Do Impressionismo Educacional

Imaginemos que, em outros tempos, um governante decidia a realização de provas para alunos de 7 anos que não existem em qualquer outro lado da Europa com base numas “impressões”  (a expressão é atribuída com aspas ao governante em causa, não é resultado de nenhuma cabala bloguística) recolhidas em conversas com professores amigos e visitas a escolas seleccionadas… o que isto não levantaria de protestos entre muita gente bem pensante e crítica do stress causado nos alunos por provas em que vão ser observados no seu desempenho por dois professores classificadores, para mais em algo que tem uma expressão física e pública imediata. Não estamos a falar numa prova escrita que é depois classificada, mas em algo feito em público e que exige destreza física e que implica um embaraço imediato aos menos dotados para certos exercícios.

Já estava para aí a ver mortáguas a elevar a fasquia em consulta parlamentar. Oliveiras a esbracejar nas televisões contra o fascismo pedagógico. Representantes associativos e sindicais progressistas a apontar o dedo a torturadores de criancinhas e a destacar o que este tipo de exposição pode causar de negativo à auto-estima da miudagem.

Só que a hipocrisia tornou-se a regra e é dominante nestas matérias. Se a prova é “nossa” é boa (como se os miúdos do 2º ano entendessem muito bem o que é “aferição”), se é dos “outros” é má. Esta não conta para nada? A mim parece que uma prova que se diz destinada a recolher dados “sistemáticos” para determinar futuras políticas curriculares é algo com muito mais responsabilidade para a Educação do que uma prova com 30% de peso numa classificação individual.

Mas já se sabe que eu sou pouco iluminado e, quiçá por dar mais exercício ao estômago do que aos tríceps (quer-se dizer… eu carrego com frequência muitos sacos com livros…) e por prezar mais o neurónio do que o pino sou um ignorante na ciência da vida saudável. Nem sequer fui escuteiro, nem nada, devo abominar a própria natureza natural.

Mas voltemos ao que é mesmo importante: se um governante na área da Educação pretende obter uma “fotografia” do funcionamento das escolas, claro que as pode visitar e falar com amigos, vizinhos, primos distantes. Mas tem um recurso que faz parte do próprio ME e que se chama avaliação externa das escolas e é feita todos os anos pela IGEC. Se nos dermos ao trabalho de fazer contas de somar (competência básica que até eu domino com alguma mestria) verificaremos que desde 2011-12, no segundo ciclo de avaliação, as equipas da IGEC visitaram (se incluirmos este ano) 664 agrupamentos e 148 escolas não agrupadas. Desde 2014-14, foram, respectivamente, 280 e 20. Até ao ano passado, os relatórios estão todos disponíveis onlineClown

E ainda há a imensidão de dados disponíveis na plataforma MISI@ para a qual são exportadas todas as informações sobre a caracterização e funcionamento das escolas.

Tudo materiais recolhidos e sistematizados (ou sistematizáveis) que irão algo além de “impressões” trocadas a beberricar uns cafézitos enquanto se congeminam reformas educacionais maravilhosas com um punhado de amizades mais antigas ou mais ocasionais e instrumentais. E materiais que não implicariam quase paralisar as escolas do 1º ciclo durante uma semana e mobilizar dezenas de professores para a sua realização, incluindo vastos secretariados para recolher e processar os dados das provas. Mas, parece que só “a partir de agora vamos ter dados sistemáticos sobre o que existe”.

A mim – que, como se sabe, sou um gajo antiquado e conservador – parece-me algo abstruso que se produzam provas deste tipo com base em impressões ou sequer em comichões que são sensações que todos sabemos serem terríveis. Aliás, a bem da clareza acho que nada disto é exactamente o que se diz ser publicamente. Acho que é algo que é feito dentro de um quadro muito definido e pré-estabelecido nas fases de simulação e coreografia mediática (aquelas notícias da falta de condições das escolas do 1º ciclo para as provas foram apenas uma peça destinada a justificar uma intervenção e não a lamentar seja o que for), ditado a partir de alguns grupos específicos de interesses que estão a desenvolver um processo pouco transparente de apropriação do currículo do Ensino Básico (mas não só) para redistribuição de prebendas em causa própria com a máscara do “interesse dos alunos” ou mesmo da “saúde pública” com formas mais ou menos sofisticadas de disfarçar uma certa e determinada ganância.

Não… não estou a desenvolver qualquer teoria da conspiração. Antes estivesse. O que lamento é a quase completa demissão de quem deveria funcionar como watchdog do spin político e já desistiu com medo que lhes continue a acontecer, individualmente e como grupo, o que aconteceu aos professores: a terraplanagem profissional.

Seurat

Seurat, estudo para Uma tarde de Domingo… (1884)

Nem de Propósito…

… saiu hoje já um dos coisos de que estava à espera, embora esta esteja formalmente mais na dependência da pasta da Saúde. Depois, em devido tempo, é verificar o nome dos nomeados para a “comissão intersectorial”.

Despacho n.º 3632/2017 – Diário da República n.º 83/2017, Série II de 2017-04-28

Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Educação, Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e Saúde – Gabinetes da Secretária de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, dos Secretários de Estado da Educação, da Juventude e do Desporto e do Emprego, da Secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência e do Secretário de Estado Adjunto e da Saúde.
Constitui a Comissão Intersectorial para a Promoção da Atividade Física, com o objetivo de elaborar, operacionalizar e monitorizar um Plano de Ação Nacional para a Atividade Física.
Se as preocupações e objectivos são virtuosos. Sim, há fins maravilhosos, o problema é das meias que se usam para aquecer os pés, if you know what I mean…
ginastica

O Grande Problema, Afinal

Da tolerância de ponto. Parece que é o facto das escolas fecharem. Logo pela manhã, mesmo em gente divertida como a dupla João Quadros/Bruno Nogueira (agora na Antena 3, rádio pública) a preocupação é “onde os pais deixam os filhos?”. Repare-se na utilização do verbo “deixar” para referir o que fazem aos filhos. Não é porque eles perdem aprendizagens ou ficam um dia com a sede de saber por satisfazer. É outra coisa. É da parte do armazenamento que se sente falta.

Uma ideia… para a próxima não vendam as nossas grandes empresas todas a chineses ateus ou a angolanos marxistas e materialistas (pimba… esta foi a piada patrioteira do dia). Deixem-nas com os nossos grandes e beatos empresários (os jardins, salgados, ulricos, granadeiros) que sempre foram pessoas com a mão sobre a Bíblia e toda a Fé do mundo e, pronto, está resolvido, faz-se um feriado nacional. E mesmo aqueles pequenos empresários da nossa “malha empresarial”, que me ocorra, parecem ser quase sempre pessoas muito apegadas a credos religiosos . Por isso, devem ter espaços para acolher a petizada numa de exaltação do convívio da Família na preparação da chegada do Santo Padre.

Lembrem-se… os três pastorinhos nem à escola iam. Os dias todos. Façamos, então, uma recriação histórica.

Ou então larguem-nos naquelas coisas das bolas do ikea ou no centro comercial, que isso nunca fecha e é entretido.

pastorinhos

Estou a Tentar Achar uma Diferença Essencial…

… entre a lógica disto e aquela ideia de há uns anos de compensar os municípios que gastassem menos com as escolas e professores. A mim parece – tenho, pois, uma “impressão” – que o que se promove não é qualidade, mas apenas a poupança a qualquer custo (no seu pleno sentido).

Já sei… esta medida é mais em tons de rosa-vermelho desmaiado-lilás.

Patinhas