“Na Verdadeira Ascensão da Palavra”

Se eu tivesse a certeza que era escrito com uma intenção irónica ou como uma forma de duplo sentido, não me arrepiaria. Mas é uma pessoa adulta, aparenta estudos e está a comentar sobre Educação com opiniões que até me parecem estimáveis. O facto de ser uma “rede social” não pode ser desculpa até porque tem a possibilidade de corrigir o que escreveu. E eu sei o que é escrever à pressa e sair asneira. Mas, no caso que li, dá mesmo a sensação de ser escrito como quem ouviu a expressão algures e nunca a viu escrita. Não é gralha, não é desacordo ortográfico. É mesmo assim e custa ler. Mais uma caixa de comentários a que não voltarei enquanto me lembrar deste atropelamento na língua pública.

ascensão

“Ensaios” Com o Rabo de Fora

O Observador é um dos poucos espaços onde se apresentam “ensaios” sobre educação na nossa comunicação social. E isso é um problema. Porquê? Porque os “ensaístas” e outros convidados (há dias era um texto de Mário Pinto onde se usava pouco depois do início o termo “obsidiantemente” a propósito da “escola pública”, o que deu logo cabo de mim…), seguem uma agenda muito específica, de acordo com com qual a opinião tem pouco fundamento factual e aquilo que passa por “investigação” se fica pela descrição e, na maioria dos casos, o “investigador/ensaísta” finge uma objectividade que não tem e apaga o seu próprio rasto de responsabilidade nas coisas, baralhando os dados pelo caminho. O Alexandre Homem Cristo é um destes casos em que se usa o currículo para validar competências, mas não para assumir responsabilidades. Na sua análise sobre os dados que indicam que os candidatos a cursos na área da formação de professores são dos que apresentam piores resultados nos testes PISA faltam alguns elementos essenciais. Ou clarificar outros:

  • Antes de mais, AHC dá um salto entre algo que pode acontecer no futuro (os alunos mais fracos nos PISA podem vir a frequentar cursos na área da Educação e a ser professores) e aquilo que acontecerá com os professores que leccionam agora (ao insinuar que se opuseram a Maria de Lurdes Rodrigues e ao seu modelo de avaliação que Crato manteve no essencial simplificado porque não querem ser avaliados, logo são maus professores ou teriam uma má avaliação), promovendo uma confusão desnecessária mas certamente consciente por quem estudou o assunto e se considera investigador/ensaísta. Este tipo de mistura que AHC e outros fazem é habitual, nada tem de “investigação”, de “ciência” e muito de preconceito e agenda política. Não estamos aqui no domínio da tese académica mas da retórica política. Não é a primeira vez que o faz. Está longe de ser a primeira vez que lho digo, pessoalmente ou escrevendo por aqui. Basta ler esta passagem para se perceber que o que está em causa é menorizar os professores actualmente como se, por uma espécie de osmose, eles já fossem dos piores alunos dos seus tempos. É desonesto.

Na prática, a história é muito mais simples de contar: quase todas as (poucas) medidas políticas aplicadas nos últimos anos, no sentido do desenvolvimento profissional dos professores ou da sua avaliação, têm sido revertidas ou os seus efeitos anulados. É, aliás, a ex-ministra Maria de Lurdes Rodrigues que, em parte, o reconhece, quando afirma que “não existem condições objectivas” para introduzir a avaliação docente no sistema português. De facto, e olhando ao cemitério de medidas pensadas ou planeadas, seria ainda mais acertado dizer que não existem condições objectivas para a avaliação docente, para a descentralização da contratação dos professores, para o controlo dos níveis de qualidade dos cursos de ensino, para alterações à estrutura da carreira docente (para introduzir incentivos e recompensas pelo mérito). 

  • E é aqui que entra outro ponto essencial que é a completa ausência de análise dos motivos que levam a docência a ser uma opção de terceira linha para os candidatos ao Ensino Superior. AHC (e outros como ele) apagam da equação os motivos que levaram a que a docência deixasse de ser uma carreira profissional atractiva. Ora… a proletarização material da docência (embora se diga que estão cheios de “privilégios”) e a multiplicação de um discurso de amesquinhamento simbólico dos docentes e da sua qualidade (mesmo se os resultados dos alunos contrariam isso) não serão estranhas a essa rejeição no momento de planear o futuro. Se a docência ainda fosse uma carreira em termos reais e fosse prestigiada pelos políticos de ocasião e seus assessores na falta de outro emprego, as coisas seriam diferentes. As teorizações cosmopolitas de AHC acerca de outros países valeriam se ele comparasse a forma como os professores são acarinhados nas sociedade de que fala, nomeadamente no caso da Finlândia onde é impensável passar-se o que se passou por cá com Maria de Lurdes Rodrigues (a tal que quer ser reitora sem ter apresentado a sua avaliação por a achar burocrática) que ele tanto gosta de elogiar ou com o governo do PSD/CDS que AHC apoiou de forma bem activa exactamente no aconselhamento na área da Educação.

