Há uma década estávamos a tentar digerir o que se passara na véspera, na manifestação dos 100.000, pensando que seria possível alcançar muita coisa, perante a força e unidade demonstradas. Dez anos depois, temos no poder muita gente que nessa altura ou assobiou para o lado ou, em termos políticos, nem existia, fazendo dessa inexistência o seu grande trunfo. Claro que temos por aí o deputado silva, porfírio de sua graça, que na altura blogava e comentava de uma forma que se ficava sem perceber bem o que queria dizer, um pouco como agora quando defende o que o mandam defender, seja que o mar é azul, verde, púrpura ou rosa.
O verdadeiro day after foi o dia do entendimento, 11 de Abril, quando os bastidores se sobrepuseram à rua, porque há democratas ocasionais que acham que a democracia só se exerce de 4 em 4 anos, numa espécie de voto em branco com cruzinha. Quando muita gente que continua por aí, já com estatuto senatorial, decidiu na sombra tramar aquilo por que muitos tinham dado a cara na luz. E não são poucos os que agora geringonçam que antes estendiam o tapete vermelho aos delírios do engenheiro. Ou que se calaram, porque era conveniente. Não esquecendo os que foram na onda, porque na altura parecia bem e já havia redes sociais para partilhar fotos.
Dez anos depois, perdi quase todas das poucas esperanças que alguma vez tive que isto possa mudar no sentido que acho o melhor, porque o que observo é desanimador, entre quem esbraceja de forma inconsequente e quem vive remoendo uma fúria interna imensa, não esquecendo quem pura e simplesmente desistiu de fazer seja o que for. Acabo por entender todos, porque cada um reage à sua forma. Eu vou escrevendo, mais para registo pessoal e memória futura, consciente de que o tempo da intervenção pública com algum sentido e margem para consequência desapareceu.
Ontem fez dez anos que tivemos esperança. Hoje faz dez anos que começou a ressaca.
(ontem, o António Duarte ainda se lembrou… mas foi caso quase único fora das “redes sociais”… nos sites das maiores federações sindicais nem se investiu, coerentemente, uma linha na evocação daquilo que ajudaram a enterrar; no meu caso, acho que já fiz a crónica suficiente do que se passou, resta o longo balanço do luto)
Republicou isto em Primeiro Ciclo.
GostarGostar
“…and in the eyes of the people there is the failure; and in the eyes of the hungry there is a growing wrath. In the souls of the people the grapes of wrath are filling and growing heavy, growing heavy for the vintage.”
GostarGostar
Concordo no essencial, mas há uma coisa que os lutadores de circunstância – talvez a maioria dos cem mil manifestantes – sempre tiveram dificuldade em entender: que as aparentes “conquistas” que se conseguem num raro momento de mobilização e unidade não são vitórias ganhas para todo o sempre. Podem ser facilmente revertidas caso as circunstâncias se alterem e a determinação de prosseguir a luta tenha esmorecido.
E há uma coisa que o Paulo tem analisado muito bem, no livro que escreveu e em escritos mais recentes, que é a amplitude da frente anti-professores que funcionou como a verdadeira e oculta muralha de aço em torno das políticas de MLR. E nem adianta muito culpar os professores medrosos, “adesivos” ou a “traição” dos sindicatos. A esta distância, torna-se cada vez mais evidente que uma luta radical, na base do tudo ou nada, contra uma tão vasta coligação de interesses, não teria qualquer hipótese de ser bem sucedida.
Amanhã desenvolvo.
GostarGostar
Discordo dessa forma de semi-branqueamento da capitulação sindical.
Não é o tudo ou nada… é ser firme em defender algo de forma consequente com o que se enuncia, para que as saídas não sejam sempre de sendeiro. E a verdade é que para os professores de carreira, em especial perante as vagas para acesso ao 4º e 6º escalão, nenhuma saída foi de leão (ou águia ou dragão).
Se não havia qualquer hipótese (e eu sei o que escrevi)?
A verdade é que nem tentaram quando foram encostados à parede.
Que é o que voltará a acontecer em breve, se tudo se desenvolver de acordo com o guião das “conquistas”.
GostarGostar
Claro que nenhuma “conquista” é definitiva.
Mas também nenhuma “derrota” o deveria ser.
E parece que já nos acomodámos a isso.
Curiosamente, mais os lutadores profissionais do que os de circunstância, porque esses ainda tinham ideais. Os tipos das pizzas já se converteram ao muito ao pragmatismo puro e duro, desde que se mantenham longe das salas de aula.
GostarGostar
Eu, lutador de circunstância, te digo: – Vai dar banho ao cão, pá! Desampara!
GostarGostar
Obrigado pela memoria.
GostarGostar
10 anos …e estamos nisto !
GostarGostar