4ª Feira

Dia para olhar para além do meu quintal, para o jardim aqui plantado (por pouco tempo, atendendo ao arboricídio em decurso) neste rectângulo muito adequado a trapezistas. E reparar que este súbito desejo de consenso do psd mais não é do que um chegar à frente para a divisão das verbas do novo quadro comunitário, pois há muita clientela local (e brevemente regional) para satisfazer, mais os gabinetes de advogados (não é por acaso que nos apoios ao rio estão, por exemplo, o morais, o marques e aquela senhora da ordem) que costumam “dar apoio” ou “consultoria” à execução de “projectos” para receber gordos subsídios. Com o passos, corriam o risco de ficar fora da parte melhor da festa, pelo que era preciso despacharem-no, bem ou mal. Claro que, sem implantação autárquica, o bloco já apareceu a dizer que não quer conversas com a direita. Já o pcp anda mais prudente, pois percebe que, com menos câmaras, precisa de ter calma, se quer uma fatia maior do que a habitual do bolo.

O triste é isto ser tão óbvio, estar ali diante de toda a gente, mas já quase ninguém se chatear com isso.

 

E Os Sacanas dos Professores Querem Que lhes Contem Todo O Tempo de Serviço? Não Há Noção das Prioridades?

Governo admite novo empréstimo para cobrir prejuízos do Novo Banco

Carteira

(no portal base não estão os contratos do novo banco com escritórios de advogados, pois não? porque é “privado”, certo? porque tenho aqui umas impressões…)

3ª Feira

Dia de Inverno. Parece quase novidade, excepção, a miudagem olha para a chuva pegadinha como se fosse quase uma espécie de ficção científica. Mas, curiosamente, os guarda-chuvas são uma quase total inexistência.

Falo com um colega que saiu do manicómio há um punhado de anos, mesmo deixando quase um terço do salário para trás. Anda a aproveitar bem o tempo que acha curto mas só porque, como lhe lembrei de forma pouco caridosa, não tem certas aulas de 90 minutos para flexibilizar. E diz-me que se não falasse com pessoal no activo, a acreditar apenas no que vê e lê na comunicação social, acharia que tudo estava um mar de rosas (o trocadilho é quase casual…) e que tirando umas manias dos professores que parecem querer recuperar tempo perdido tudo estaria no melhor dos mundos, com uma paz nas escolas digna de tempos que já quase não se lembram. Mas que quando fala com quem ainda dá aulas se apercebe de um enorme fosso entre o que as pessoas sentem, o desânimo, a revolta ou a fúria com consciência da sua inconsequência prática perante pizzas, e o que é transmitido mediaticamente como representação de uma realidade em tons de dourado, com o aval de “pais e directores”. Trocamos informações sobre situações de um ridículo imenso como colegas com doenças crónicas e evidentemente irreversíveis, incapacitantes de um modo tão óbvio que nos questionamos sobre a bestialidade de certas juntas médicas que devem ter quotas a cumprir em matéria de desumanidade. Quatro, cinco, seis anos a obrigarem as pessoas a um calvário demente, com a obrigatoriedade de voltar 30 dias para serviço efectivo para quem está em estado de extrema vulnerabilidade e debilidade.

Sim, parece que o que interessa a toda uma clique “progressista” é se os lulus podem ficar a observar, com mais ou menos babanço, a night out das mamãs e papás que entregam um zingarelho aos filhos humanos para que se aquietem e calem, enquanto afagam o piloto ou o nano-bobi. Ou se devemos ter uma espécie de apartheid “de género” nos transportes públicos. Valeu-me o Bruno Nogueira pela manhã a malhar na cância para não sentir que estou completamente às avessas com isto tudo.

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(e, pois, com chuva as escolas de 3ª linha, aquelas que não tiveram benesses locais ou centrais, ficam sem condições para a prática da EF ou então os alunos vão fazê-la para uma espécie de sótão, mas isso agora não interessa nada… até porque eu não gosto de represálias e lá que as há de quando em vez, as há e sobre inocentes)

Atão E os Polegares?