Para existir seriedade em “ensaios” deve existir um mínimo de decoro e pudor na forma como se apresentam as coisas, não as truncando, retorcendo, baralhando, omitindo dados relevantes e, mais importante, apagando o próprio papel na situação descrita.

Mas é o que se arranja. E isso é, realmente, um problema. Não há mais debate público porque, com toda a sinceridade, para o peditório de debater com sofistas de terceira linha ao serviço de lobbys disfarçados há pouca gente com paciência. Só mesmo por ter chegado o final da semana é que decidi perder uma meia hora com este tipo de “ensaio” à la Observador.

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Como Alimentar Clientelas

Inventar um “problema”, sugerir a criação de meandros para o estudar, fazer propostas de solução e coiso e tal. O caso do atropelamento de animais selvagens é uma daquelas micro-causas que só vai servir para colocar umas pessoas em grupos de trabalho, estruturas de missão e fazer umas encomendas. Porque quem permite a destruição sistemática dos habitats desses animais só pode estar a brincar ao achar que os atropelamentos são o grande problema dos pobres bicharocos. Os Verdes poderia, por exemplo, auxiliar o PCP a perceber isso em algumas das autarquias que governa há décadas aqui pela margem sul e onde permitiu a quase completa destruição da flora e fauna naturais. E o Bloco e o PAN poderia fazer isso enquanto namoram com o PS. Ainda aqui na margem sul, basta ver o desvario do homem do Montijo a traçar novas acessibilidades e a levar tudo adiante.

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(já agora… e o atropelamento dos animais domésticos?… não são criaturas da Natureza como as outras? já sei, a biodiversidade e tal… )

Tive Dificuldade em Arranjar Título Para Este Post

Porque tive receio de ser injusto com alguém que desconheço e a quem gostaria de dar uma segunda oportunidade, já que a primeira é má. Tenho dias assim.

Vamos por partes: o director de um colégio lisboeta (preçário aqui) numa recente zona nobre a afluente da cidade, surge nas páginas virtuais do Observador a escrever sobre “os professores e a criatividade na escola”. E escreve, a dada altura, o seguinte:

Terceiro, o professor – o indivíduo que nunca saiu do sistema educativo e tem poucas experiências de outros sistemas: empresarial, associativo ou artístico. Tendo em conta o apresentado anteriormente, a cultura que persiste nas nossas escolas e estendendo (talvez abusivamente) para uma cultura semelhante nas nossas universidades, o professor é um indivíduo que não sabe o que é trabalhar noutro tipo de cultura organizacional e está pouco estimulado para a tomada de decisões e para o desenvolvimento de soluções criativas.

Escreve outras coisas, mas esta prendeu-me a atenção, porque tinha uma vaga ideia de já ter ouvido o nome de Félix Bolaños antes. Era director de um agrupamento complicado, mas em Janeiro de 2014 afirmava andar a testar novas formas de melhorar os resultados dos alunos que, apesar das experiências, continuavam fracos. Em Outubro desse ano, demitia-se, afirmando que estava “entre dois travões muito grandes: o Ministério da Educação, com a sua excessiva regulamentação e política de recursos humanos, e ainda o conjunto de maus professores que me impedem que isto avance”, ou seja, a culpa do que estava a correr mal era dos outros. Como aqueles professores que dizem que a culpa é sempre do ministério e dos alunos, algo que se lhes critica, dizendo que devem aprender a gerir as coisas.

E que não devem desistir.

Eu compreendo que FB estivesse farto das condições de uma escola pública complicada e se quisesse ir embora. E compreendo que a sua qualidade tenha sido reconhecida para dirigir um colégio em outro contexto social e económico. Virado para as artes e para a criatividade. Tudo muito bem pago, dos serviços ao vestuário obrigatório, do bibe ao casaco polar.

Mas há por aqui uma parte de “lição” que me incomoda, atendendo ao “trajecto”. Porque um bom (ou excelente) treinador não é apenas – ou sequer – aquele que treina o Real Madrid ou os Manchesters com milhões à disposição para contratar só os melhores, nas melhores condições.

Vou dar uma segunda oportunidade, a ver se isto é apenas uma combinação, para mim pouco feliz, de declarações ao longo de um “trajecto” que pode levar a pessoa da depressão à euforia.

Bunsen