O Perfil

Se bem percebi, ficou quase tudo na mesma, após a consulta pública, como era, aliás, de esperar.

Antes começava da seguinte forma:

O século XXI coloca desafios fundamentais aos sistemas educativos. Atravessamos um período em que o conhecimento científico e tecnológico se desenvolve a um ritmo de tal forma intenso que a quantidade de informação disponível cresce exponencialmente todos os dias. Apesar de tantos avanços científicos, este século tem vindo a ser marcado pela incerteza, por debates sobre identidade e segurança e por uma maior proximidade dos riscos colocados à sustentabilidade do planeta e da humanidade.

Agora começa de um modo ligeiramente mais económico no primeiro parágrafo, mas ganhou em conceitos iniciados com a letra i.

O mundo atual coloca desafios novos à educação. O conhecimento científico e tecnológico desenvolve-se a um ritmo de tal forma intenso que somos confrontados diariamente com um crescimento exponencial de informação a uma escala global. As questões relacionadas com identidade e segurança, sustentabilidade, interculturalidade, inovação e criatividade estão no cerne do debate atual.

Antes terminava assim:

A ação educativa é, pois, compreendida como uma ação formativa especializada, fundada no ensino, que implica a adoção de princípios e estratégias pedagógicas e didáticas que visam a concretização da aprendizagem.Trata-se de encontrar a melhor forma e os recursos mais eficazes para todos os alunos aprenderem, isto é, para que se produza uma apropriação efetiva dos conhecimentos, capacidades e atitudes que se trabalharam, em conjunto e individualmente, e que permitem desenvolver as competências-chave ao longo da escolaridade obrigatória.

Agora termina assim, com uma-alteração-uma, se é que se pode chamar assim:

A ação educativa é, pois, compreendida como uma ação formativa especializada, fundada no ensino, que implica a adoção de princípios e estratégias pedagógicas e didáticas que visam a concretização das aprendizagens. Trata-se de encontrar a melhor forma e os recursos mais eficazes para todos os alunos aprenderem, isto é, para que se produza uma apropriação efetiva dos conhecimentos, capacidades e atitudes que se trabalharam, em conjunto e individualmente, e que permitem desenvolver as competências previstas no perfil ao longo da escolaridade obrigatória.

Cruzes… deve ter sido cá uma trabalhêra dar a aparência de incorporar contributos…

perfil_alunos

Isto vai ser um recurso inestimável para a produção de chorrilhos conceptuais por aí que até me dói a osso do fígado só de pensar no que me vou rir a ler tais prosas.

O Delírio Tecno-Digital das Plataformas (Elevado a N)

O documento relativo à Estratégia TIC 2020 na Administração Pública é uma coisa com mais de 250 páginas (Estrategia TIC 2020 na AP_2017) que me faz lembrar o “velho” PTE socrático e não são escassos os pontos em comum e alguns dos protagonistas, a começar pela principal promotora do novo simplex.

Em nada me parece que vá reduzir o labirinto burocrático, apenas lhe colocando uma nova camada, brilhante até entrar em colapso por falta de meios para a sua manutenção nos sectores onde consiga funcionar em pleno (excepto no caso do Fisco).

Para a Educação (página 11), a estratégia essencial é a da submissão quase completa a plataformas informáticas centralizadas (e sabemos bem como funcionam sempre às mil maravilhas as que vamos conhecendo…) para maior eficácia financeira, a padronização dos processos e o reforço de todas as tendência da gestão escolar tal como as conhecemos e desgostamos (pelo menos uns quantos, porque há sempre cristãos-novos em conversão acelerada à “eficácia”).

TIC2020 Educa

Há Malta com uma Ganda Lata

O actual director do Público, que só gente muito desmemoriada não se recordará de ter sido um apoiante feroz de um governo (PSD/CDS) que definiu muita da sua identidade através de políticas de erosão dos serviços públicos e de teorias da liberdade de escolha na Educação, parece que anda meio desesperado com as consequências práticas de algumas das medidas que tão entusiasticamente apoiou, desde a implosão do mec prometida (e em boa parte executada) por Nuno Crato ao emagrecimento da administração pública, passando pela liberdade dos pais escolherem a escola para os seus filhos, desde que exista vaga. A culpa, neste caso, só é do Costa porque não reverteu essas políticas de forma convicta, mantendo-as no essencial.

É azar, Agora, aguenta!

keep-calm-and-aguenta-firme

A Desconfiança Burrocrática (Elevada a X)

Este ano lectivo tive direito a uma dose de trabalho burrocrático perfeitamente disparatado, pela inconsequência e redundância de muitos dos actos praticados, singelos, duplicados, triplicados, sobrepostos, interpostos, concomitantes, exorbitantes, irrelevantes, desesperantes.

O delírio nascido da mentalidade desconfiada do legislador político, aliado a uma assinalável incompetência técnica e ao desconhecimento do real, conduzem o trabalho docente – a cada novo ano – para um patamar de indizível desperdício de tempo a produzir papelada (digital e convencional) para comprovar que se fez o que estava planeado, que foi com sucesso e se não foi, porquê, porquê e porquê, o quê, quando e como.

Uma boa parte resulta da pressão externa para que tudo seja justificado (eu já lhes digo o que penso do simplex+), outra parte da necessidade, nascida da insegurança perante o eventual imprevisto imponderável, de fazer tudo e mais alguma coisa para defender o lombo da potencial pancada inspectiva.

Algo que não deixa de ser sintomático é que, mesmo quando se contacta com o “exterior”, percebe-se que do outro lado os interlocutores também experimentam o mesmo tempo de terror pela necessidade de fazer tudo de acordo com as regras (quantas vezes, bem tortas) e os protocolos (quase sempre de uma inanidade atroz, tipo artigo 22). E percebe-se que isto se entranhou já nas rotinas, nas formas de estar, nos procedimentos que deveriam ser simplificados e eficazes, mas que continuam a ser vítimas de concepções baseadas em mecanismos de controle e inculcação da obediência que se multiplicam a si mesmos e disseminam por todos os níveis da administração e do quotidiano.

Há momentos em que apetece dizer… “calma, já percebi que vem atrás de nós e nos chateia para que não venham atrás de si e @ chateiem, mas relaxe… mande-os vir que já somos crescidos…”, mas parece que isso só serviria para rebentar uma bolha mantida sob uma pressão imensa, em que o medo se constitui como uma parcela inaceitável.

Quem criou isto, sabemos. Quem mantém o sistema desta forma, conhecemos e, quando não são as mesmas criaturas, são os seus discípulos que afirmam ter muita confiança nos professores e nas escolas, mas apenas se fizerem tal como lhes mandam, em trebuchet 10, a espaço e meio e tabulação padrão, com margens moderadas, com conhecimento de a, b, c e d, aprovação em três instâncias e registo na plataforma electrónica craida para o efeito e colocada em funcionamento na versão beta para se irem descobrindo os bichos.

É absolutamente lamentável que isto continue assim e ainda se adivinhe um agravamento das trelas com a nova Estratégia TIC 2020 para a Educação (em post a aparecer mais acima).

Bigorna