O Público fez ontem uma capa e uma espécie de especial sobre o racismo nas escolas, nos manuais, nas Universidades, etc, etc. É um destaque muito meritório, não apenas por algum sensacionalismo que sempre acompanha este tema. Só que esbarra em algumas contradições relativamente aos discursos que por aí se produzem sobre alguns “percursos” educativos “alternativos”.
Vamos lá tentar abordar a coisa de forma breve, mas não ligeira: há razão nas queixas acerca do encaminhamento de muitos afro-descendentes para vias “vocacionais” ou “profissionalizantes”. Mas essa “razão” assiste principalmente a quem desde sempre tem dito que muitas vezes essas são vias de segunda ou terceira ordem que os governos andam sucessivamente a querer impor a metade dos alunos. Já é mais complicado que quem defende que os cursos vocacionais ou profissionais são injustamente vítimas de uma má imagem depois possa surgir associado a posições de crítica quanto ao encaminhamento de alunos de minorias étnicas e culturais para essas vias.
Porque, das duas uma: ou essas vias são tão dignas quanto as outras e não há razão para “queixas”, ou realmente não são e vão muito mal aqueles que as querer inculcar à força a 50% dos alunos. Quando Crato quis espalhar os “vocacionais” a alunos desde a pré-adolescência, muita gente apoiou (e mesmo no actual mandato ainda apoiavam assim de forma meio disfarçada), houve quem o criticasse por ser esse um caminho errado e de escola a várias velocidades. E não tivesse mudado de opinião e continuado a defender o seu fim.
Alguns dos investigadores que tratam estes assuntos já há mais de um ano que tinham feito uma investida semelhante. Mas a mim complica um pouco os nervos ver ex-governantes ou pessoas ligadas directamente a equipas do ministério da Educação – um dos críticos residentes do “sistema” foi colaborador do ME nos tempos de MLR (que em 2009 já se orgulhava do encaminhamento de 50% dos alunos para estas vias no Secundário) e é agora técnico especialista na equipa do ME – fazerem este tipo de acusações e terem colaborado de forma alegre e, pelos vistos, adequadamente ingénua em campanhas de defesa do ensino vocacional e/ou profissional (veja-se o caso do actual titular da pasta).
Será que isto tira razão às denúncias? De modo algum… retira é credibilidade a quem, na pele de “investigador@” apresenta um cardápio de acusações às escolas (claro… as críticas são sempre ao nível dos mexilhões…), mas na pele de (ex-)governante ou colaborador do ME se cala ou nada faz que se tenha visto ou veja para ultrapassar estas situações e, pelo contrário, se destaque pela disciplina política. Veja-se como Ana Benavente combate o “estigma” associado ao Ensino Profissional aqui, mas depois nas páginas do Público defende que ele dá origem a desigualdades que, claro, são sempre culpa alheia “há domínios em que essa desigualdade tem muito que ver com os estereótipos que estão na mentalidade dos próprios professores, autarcas, de todos os adultos que com eles convivem“.
Se encaminhar os alunos afro-descendentes para vias “alternativas” é sinal de “racismo” no sistema, então, provavelmente, quiçá, porventura e tal, que as critica como menores é que tem razão há muito tempo e sem necessidade de “estudos” para o demonstrar, bastando a observação directa da realidade. Se calhar (com certeza?), quem ajuda a perpetuar os preconceitos são os políticos e governantes muito inteligentes que acusam os outros de serem preconceituosos. Mesmo ao mais alto nível. Se o ensino profissional (mas, se calhar, só o “bom”) até é para se projectar para o século XXI pela pena dos grandes promotores das competências para o novo milénio!
Mas claro que isso não é possível… alguma vez os iluminados poderiam errar?
Erra é quem é “preconceituoso” e afirma o que é real e acontece no seu dia a a dia. E é “racista” quem, nas escolas, acaba por fazer cumprir as imposições estatísticas da tutela.
Os “inocentes” (governantes, investigadores-especialistas-assessores) e os culpados (escolas, professores) são sempre os mesmos, em trincheiras bem claras. Uns sempre pensaram e praticaram o Bem e defendem o Progresso, os outros são uma emanação do Mal e exemplos do atavismo retrógrado. E o ensino profissional é bom ou mau, dependendo dos dias e das ocasiões.
Cambada de hipócritas…
Hipócritas é pouco, para estes filhos da pátria!
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Como diz motta, “hipócritas é pouco”, muito pouco!
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Na minha escola não há “afro descendentes” mas cerca de 50% dos alunos optam por cursos secundários profissionais. E optam bem. Que racismo será este?
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O senhor director Agnelo é um exemplo para a tutela no cumprimento das metas estatísticas definidas.
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Será “bairrismo” em vez de “racismo”?
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Já se tinha percebido que o ensino profissional é muito bom, mas afinal não é, ou podia ser e se calhar deveria ser, mas não, ou vice-versa.
A habilidade destes governantes e ex-governantes é inventar problemas, discorrer complexas, eloquentes e inaplicáveis soluções e alijar responsabilidades para cima dos do costume.
Resolver problemas? Isso é que não, deve dar azar!
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