O Tempo da Educação

Excerto do texto para JLetras/Educação deste mês:

O ano lectivo de 2018/19 vai ser marcado pelo cruzamento de diversas políticas com um impacto directo na vida das escolas e daqueles que nelas desenvolvem o seu trabalho quotidiano, sejam alunos, pessoal não docente ou docente. Não esquecendo as famílias dos alunos, que os confiam a maior parte das horas de cada dia a essas escolas. Teremos, entre outras alterações certamente menores, três grandes áreas de mudança: o avanço da chamada “descentralização de competências” do Estado Central para as Autarquias em matéria de Educação (leia-se “municipalização da Educação”); a generalização do que se tem apresentado como projecto de “Autonomia e Flexibilidade Curricular” (leia-se, segunda vaga da “Gestão Flexível do Currículo” e ainda o novo regime jurídico da Educação Inclusiva).

Todas estas medidas têm vindo a ser anunciadas, debatidas, objecto de pareceres diversos, alteradas na sua versão mais recente, mas ao finalizar o mês de Abril e com o terceiro período do presente ano lectivo já a caminho da fase dominada pela realização de provas de afeição e provas finais de ciclo no Ensino Básico e exames do Ensino Secundário, ainda não se conhecem os diplomas na sua versão final, criando imensas zonas de incerteza quanto a muitas condições concretas da sua implementação que impossibilitam a sua preparação atempada. Em alguns casos, há versões em discussão datas de finais do mês de Março e pareceres (do Conselho de Escolas e do Conselho Nacional da Educação) que não se percebe se foram feitos contemplando as últimas modificações introduzidas.

Só quem conhece os ritmos dos tempos escolares por dentro é que consegue entender verdadeiramente que um ano lectivo não pode, nem deve, começar a ser pensado a meio ou no final do terceiro período do ano anterior a um “ímpeto reformista” com esta dimensão. Porque estas mudanças implicam alterações profundas em áreas como o desenho do currículo a nível local, a definição do perfil das turmas a constituir, a caracterização dos alunos a incluir, em muitos casos pela primeira vez, em turmas ditas “regulares” ou mesmo qual o órgão com autonomia para definir e aprovar, em última instância, as orientações estratégicas das escolas e agrupamentos. Não pode ser a partir de Maio, quando todos, com destaque para os professores, estão envolvidos em diversas funções que exigem um elevado grau de concentração e responsabilidade, que este tipo de medidas deve ser “despejado” sobre as escolas, esperando-se que – com prazos reduzidos – tudo seja preparado de uma forma conveniente.

(continua…)

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A Fenprof Volta a Reagir! 3 – O Amuo

Há umas partes deliciosas no segundo comunicado da Fenprof. Uma dela é a espécie de amuo por não lhe terem pedido “opinião” sobre a iniciativa legislativa

Tivessem os autores da iniciativa procurado uma opinião, apenas isso, e a FENPROF teria colocado as suas preocupações. O que aconteceu foi que os colegas que decidiram avançar com a iniciativa limitaram-se, depois de a lançar publicamente, a apelar à “comunidade sindical” para que a apoiassem.

Obrigado por, pelo menos, nos chamarem “colegas”. Pelo menos em público. Quanto ao resto, sendo eu da Comissão inicial, (mas não do par de responsáveis originais pelo arranque da coisa), nunca me passaria pela cabeça pedir-vos a “opinião”, pois isso só serviria para desenvolverem as tácticas do costume: apropriação ou esvaziamento da iniciativa, conforme achassem melhor. Aliás, a iniciativa é de cidadãos e não de organizações e só nesse sentido eu aceitaria fazer parte deste tipo de “luta”, sim, porque isto é também uma “luta”, mesmo se não certificada com o selo da legitimidade fenprofiana.

Foram apanhados de surpresa, sem tempo de enviarem controleiros ou submarinos para uma qualquer reunião de trabalho? Tenho muita pena.

Mas agora recuperemos a parte (involuntariamente, acredito) mais cómica deste comunicado:

 A FENPROF não tem qualquer problema em aderir a iniciativas que partam dos professores, pelo contrário, mas não adere apenas por aderir. A FENPROF tem a responsabilidade de representar os professores, desde logo os seus mais de 50.000 associados, e depois, em abstrato, todos os que exercem a profissão docente. Como tal, não pode entrar em iniciativas que possam resultar em “tiro no pé”, como é o caso desta, que tem elevadíssimos riscos de o resultado final ser contrário ao seu objetivo.

