aquele percalço. Sempre fui tratado de forma justa, com minúsculas excepções, quase sempre com origem na mesma publicação, e em, ao que me pareceu, estagiários apressados e assoberbados pela pressão editorial para se lembrarem de indicar onde tinham recolhido a informação, dando assim a sensação de ser sua a pesquisa colhida algures. Tudo pacífico, nunca me queixei. Muito pior é quando consagrados o fazem com a regularidade de quem está habituado a colher fruto em pomar alheio., mas

Tenho uma paixão imensa pela letra impressa e a comunicação social foi a minha segunda ou terceira opção quando me candidatei à Universidade. Fiquei na primeira, a História, apenas porque é a que alarga mais o campo da pesquisa e compreensão do presente. Mas continuo a ter uma veneração imensa pela boa informação, pelo jornalismo de qualidade, por jornais, revistas, tudo o que tem letras impressas e se publica com regularidade. Quem conhece o meu escritório e a minha casa sabe o que eu acumulo de papelada de que sou quase incapaz de me separar,  de um modo quase doentio. Por isso mesmo, foi com tristeza que ao longo dos últimos anos fui cada vez comprando menos jornais e revistas, deixando mesmo de assinar ou adquirir com regularidade publicações que comprava há décadas ou mesmo desde a fundação. Porque me cansei de ver os cordelinhos cada vez mais grossos a mexer quase tudo. Não por existirem esses cordelinhos, sempre existiram ou existirão. Nem sequer quanto à orientação ideológica que os move, porque nunca fiz essa distinção nas minhas colaborações. Mas porque cada vez é tudo feito com menos pudor, com mais desfaçatez, com menor preocupação com uma aparência de qualidade, alegando-se questões financeiras.

A cartografia dos alinhamentos é demasiado clara, os estratagemas e os encobrimentos cada vez menos tímidos: ler gente a escrever de forma crítica sobre o sistema financeiro que bajulou anos a fio é apenas uma das escamas visíveis do bicho deitado no tal pântano. Aquele que oculta as revelações, quando as revela com pompa. Que investiga depois de sabido o desfecho. Sempre existiu, sempre existirá. Em Educação, já sei que grupo tem os exclusivos do ME, que jornal tem a linha directa para o grande líder das lutas, que publicação faz parceria com o CNE. Não está em causa a seriedade d@s que ainda sobrevivem e fazem o seu trabalho com a seriedade que caracterizava o José Vítor Malheiros. O problema é que são cada vez menos, cada vez estão mais estrangulados e condicionados. Como eu @s compreendo pois, como professor, passei por algo um pouco semelhante. Resiste-se, mas quase se desiste.

Por vezes, não há mesmo forma de contrariar os falsos zéfiros que tudo levam adiante.

zefiro