O secretário de Estado João Costa dá uma entrevista ao suplemento de Educação do JLetras na qual, com a previsibilidade esperada, elogia imenso o que tem feito e o que será feito, se seguirmos as suas iluminadas orientações que ele insiste muito em dizer que são assentes num enorme “diálogo” com as escolas, os directores e os professores. As palavras são bonitas, como sempre, mas eu concentro-me nos actos e é neles que não vejo correspondência com a retórica humanista.
Está em decurso uma não muito explícita guerra em torno do currículo (nomeadamente do Básico), com evidentes ganhos por parte de uma concepção utilitarista da Educação, que nega alguns dos elementos que ao longo dos tempos mais distinguem o ideal clássico da Paideia como educação integral do corpo, mas em especial do espírito.
Foi sobre isso que escrevi nesse mesmo suplemento e de que agora transcrevo um excerto.
Atenas vs Esparta?
A situação que vivemos de combate pelo domínio do currículo do Ensino Básico lembra uma espécie de luta entre o modelo educativo ateniense, baseado na Filosofia e no culto do Espírito (incluindo as Ciências e a Matemática, sem descurar o corpo e as áreas mais técnicas), e o modelo espartano, assente no culto do corpo, da força e do seu utilitarismo guerreiro.
A primeira disciplina a ser trucidada nestas “guerras do currículo” foi a Filosofia, menorizada no Ensino Secundário perante outras áreas que associo mais à promoção de estilos de vida do que a ensinar a pensar e muito menos criativamente. É para mim impensável que um aluno possa entrar num curso superior na área das Ciências Sociais e Humanas sem que a Filosofia faça parte do seu currículo obrigatório para esse acesso. Em boa verdade, a Filosofia, como disciplina estruturante do pensamento, crítico, criativo ou outro, deveria ser considerada obrigatória para qualquer candidato à Universidade, mas parece que isso é cada vez mais tido como arcaico.
O alvo seguinte, ao nível do Ensino Básico, tem tentado centrar-se na História, que se gosta de apresentar como coisa só de memorização e cheia de coisas inúteis para o presente. O cerco tem tido avanços e recuos, mas não tem parado, beneficiando de algumas inimizades de proximidade com posições chave na definição do chamado “desenvolvimento curricular”. Se perguntarem aos governantes se isto é assim, negarão e poderão mesmo dizer que eles são os maiores defensores das Humanidades e até devem ter alguma História do Círculo de Leitores nas estantes para confirmar a sua devoção. Filosofia e História são disciplinas “malditas” para os cultores do Agora, do Futuro, do Homem Novo Saudável e Tecnológico a quem não interessa como aqui chegámos e detestam que alguém lhes relembre que a fatiota agora desempoeirada é velha e, pior, que se tenha a capacidade para o demonstrar sem a wikipedia à mão.

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