Até um Burro Velho como Eu Pode Mudar de Ideias

Por isso, já nem me choca por aí além que a flexibilidade atinja a avaliação dos alunos e tenhamos um daqueles sistemas em que só há um nível para a reprovação quase impossível e depois um sistema de letras para tudo o que é “positivo”. Claro que é um sistema que aparentemente não se presta a médias (como alguém referiu num comentário mais abaixo), mas perguntem em Inglaterra se as boas Universidades não olham com atenção para as letras dos candidatos. Porque há sempre uma equivalência (e neste caso até a wikipedia é muito útil para conhecermos algumas delas) e depois até aparecem uns sinais de menos e mais… e vai quase tudo dar ao mesmo. Embora com sucesso para mostrar nas estatísticas.

Portanto, força nisso, mas depois não se escondam, corra bem ou mal.

coice-da-jumenta

Os Pés de Barro da Escolaridade Obrigatória de 12 Anos

As visitas vip de gente notável não resolvem nada. Mas dão boas photo-ops.

“Bem-vinda ao inferno!” Foi assim que Maria Manuel se sentiu quando o seu filho de 16 anos ingressou no ensino secundário e todas as portas se começaram a fechar. “As escolas secundárias não têm capacidade para acolher deficientes profundos”, como é o caso do seu filho, disse num dos muitos testemunhos de pais e jovens com necessidades educativas especiais (NEE) que foram apresentados nesta quarta-feira na Assembleia da República, numa iniciativa promovida pelo grupo de trabalho da educação especial da comissão parlamentar de Educação.

Durante quase cinco horas sucederam-se relatos sobre a exclusão destes jovens, sobre as lutas permanentes que eles e os pais têm de travar, sobre a incompreensão dos professores e dos outros estudantes face à diferença. É o caso de Inês, que tem 13 anos e que desde há muito chega a casa a chorar: “Fico todos os recreios sem brincar”, conta. E na aula o que fazes? Pergunta-lhe a mãe: “Fico a olhar para o professor.”

Tristesse

Hoje, no I

Há que ter a coragem de assumir as coisas. Prefiro algo coerente do que mantas de retalhos.

Educação: Por uma Flexibilização Coerente

Estamos a assistir a mais um processo de reforma educativa, desta vez sob o tema da “flexibilização curricular” e da necessidade de definir “aprendizagens essenciais”. É mais uma reforma a juntar a tantas outras que nos têm sido servidas a cada novo mandato no Ministério da Educação, como forma de se marcar uma espécie de novo tempo educativo para ser lembrado no futuro como o responsável por toda e qualquer conquista estatística ao nível do sucesso, seja nas estatísticas nacionais ou nas comparações internacionais.

Já muito se escreveu sobre os avanços, recuos ou piruetas deste processo nos últimos meses, pelo que não vou resumir os seus aspectos mais específicos, por se terem revelado bastante voláteis, preferindo concentrar-me no princípio geral da “flexibilidade” de um currículo “essencial” para os alunos “do século XXI”. Vou fazê-lo numa perspectiva de dar coerência e um aspecto mais global a este princípio, se é para ser levado a sério.

Antes de mais, consideremos a variável tempo numa dupla perspectiva: a primeira relaciona-se com a organização dos ciclos de escolaridade de outra maneira, de modo a permitir uma distensão dos programas por mais anos, eliminando redundâncias entre conteúdos dos vários ciclos, como acontece com o 2º e o 3º em diversas disciplinas; a segunda tem a ver com a obsessão de tudo contabilizar ao minuto, desde os horários dos professores às alternativas apresentadas para o trabalho “flexível” com os alunos. Para quando uma “flexibilização” do tempo escolar, organizado tradicionalmente em blocos com o monolitismo da lógica de série? Aulas de 45 ou 50 minutos não são verdadeiras alternativas. São apenas variantes mínimas do mesmo modelo de “tijolo”.

Em seguida, tenhamos coragem de enfrentar a questão da avaliação dos alunos em coerência com os princípios da “flexibilidade” e da necessidade de “emagrecer” o currículo, conjugando esta reforma com as medidas que há um ano marcaram mais um plano nacional para a promoção do sucesso escolar. Ao longo dos últimos 25 anos tivemos vagas sucessivas de retórica e legislação anti-insucesso com as mais variadas legitimações: ou porque é pedagogicamente infrutífero reter os alunos, ou porque isso lhes abala a auto-estima, ou porque é uma “chaga social” ou, de forma mais pragmática, porque “é caro”. Sejam coerentes de uma vez por todas e restrinjam a possibilidade de reter os alunos a casos ultra-excepcionais de falta de assiduidade, assumindo que todos (ou quase) devem passar de forma independente do seu desempenho, recebendo no final do Ensino Básico um certificado com as suas classificações, sejam quais forem. Abandonem de vez a noção de “positiva” e “negativa”, até porque a escala de 1 a 5 é toda positiva do ponto de vista matemático. E assim deixaríamos de comentar a transição de alunos com seis ou oito “negativas”. O aluno passou de ano com média de 1,5 ou 3,7 ou 4,8. E acaba-se de vez com o insucesso. Isso, sim, consideraria coerente e pouparia imenso em “formação” e conversa fiada por todo esse país, a massacrar pela enésima vez os professores, tentando fazê-los sentir-se “inflexíveis” e culpados pelos males alheios.

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