Só umas notas breves:

  1. Não me lembro da Fenprof aderir a qualquer iniciativa de que não tenha fornecido previamente o guião.
  2. Se eu fosse fazer a lista de “tiros no pé” dados pela Fenprof em sede negocial, ocuparia o resto da semana a escrever posts.
  3. É giro ver-vos aflitos, a justificarem-se, a baralharem-se e a recrutarem “velhas glórias” da ortodoxia (para quando a chamada do chicoremaxsantos para a brigada?) para irem para o facebook dizer mal da iniciativa e apelarem à não assinatura.
  4. É ainda interessante ver como assumem a enorme fragilidade política da vossa participação na geringonça educativa no que à defesa dos “velhos” professores de carreira diz respeito. Andaram dois anos aos bonés… submetidos à lógica orçamental que criticavam sem dó nem piedade a outros. Aceitaram migalhas sem reflexos orçamentais. Agora o rio já vos passou a perna como parceiro para tudo o que possa doer.

Flecha-alvo

 

A Fenprof Volta a Reagir! 2 – A Questão “Política”…

Nos últimos dias verificou-se uma inflexão na argumentação da Fenprof contra a iniciativa legislativa para recuperar o tempo de serviço dos professores sem cozinhados em gabinete. Inicialmente, afirmaram que “já existe lei” e apontaram para o artigo 19º da LOE para 2018. Confesso que, divergências à parte, sempre achei que a Fenprof colocava algum cuidado nas suas declarações públicas, mesmo quando a causa ou o tom era infeliz. Ora… como tentei demonstrar (e não apenas eu) um artigo de uma lei de OE não é uma “lei” em especial quando o lá vem é demasiado vago e não dá para justificar seja o que for. Relembremos o artigo em causa:

OE2018 Art19

Isto é uma mão cheia de nada. Não é uma “lei” onde se preveja a recuperação integral do tempo de serviço efectivamente prestado. É uma “bucha” ali metida para que os sindicatos não ficassem demasiado mal vistos em tudo isto.

Percebendo o erro de insistir em tal, a argumentação virou-se para a dimensão “política” da recuperação do tempo de serviço. Há uns dias, um velho conhecido comentador/stalker (sob múltiplos nicks) do Umbigo foi ao Faceprof iniciar a onda, com todo o peso do seu passado sindicalista de candidato (já com pedido de aposentação metido) derrotado ao spgl.

Vargas

O zédoboné (aquele que um certo líder sindical me garantiu não conhecer há uns anos) deu o mote para o arranque de uma nova etapa da reacção da Fenprof (porquê tanta preocupação? acaso será por perceberem que recolhemos mais assinaturas com uma plataforma hostil do que as vossas petições com uma rede nacional de delegados?) que culminou no comunicado de ontem (25 de Abril!) que é absolutamente desastrado e desastroso nesse mesmo plano político e confirma o que há mais de dois anos aqui escrevo sobre a incapacidade da geringonça educativa ir além das migalhas para a classe docente e do zero especificamente para os professores de carreira, tendo falhado o timing e sendo agora desnecessária num contexto em que o rio laranja está disponível para tudo e mais além. Alegando que não está no programa do governo – porque não foi considerada matéria prioritária – o PS está, ao que parece, de mãos livres para desenvolver a sua velha política de afrontamento aos professores.

E o comunicado da Fenprof declara isso sem grande margem para dúvidas, confessando que a resolução 1/2018 é, para todos os efeitos, uma inutilidade (como o artigo 19º da LOE para 2018, poderiam acrescentar).

Não está, porém, convencido o PS, daí que, confrontado com o voto favorável à Resolução 1/2018, que recomenda a contagem de todo o tempo de serviço, o deputado responsável pela Educação no grupo parlamentar tem afirmado que se recomenda o desejável e legisla o possível. Esta posição foi reiterada em reunião realizada com a FENPROF em 18 de abril.

E acrescenta:

Neste quadro, se na Assembleia da República fosse agendada a discussão de um projeto de lei, por exemplo, da iniciativa de cidadãos, abrir-se-ia a porta ao agendamento de outras iniciativas legislativas, designadamente do governo, no sentido de passar para lei o que, até agora, não conseguiu impor aos sindicatos de professores: recuperar, apenas, 2 anos, 9 meses e 18 dias, apagando mais de 70% do tempo cumprido durante o congelamento.  E, repare-se, não é por acaso que o governo não apresentou aquela proposta em projeto de diploma legal. É que sabe que só o poderá fazer se nós – professores e organizações sindicais – aceitarmos negociar o tempo de serviço.

