Vou directo ao que passa por ser a “substância” da nova resposta da Fenprof a uma iniciativa que parece estar a incomodá-los mais do que seria de esperar. Com o título de “Falar claro!” faz mais por baralhar os colegas do que por esclarecê-los. Por isso mesmo, vou primeiro ao que são apresentadas como “as razões por que a FENPROF não apoia a iniciativa legislativa de cidadãos sobre a recuperação do tempo de serviço”. Mais tarde, com natural delícia, irei ao resto do texto que é muito revelador sobre a perceptível falta de capacidade política da Fenprof influenciar seja o que for de relevante para a carreira dos professores que ainda pensam tê.la.
“Argumento” 1:
Um é exigir que a contagem integral e consequente reposicionamento tenham lugar em 2019. Só por si, inviabilizaria a aprovação da contagem de todo o tempo, pois dificilmente contaria com o apoio de qualquer grupo parlamentar, dado o peso que teria no Orçamento do Estado de um só ano. Que é justa a exigência, disso não há qualquer dúvida. O problema é que, com ela, poríamos em causa o essencial: a recuperação de todo o tempo que foi prestado. Diz-nos a experiência que a abertura para negociar um faseamento foi sempre a forma de garantir a recuperação de períodos de tempo perdidos. A proposta que a FENPROF apresentou vai no sentido de, praticamente todos os anos, os professores mudarem um escalão, garantindo que em 2023 tenham recuperado todo esse tempo.
Este é um argumento político que nos diz que a resolução 1/2008 foi feita apenas para iludir os papalvos e para preencher agenda, pois, pelos vistos, não há a garantia de “qualquer grupo parlamentar” apoiar a concretização do que prometeram. Sublinho a expressão porque se percebe que, afinal, eles são mesmo “todos Centeno” e a submissão à lógica orçamental sobre os direitos laborais é aceite por todos os partidos representados na Assembleia da República. É isto que a Fenprof diz. Se fosse em outros tempos, este tipo de argumento usado pela FNE ou por um partido de “Direita” levaria a rasgarem as vestes e a dizerem o pior possível de tal pragmatismo político resultante da “obsessão” com a disciplina orçamental. Isto significa, tão simplesmente, que a geringonça educativa não acautelou esta situação nos seus acordos e que, não estando no programa de governo, este tipo de compromisso, tudo depende da disponibilidade do PS dar acolhimento ao que os outros partidos que suportam o governo tenham coragem para lhes apresentar como sendo uma exigência “justa”.
Para além disso, diz-me a experiência que as negociações desenvolvidas pela Fenprof na última década raramente (nunca?) alcançaram os objectivos declarados no que aos professores de carreira diz respeito, pelo que nada me diz que esta estratégia de “faseamento” tenha destino diferente. Por isso mesmo, a iniciativa que apresentamos pretende que, antes cedo do que tarde, cada um assuma ao que anda e até ao que pretende ir, em vez de nos iludir e fazer perder mais anos.
“Argumento” 2:
O outro problema tem a ver com a avaliação do desempenho. Durante os períodos de congelamento, em que a avaliação esteve suspensa, houve escolas que quiseram, apesar disso, avaliar os professores. Muitos recusaram, já que a progressão estava congelada. Com a Lei do Orçamento do Estado para 2018, os professores foram todos avaliados de Bom no período de congelamento. Teria sentido que, agora, fosse aprovada uma lei que retirasse a menção de Bom a quem recusou ser avaliado naquele período, implicando a perda de tempo de serviço? Claro que não.
Esta consideração é duplamente falaciosa. Por questões jurídicas (a LOE para 2018 deixa de fazer efeito no próximo dia 31 de Dezembro, pelo que a 1 de Janeiro de 2019 o que lá está contido perde efeito) e por questões políticas, porque a proposta que apresentamos é muito mais ponderada, completa e não abre o flanco a “eles querem é subir sem ser avaliados”.
Basta ler o que se propõe:
4. Nos casos em que exista a necessidade de considerar a avaliação de desempenho dos períodos referidos no número 1 e a mesma não exista, por motivos não imputáveis ao docente, deve ser considerada a menção de Bom, administrativamente atribuída.
5. Para interpretação do disposto no número 4 deste artigo, apenas se consideram como motivos imputáveis ao docente, o mesmo se tiver recusado, expressamente, a ser avaliado, ou não ter praticado os atos necessários à existência dessa avaliação de desempenho, desde que para tal tenha sido notificado durante o período de vigência da suspensão de contagem de tempo de serviço.
É claro que esta formulação é clara, justa e equitativa, não dando cobertura a situações dúbias ou vulneráveis a ataques demasiado fáceis. O que a Fenprof imputa à nossa iniciativa é, pois, falaccioso e, não gostaria de acreditar nisso, voluntariamente distorcedor do que está proposto com a intenção de agitar perigos e bichos-papões inexistentes. Pior… a Fenprof escreve algo absolutamente insustentável num debate “político” público, admitindo “Teria sentido que, agora, fosse aprovada uma lei que retirasse a menção de Bom a quem recusou ser avaliado naquele período, implicando a perda de tempo de serviço?
Este tipo de argumentação é aceitável sem imensas vulnerabilidades? Claro que não!
O que propomos corresponde ao que a Fenprof escreve? Claro que não!
Mas toda a restante parafernália de falácias deste comunicado, vergonhosamente divulgado no dia 25 de Abril, merece texto mais desenvolvido e adequadamente sarcástico, por provar de forma indesmentível muito do que eu, em termos pessoais, tenho escrito sobre a geringonça educativa em termos políticos e ao facto de certas organizações se terem prestado a uma função de muleta de governo, promovendo o adormecimento da classe docente durante mais de dois anos. Aliás, ainda é isso que faz, funcionando como amortecedor político-jurídico da luta dos professores nas suas múltiplas variantes, que não passam apenas pelo amén de uma organização.

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