E, a bem dizer, quem se interessa ainda por lápis, essa coisa do tempo jurássico, sem ser para comprar aqueles queriduchos, cheios de coisas fofas, que nem se usam para não se estragar?

Children struggle to hold pencils due to too much tech, doctors say

Children need opportunities to develop hand strength and dexterity needed to hold pencils.

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2ª Feira

Tentem lá ser modernaços e tecnológicos, com aplicação de mini-questionários online para verificação das aprendizagens realizadas com a rede a suportar apenas 6 computadores em rede para uma turma de 20. Que até podem ser 24, 26, 28. A modernidade e a inovação devem ser, portanto, servidas em pequenas parcelas para que não nos inundemos nelas. É sempre mais giro com as experiências-piloto em que nos dão banda larguíssima e tudo funciona às mil maravilhas para, logo ao fim do primeiro semestre, se começarem a publicitar experiências extremamente positivas para a imprensa, com declarações apenas de quem está a favor ou foi seduzido para a coisa, a começar pelas organizações que o ps passou a controlar no sector e que gostam de parecer bem e receber o devido apoio para isso mesmo.. Aliás, se há coisa em que este governo é hábil é na forma como conseguiu que a comunicação social, em especial na área da Educação, acredite que a excepção é regra e a regra é excepção. E que quem não concorda e salta de alegria é laranjinha podre ou velh@ professor@ ressabiad@. Embora o que eu gostaria mesmo de ver é aquel@s senhor@s que apresentam webinares em fundo azul-cueca e formações com teses d’antanho a aplicar de forma generalizada certas estratégias de trabalho sem um suporte capaz de as fazer funcionar em pleno. A menos que a autonomia e a flexibilidade, mail’os puffs e cadeiras coloridas com rodinhas só se devam servir a meia dúzia de turmas e salas, enquanto nas outras se faz o mesmo de antes, mas com umas papeladas a dizer que é tudo novo e umas grelhas de observação e auto-avaliação cheia de sorrisinhos e palmadas nas costas.

Mas, nada de confusões com estes reparos, claro que me senti, como deveria ser, pleno de vigor pedagógico e pronto para uma nova semana de actividades mobilizadoras, numa perspectiva de flexibilidade transversal e capacitadora de competências e soft skills próprias para ir erguendo o III milénio.

Confiança

Os dados são consistentes em TODOS os estudos de opinião, ao longo dos anos. Mas… o discurso que insiste em afirmar o contrário, sem qualquer base factual, também. A partir do interior da própria classe, por parte daqueles que descobriram que são melhores do que os outros, só porque se puseram do lado do vento e da necessidade de “mudança”.

De acordo com o estudo de opinião realizado pela Aximage para o Negócios e o Correio da Manhã, as forças policiais são a instituição na qual os portugueses mais confiam: numa escala de zero a 20, o índice de confiança na capacidade que estes profissionais têm de combater o crime reúne uma pontuação de 14. De seguida na tabela, com uma pontuação de 13, constam as escolas e a sua capacidade de ensinarem coisas novas aos alunos. Merecem ainda nota positiva, embora sem distinção, os patrões e gestores, os partidos políticos e as famílias.

Em terreno negativo figuram a Igreja, quanto à sua capacidade de levar as pessoas a praticarem o bem, os sindicatos quanto à sua capacidade de defenderem os direitos dos trabalhadores, e os tribunais e juízes na sua função de administração da justiça (ver gráfico).

