Alguns dos principais factores de stress individual relacionam-se com o trabalho, desde a sobrecarga de tarefas à ausência de controle sobre aquilo que se faz, como a não participação no processo de decisão sobre o futuro, a desconfiança em relação aos pares e à hierarquia, não esquecendo um modelo de gestão demasiado agressivo (uma introdução muito ao de leve aqui). Isso e muito mais, mas bastam alguns destes elementos para se perceber que os níveis de stress profissional entre a classe docente aumentou de forma muito significativa nos últimos 10-15 anos. Já sei que isso é motivo de orgulho e satisfação para alguns que acham que nos devemos sempre nivelar pelas piores (que eles afirma “eficazes”) práticas de gestão dos recursos humanos e das organizações (porque acham que as escolas podem ser geridas como fábricas de parafusos).
Não quero perder tempo a voltar às origens deste ambiente que todos sabemos quando cresceu e foi induzido voluntariamente como essência de um projecto político para a Educação em conflito aberto com os professores. Quero, por agora, apenas reforçar que, salvo um curto período (ali pela algo equívoca pausa correspondente ao mandato de isabel alçada e início do mandato de crato… sim, sei que esta cronologia não será partilhada por alguns indefectíveis geringonceiros), esses níveis de stress, ansiedade profissional, resultado de uma permanente instabilidade, não diminuíram com o tempo e, em alguns aspectos, até aumentaram com a irritante mania que quase todos os governantes (ministros ou, no caso presente, secretários de Estado) têm de querer deixar a sua marca pessoal para a posteridade com um pacote de novas mudanças a despachar rapidamente em 2-3 anos.
Sim, não queremos o Crato de volta (no meu caso, não é por causa do “exame da 4ª classe” mas por ele ter levado uma lavagem ao cérebro em poucos meses de permanência na pasta por parte de um grupo de pressão com uma agenda de interesses bem estruturada que conseguiu diversas concessões em pouco tempo) com tudo o que foi a governação Passos/Portas em matérias económicas, mas… sabendo eu que a Educação nunca será causa de fractura na coligação de esquerdas que suporta o actual governo, não gostaria de sublinhar que se o ministro Tiago é uma espécie de rosto pacífico e cabeça falante com um discurso quase sem arestas para funcionar como soporífero geral (com forte colaboração de um sindicalismo cada vez mais xanax, excepto nos dias em que falham a toma do supositório), não deixa de ser verdade que em apenas dois anos lectivos a regra é a da manutenção da reforma/revolução permanente).
Já ia o ano de 2015/16 em decurso quando se soube que as provas finais do 4º e 6º ano iriam desaparecer. Ainda era o 1º período, vá que não vá. O problema foi a espera pelo “modelo integrado” de avaliação externa dos alunos que só apareceu vários meses depois e com dúvidas sobre a possibilidade das escolas o implementarem logo ou não. Não esqueçamos que se estava a um mês das provas e não se sabia se iriam ser deferidos os pedidos para não fazer as novas provas de aferição. Eliminaram-se focos de conflito espúrios como a PACC, mas para quem estava efectivamente nas escolas pouco ou nada mudou, até que, mesmo a acabar o ano lectivo, fomos verdascados pela promoção do sucesso e a necessidade de fazer planos locais de sucesso, de melhoria, definir novas metas para o sucesso em cima das que já existiam (nomeadamente no caso de escolas e agrupamentos com contratos de autonomia), novas metodologias e planificações, com especial atenção nos 1º, 5º e 7º anos.
Chegamos a 2016-17 e qual é o novo cardápio? Na sequência de uma daquelas consultas públicas de que já se sabe o resultado, foi perguntado aos professores se achavam que as metas de Crato eram exigentes e se os programas estão muito longos? Claro que quem respondeu afirmou que sim, mal era se dissessem que tinham tempo para tudo. Não perceberam que o objectivo não seria obter um equilíbrio entre metas mais realistas e o tempo para as alcançar, mas sim reduzir o currículo, comprimindo-o para competências “essenciais”, parte delas a desenvolver fora da sala de aula, ou seja, reduzir os programas com redução dos tempos lectivos e aumento de outras coisas, a perceber quais. O que significa, em cruzamento com um bem disposto perfil de competências do aluno (no 12º ano) para o século XXI, que já se percebeu que teremos de refazer muito do trabalho desenvolvido há menos de um ano para os 1º, 5º e 7º anos, pois parece que o Secundário está, por agora, livre da coisa. E, com Março já entrado, percebe-se que anda barro a ser atirado à parede para a comunicação social e para alguns canais privilegiados de comunicação na classe docente, no sentido de perceber onde é que uns cortes podem ser feitos, umas semestralizações apresentadas como sendo do interesse dos professores (sim, como me dizia um colega, iremos adorar repetir tudo em dois momentos do ano, em Setembro e em Fevereiro, à pressa, pois é de um interesse do camandro).
E cá estamos, mais uma vez, para lá de meio de um ano lectivo, sem saber o que se irá ter de refazer, replanificar, reconceptualizar em termos de “projecto” (é o mantra da malta formada sob a batuta das “inovações educacionais” do benaventismo), ao mesmo tempo que se percebe que o rejuvenescimento da classe docente é apenas um pretexto para criticar e não para renovar os quadros, que se confirma que aquilo do combate aos contratos de associação foi resolvido com contrapartidas à custa dos mexilhões contratados, que a vinculação é uma coisa cada vez mais extraordinária, que a reposição dos salários é uma treta (continuo a ganhar bem abaixo do início das sobretaxas socráticas e passistas) e o descongelamento uma miragem, mesmo se continuamos obrigados a fazer “formação” que, se for oferecida pelos formadores lhes garante um Muito Bom no desempenho, mesmo se derem umas aulas de m€rd@, pois é assim que se recompensa quem colabora com o modelo (efeitos a contar a partir de Janeiro de 2016, claro, que é para apanhar todos os que andarem a espalhar o verbo do verdasca pelo país).
Sim, claro, já sei que há quem ache que isto está muito melhor e até seja capaz de apresentar uma lista enorme de coisas que em nada influenciam positivamente o meu quotidiano ou significam uma redução real dos factores de stress docente de quem efectivamente tem de implementar todos os sonhos húmidos do mais recente governante em trânsito para um cargo mais importante daqui a uns anitos.
Pessimista? Má língua? Velho do restelo?
Pelo contrário, pelo contrário… achar que algo está mal sempre nos dá a esperança que melhore. O rai’s parta é que há 10 anos que espero por um qualquer dom sebastião (não confundir com aquele gajo do observatório que só observa quando tem verba dos mesmos do costume para observar aquilo que deve ser observado) não interessado apenas nos seus cortesãos.
O mais com menos veio para ficar. Com mais ou menos tertúlias e conversas ao entardecer ou nascer do sol.
Se tudo isto é do “interesse dos alunos”? Duvi-dê-ó-dó.

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