Isto é particularmente grave porque confessa que não existe confluência na geringonça educativa (a menos que seja em acabar com o “exame da 4ª classe” ou em aprovar provas de aferição disparatadas) para a defesa dos direitos laborais dos professores. Depois há uma parte confusa… que é aquela do governo não ter apresentado uma proposta (que era para toda a Função Pública, relembre-se) porque isso só seria possível se “aceitarmos negociar o tempo de serviço”.

Estão a gozar connosco? Mas desde quando uma medida governamental não foi imposta só porque a Fenprof votou contra? Com ou sem negociações suplementares? Mas tomam-nos por idiotas? Pensam que fazemos o vosso papel, quando vão de malinha debaixo do braço ser engabelados nas negociações, rendendo-se a um artigo da treta na LOE e vindo para a comunicação social anunciar uma vitória de que até o pirro se envergonharia?

Porque é FALSA, esta sim, a seguinte afirmação ” Não vamos abrir a porta para que, por outra via, o governo concretize tal objetivo. O tempo de serviço não se negoceia, conta-se, e a lei já o obriga!” Se fosse verdade, então o que andam a “negociar”? O tal “faseamento”? Mas o “faseamento” é uma questão “política” ou “orçamental”? A que a Fenprof se rendeu na sua habitual deriva pragmática, quando é apertada?

“exigir que a contagem integral e consequente reposicionamento tenham lugar em 2019 [,] .só por si, inviabilizaria a aprovação da contagem de todo o tempo, pois dificilmente contaria com o apoio de qualquer grupo parlamentar, dado o peso que teria no Orçamento do Estado de um só ano.”

Percebemos. A Fenprof também é Centeno e revela uma compreensão imensa para o governo (aceitando como bons os seus cálculos sobre “encargos”), como a FNE nos tempos de Passos Coelho/Crato quando, em nome de coiso e tal, aceitou a PACC só para alguns (e a gora estamos sem professores para substituições em vários grupos disciplinares devido ao afastamento de muita gente).

A contagem integral do tempo de serviço dos docentes é uma “questão política”? Ou é uma questão resultante de prioridades orçamentais que não contemplam os professores de carreira, sacrificados para ceder a outras pressões, como vinculações “extraordinárias” ou criação de mais horas para grupos disciplinares “amigos”, que satisfazem clientelas muito específicas de alguns sectores do PS e do Bloco?

Flecha-alvo

Quanto ao amoque de o grupo que promove esta ILC não ter pedido “opinião” à Fenprof, acho que merece um post específico, devidamente sarcástico, até porque me lembro de outros tempos em que os pedidos de opinião eram no sentido inverso (sim, tenho alguns dos mails “oficiosos” ainda guardados… só apaguei os sms da “ponte/controleira” de então, a que promoveu o tal jantar aqui no alcanena… aquele de que há fotos, algures…).

A Fenprof Volta a Reagir! 1 – Os “Argumentos”

Vou directo ao que passa por ser a “substância” da nova resposta da Fenprof a uma iniciativa que parece estar a incomodá-los mais do que seria de esperar. Com o título de “Falar claro!” faz mais por baralhar os colegas do que por esclarecê-los. Por isso mesmo, vou primeiro ao que são apresentadas como “as razões por que a FENPROF não apoia a iniciativa legislativa de cidadãos sobre a recuperação do tempo de serviço”. Mais tarde, com natural delícia, irei ao resto do texto que é muito revelador sobre a perceptível falta de capacidade política da Fenprof influenciar seja o que for de relevante para a carreira dos professores que ainda pensam tê.la.

“Argumento” 1:

Um é exigir que a contagem integral e consequente reposicionamento tenham lugar em 2019. Só por si, inviabilizaria a aprovação da contagem de todo o tempo, pois dificilmente contaria com o apoio de qualquer grupo parlamentar, dado o peso que teria no Orçamento do Estado de um só ano. Que é justa a exigência, disso não há qualquer dúvida. O problema é que, com ela, poríamos em causa o essencial: a recuperação de todo o tempo que foi prestado. Diz-nos a experiência que a abertura para negociar um faseamento foi sempre a forma de garantir a recuperação de períodos de tempo perdidos. A proposta que a FENPROF apresentou vai no sentido de, praticamente todos os anos, os professores mudarem um escalão, garantindo que em 2023 tenham recuperado todo esse tempo.