Aximage

Domingo à Tarde

Deve ser daqueles casos em que algo na altura da infância nos marca de forma quase imperceptível. Em que a capa triste do livro do Fernando Namora na colecção de bolso da Europa-América e o dramatismo da canção de Nelson Ned se inscreveram no imaginário pessoal e tornaram o domingo à tarde a parte da semana de que sempre gostei menos. Quando havia Inverno, era quando se tentava adivinhar se no dia seguinte ia ficar ensopado a caminho da escola; no Verão quando o dia se esticava sem parar, porque cada amigo estava com a sua família, algures, na terra natal dos avós ou algo assim. Mais tarde, o domingo à tarde sempre me pareceu a altura ideal para os temporais sobrenaturais ou as mortes fantásticas das novelas do Garcia Marquez ou outros autores sul-americanos. A tarde de toda a semana em que a luz ganhava outro tom e em que mesmo dourada do sol era deprimente, opressiva, incapaz de animar vida. Há quem faça a associação à proximidade da 2ª feira, do regresso ao trabalho, às rotinas, às obrigações, mas comigo a sensação precedeu em muito esses tempos. Em puto, a 2ª feira era o dia de regresso ao convívio com os amigos, aos jogos de bola em tudo o que era intervalo ou furos no horário (e muitos que eles eram). O domingo à tarde sempre foi macambúzio por direito próprio, a hora do regresso de algures, do fim de qualquer coisa, o entardecer supremo. Uma certa forma de desesperança. Quem nunca desceu a Rua Augusta em fim de tarde de domingo, nos tempos em que ainda havia vida nacional por lá, no tempo dos radiozinhos de pilhas para ouvir a bola, da senhora de amores rápidos à saída da estação de metro da praça da figueira, das pensões de águas mais frias do que quentes, ali quase na esquina dos correeiros, que diga que não.

(também desci os curtos aliados ou a longa santa catarina e deu-me no mesmo…)

Décadas depois, a sensação ainda se mantém, por muitas voltas que vida tenha dado. E sei que cada vez essa sensação é mais partilhada, agora, sim, com causa directa mais evidente e dificilmente desmentível. Por muito que digamos que é este ano, este período, este mês, esta semana, que não tocamos em nada para as aulas de 2ª feira, a verdade é que sempre acabamos por ir meter as mãos na massa, fazer uma ficha de trabalho que não venha no pacote dos manuais (para consumo generalizado em nome da diferenciação, como os projectos de flexibilidade que já chegaram), uma nova apresentação sobre um tema para o qual encontrámos uma ideia nova, umas imagens inesperadas, um arquivo online desconhecido; acabamos quase quase sempre – e tanto mais quanto mais arcaicos – uma pilha de trabalhos e fichas por/para ver e classificar. E se não tivermos, temos um qualquer relatório ou molho de grelhas por preencher para demonstrar o progresso das aprendizagens, os critérios da avaliação (que se diz ser redutora,, mas deve ser justificada). E entra aquela sensação de desesperança de novo, sabendo-se que nada disto mudará no essencial, por muito que mude a conversa em seu redor, por muita confiança retórica que se despeje sobre as escolas, por muito que se diga que os professores devem ser profissionais autónomos. Desde que não desalinhem das sucessivas ortodoxias, claro. Como a das necessidades de “formação” para os novos tempos. Nem de propósito, há uns minutos abri um mail com uma meia dúzia de propostas de formação, cujo bafio me entonteceu um pouco. Claro que lá estava uma sobre “diferenciação” com um nome de formador@ que me fez soar qualquer coisa, mas não relacionado com a coisa em si da tal diferenciação pedagógica. Pesquisei por obra feita e dei com uma, recente, assim auto-apresentada: “Este processo de construção da identidade pessoal e profissional assenta na identificação dos indivíduos consigo, com os outros e com o meio envolvente num dado contexto espaço-temporal, o que pressupõe uma rede de relações pessoais e sócio-culturais, podendo produzir constrangimentos endógenos e exógenos, traduzidos em vinculações profissionais activas e/ou possíveis conflitos identitários.” Leitura típica daquela que induz pensamentos depressivos e de claustrofobia conceptual, interna e externa, endógena e exógena. Relembra-nos muito do que, durante anos, mais nos afastou de querer ser formatados. Leitura de domingo à tarde, que deve ser evitada nos domingos à tarde. Antes o Namora. Antes a RTP Memória. Antes o passeio dos tristes do isidro.

fernando Namora - domingo à tarde