A CNN ainda não fez um directo de Fátima.
Dia: 12 de Maio, 2017
Clichés Requentados…
… em gente aparentemente nova é algo que me impressiona. Nem é por discordar de algumas ideias (e certamente não discordaria de muitos móveis novos para as minhas aulas), é apenas porque parece que há uma k7 em que se quer dar a entender que a inovação no século XXI é aplicar metodologias que são conhecidas há 200 anos (alguém explique a muito jovem pedagogo que Pestalozzi, Fröbel, Montessori, Freinet viveram nos séculos XVIII e XIX). Eu compreendo o entusiasmo, o orgulho no pioneirismo (há uns anos era quem assinasse contrato de autonomia) mas parece que se ganham apoios e créditos de cada vez que se repetem certos slogans.
Ainda a Coisa das Flexibilidades (Mas no Concreto)
Isto tem sempre a sua graça, quando se observamos o que é dito e escrito para fundamentar as novas “reformas” (que são sempre as essenciais, indispensáveis e inadiáveis). A do trabalho de projecto inter/transdisciplinar é algo me comove apenas na justa medida. É uma estratégia entre outras, que não excluo, mas com a qual embirro se a decretarem obrigatória.
Mais importante seria que quando fazem mudanças as fizessem de forma articulada e integrada para evitar sobreposições, redundâncias, contradições. Seja com estes, com outros, aqueloutros, tanto se me faz.
Até vou falar de algo que agradará aos de agora, pois é uma crítica à falta de coerência da definição de metas e de programas do governo anterior, no que se relaciona com duas disciplinas que, no 2º ciclo mas não só, poderiam ter programas muito mais intercomunicantes: Português e História e Geografia de Portugal. Fosse feito um trabalho como deve ser, existisse gente no ME e nas associações de professores que soubessem ao que andam e os programas seriam feitos (ou reformulados) com a devida atenção no que se relaciona, por exemplo, à sincronia entre as leituras recomendadas para uma disciplina e os conteúdos de outra. Há muitos exemplos possíveis mas vou concentrar-me no mais óbvio: o da literatura do tempo ou sobre o tempo dos Descobrimentos e os conteúdos da parte da História (e Geografia).
De acordo com as metas e programa de HGP, os conteúdos relativos aos Descobrimentos encontram-se perto do final do 5º ano, em princípio a leccionar (dependendo da extensão dos períodos lectivos) a partir do final do 2º período ou do início do 3º. De acordo com as metas e programa de Português para o Ensino Básico, as leituras recomendadas para o 6º ano (numa lista bastante fechada) incluem um conjunto de obras directamente associados ao imaginário da Expansão e das viagens de Descobrimentos, desde as narrativas do Romanceiro de Almeida Garret (A Bela Infanta, A Nau Catrineta) a As Naus de Verde Pinho de Manuel Alegre, passando por outros textos como Os Piratas de Manuel António Pina ou as versões para jovens do Robinson Crusoe. Da mesma forma, surgem recomendações como o Ali Babá e os Quarenta Ladrões ou os Contos Gregos ou o Ulisses de Maria Alberta Menéres que remetem para a cultura árabe ou para a Antiguidade, que se abordam no 5º ano (a parte dos gregos só de raspão, sendo mais própria do 7º ano).
Em contrapartida, para o 5º ano temos A Vida Mágica da Sementinha (que só mentes tortuosas podem considerar verdadeiramente adequada a leitores de 5º ano ou A Viúva e o Papagaio de Virgínia Woolf, texto interessante mas polvilhado de topónimos e nomes ingleses que a miudagem não sabe pronunciar.
Na ficha técnica de ambos os documentos estão diversas pessoas altamente estimáveis, mas que se percebe trabalharem nos respectivos casulos, sem uma pinga de ideia do que é trabalhar de forma articulada entre as disciplinas, de modo a abordar conteúdos de forma pluridisciplinar. O actual governo nada mudou em tudo isto e parece pronto a acusar tudo e todos que não adiram às suas ideias, limitando-se a acusar os programas de extensos. A verdade é que para alterarmos este espartilho de leituras da parte do Português (passando para final do 5º ano leituras recomendadas para o 6º ano) para melhor se adequar a um trabalho em conjunto com HGP (é mais complicado torcer a História) é preciso todo um manancial de explicações, fundamentações (por parte dos professores ou grupos disciplinares) e autorizações (dos departamentos curriculares, do Conselho Pedagógico) com mais de burocrático do que de pedagógico que a ninguém ainda ocorreu reduzir.
Algo que poderia ser resolvido com conversas simples entre os professores envolvidos deve transformar-se em “projecto” com todas as formalidades associadas. Há quem não tenha entendido ainda que esta “metodologia de projecto” é, em muitos casos, a forma mais burocrática, formalista e formatadora, de conduzir o trabalho quotidiano dos professores, limitando-lhe a autonomia e a verdadeira flexibilidade do trabalho pedagógico quotidiano.
Quais as razões para isto, no meu escasso entendimento de professorzeco para quem os “projectos” são muito mais do que grelhas para registo, observação, verificação e relatório? Desconfiança generalizada da tutela em relação aos professores e obsessão pelo controle e formatação do trabalho nas salas de aula, que devem seguir sempre a cartilha dominante.
Isto não significa que tudo deva ser feito sem supervisão (intervisão?), acompanhamento ou balanço. Apenas que isso é um aparato que se coloca em cima do que é verdadeiramente importante.
Afinal…
… não era mesmo necessário ter andado com tantos recuos, curvas, contracurvas, avanços, se era para tudo ficar mais ou menos na mesma. A culpa de tanta desorientação pode repartir-se entre quem quis fazer alarido com escassa coragem para ir a fundo a sério nestas matérias e quem se assustou com esse mesmo alarido.
Todo este episódio não deixe de ter o seu quê de deprimente.
Caro Professor
(…)Deve ter recebido recentemente as propostas de manuais e cadernos de atividade da (…), em adoção no final de mês para o ano letivo de 2017/2018, que enviamos para a sua escola, em seu nome pessoal, através do representante da sua área disciplinar.
Entretanto, é com muito gosto que informamos que receberá também, logo que possível, os restantes materiais de apoio aos novos manuais escolares.
Com base no recente esclarecimento do Ministério da Educação relativo ao processo de avaliação e adoção dos manuais escolares, vamos avançar com a disponibilização aos professores dos recursos pedagógicos que concebemos e produzimos especificamente para apoio à prática letiva, e de que já enviamos um exemplar ao cuidado do representante da sua área disciplinar, junto do qual os poderá apreciar desde já.
Sublinhamos que a disponibilização destes materiais é feita independentemente da opção que venha a fazer relativa ao manual escolar, que será livre e efetuada tendo em consideração os critérios de avaliação definidos pelo Ministério da Educação.