Este é um argumento político que nos diz que a resolução 1/2008 foi feita apenas para iludir os papalvos e para preencher agenda, pois, pelos vistos, não há a garantia de “qualquer grupo parlamentar” apoiar a concretização do que prometeram. Sublinho a expressão porque se percebe que, afinal, eles são mesmo “todos Centeno” e a submissão à lógica orçamental sobre os direitos laborais é aceite por todos os partidos representados na Assembleia da República. É isto que a Fenprof diz. Se fosse em outros tempos, este tipo de argumento usado pela FNE ou por um partido de “Direita” levaria a rasgarem as vestes e a dizerem o pior possível de tal pragmatismo político resultante da “obsessão” com a disciplina orçamental. Isto significa, tão simplesmente, que a geringonça educativa não acautelou esta situação nos seus acordos e que, não estando no programa de governo, este tipo de compromisso, tudo depende da disponibilidade do PS dar acolhimento ao que os outros partidos que suportam o governo tenham coragem para lhes apresentar como sendo uma exigência “justa”.

Para além disso, diz-me a experiência que as negociações desenvolvidas pela Fenprof na última década raramente (nunca?) alcançaram os objectivos declarados no que aos professores de carreira diz respeito, pelo que nada me diz que esta estratégia de “faseamento” tenha destino diferente. Por isso mesmo, a iniciativa que apresentamos pretende que, antes cedo do que tarde, cada um assuma ao que anda e até ao que pretende ir, em vez de nos iludir e fazer perder mais anos.

“Argumento” 2:

O outro problema tem a ver com a avaliação do desempenho. Durante os períodos de congelamento, em que a avaliação esteve suspensa, houve escolas que quiseram, apesar disso, avaliar os professores. Muitos recusaram, já que a progressão estava congelada. Com a Lei do Orçamento do Estado para 2018, os professores foram todos avaliados de Bom no período de congelamento. Teria sentido que, agora, fosse aprovada uma lei que retirasse a menção de Bom a quem recusou ser avaliado naquele período, implicando a perda de tempo de serviço? Claro que não.

Esta consideração é duplamente falaciosa. Por questões jurídicas (a LOE para 2018 deixa de fazer efeito no próximo dia 31 de Dezembro, pelo que a 1 de Janeiro de 2019 o que lá está contido perde efeito) e por questões políticas, porque a proposta que apresentamos é muito mais ponderada, completa e não abre o flanco a “eles querem é subir sem ser avaliados”.

Basta ler o que se propõe:

4. Nos casos em que exista a necessidade de considerar a avaliação de desempenho dos períodos referidos no número 1 e a mesma não exista, por motivos não imputáveis ao docente, deve ser considerada a menção de Bom, administrativamente atribuída.

5. Para interpretação do disposto no número 4 deste artigo, apenas se consideram como motivos imputáveis ao docente, o mesmo se tiver recusado, expressamente, a ser avaliado, ou não ter praticado os atos necessários à existência dessa avaliação de desempenho, desde que para tal tenha sido notificado durante o período de vigência da suspensão de contagem de tempo de serviço.

É claro que esta formulação é clara, justa e equitativa, não dando cobertura a situações dúbias ou vulneráveis a ataques demasiado fáceis. O que a Fenprof imputa à nossa iniciativa é, pois, falaccioso e, não gostaria de acreditar nisso, voluntariamente distorcedor do que está proposto com a intenção de agitar perigos e bichos-papões inexistentes. Pior… a Fenprof escreve algo absolutamente insustentável num debate “político” público, admitindo “Teria sentido que, agora, fosse aprovada uma lei que retirasse a menção de Bom a quem recusou ser avaliado naquele período, implicando a perda de tempo de serviço?

Este tipo de argumentação é aceitável sem imensas vulnerabilidades? Claro que não!

O que propomos corresponde ao que a Fenprof escreve? Claro que não!

Mas toda a restante parafernália de falácias deste comunicado, vergonhosamente divulgado no dia 25 de Abril, merece texto mais desenvolvido e adequadamente sarcástico, por provar de forma indesmentível muito do que eu, em termos pessoais, tenho escrito sobre a geringonça educativa em termos políticos e ao facto de certas organizações se terem prestado a uma função de muleta de governo, promovendo o adormecimento da classe docente durante mais de dois anos. Aliás, ainda é isso que faz, funcionando como amortecedor político-jurídico da luta dos professores nas suas múltiplas variantes, que não passam apenas pelo amén de uma organização.

Flecha-alvo

 

 

A Fenprof Volta a Reagir!

De uma forma absolutamente desastrada na forma e na substância à nossa iniciativa para recuperação do tempo de serviço. Misturando alhos com bugalhos e revertendo toda a lógica do comunicado anterior, tropeça nos seus próprios argumentos e revela mais sobre a geringonça educativa do que gostaria. Daqui a pouco já desmonto a coisa, como nos bons velhos tempos em que adorava desmontar os comunicados ministeriais. É que não são assim tão diferentes.

Finger