Voltámos a 2008? (Actualizado)

Se em matéria de crenças pedagógicas voltámos a 1998, quanto à forma de relacionamento com os professores estamos de regresso a 2008. A SE Leitão é a herdeira do estilo inconfundível de uma MLR quanto à sensibilidade humana para com os professores e da elegância de um Valter Lemos em matéria de gestão dos números para consumo mediático.

Alegar que poupou 44 milhões de euros com a mudança de regras (afinal, sempre mudaram as regras?), nos termos em que a coisa é apresentada, é uma falácia enorme. Concentremo-nos no essencial da resposta da SE Leitão ao Público:

Em resposta ao PÚBLICO, o ME fez agora saber que o facto dos docentes de carreira terem ficado colocados em horários completos “implicou uma redução no número de professores a contrato”. “Deste modo, através da contratação inicial [o concurso destinado aos contratados] procedeu-se à contratação de 2300 professores não vinculados, em vez dos quatro mil que seriam necessários caso não se tivesse tomado aquela opção”, explica, acrescentando que tal resultou numa poupança de 44 milhões de euros.

Em primeiro lugar, teria de ser demonstrado que todos os professores que não foram contratados resultaram dessa mudança de regras… ora… a SE Leitão e outros falavam em 100-200 afectados pelas medidas tomadas em Agosto de 2017 como se salta, subitamente, para 1700? Quando é que se decidiu mentir? Porque, por exemplo, este ano, existiram centenas de professores não colocados como em 2016/17 ao abrigo do PNPSE. E não é verdade que diminuiu o número de alunos? E não entraram cerca de 3000 professores na vinculação chamada “extraordinária”? Claro que houve menos contratados!!!

Em segundo lugar, os números não batem certo, mesmo na perspectiva do spin ministerial. Porque menos 1700 professores contratados, a larga maioria deles em horários completos e não anuais, nunca totalizariam 44 milhões de euros, mesmo em cálculos maximalistas… e isto, repito, aceitando como válidos números perfeitamente truncados e/ou deturpados.

Um professor contratado profissionalizado tem um salário nominal de 1373,13€, embora me digam que agora já todos recebem pelo índice 167 (1518€). Multipliquemos isso por 14 meses (mesmo sabendo que a maioria tem colocações temporárias) e temos um encargo anual ilíquido um pouco acima dos 21.250€. Se multiplicarmos isso pelos tais míticos 1700 docentes não contratados e temos 36.000 M€. Repito que isto é um cálculo absolutamente maximalista, pois se os horários eram incompletos… e não anuais, os encargos totais terão sido muito mais baixos. E não tem em consideração que muito desse dinheiro volta para o Estado, através dos descontos (IRS, CGA/SS).

Façamos as coisas de outra forma: existiram cerca de 1000 recursos hierárquicos de professores na sequência do concurso de 25 de Agosto de 2017. Usemos esse número como base. Se considerarmos que, apesar de tudo, as colocações foram em 50% dos casos em horários incompletos (de 8 a 20 horas… uma média de 16 horas será generosa) e termos 500 desses 1000 professores a receber (em bruto) pouco mais de 1000 euros por mês. Se considerarmos ainda a hipótese muito provável – basta observarmos em nosso redor – que muitos desses horários (incompletos ou completos) nem sequer foram de duração anual, perceberemos que o valor “poupado” pela SE Leitão “Centeno” poderá andar por muito menos de metade do que ela afirmou… talvez entre 10 e 15 milhões de euros… com o subsídio de refeição incluído (atenção aos horários incompletos), fixemo-nos no valor máximo desses 15 milhões de euros.

Basta perceber as coisas como elas são… o que se observa nas escolas… a elevada rotação de professor@s contratad@s, o facto de serem obrigad@s a estarem em 2-3 escolas para completarem um horário… ou o facto de estarem meses e meses com ele incompleto para se perceber que os números do spin da SE Leitão são falsos.

Algo que o Arlindo tenta demonstrar com a sua contabilidade actualizada sobre as contratações:

Até ao presente mês (Abril), segundo contas feitas pelo docente Arlindo Ferreira, especialista em estatísticas da educação, foram colocados 5293 professores contratados em horários completos. Todas estas contratações não foram contabilizadas pelo Governo na sua contabilidade sobre os concursos.

É minha aborrecida convicção que ela deveria ser confrontada com isso e obrigada a demonstrar factualmente o que afirma. E, por uma vez, deixar de estar imune a qualquer responsabilização pelos seus abusos políticos e jurídicos… pois, afinal, sempre mudou as regras. Só que agora quer saber se a sua decisão “discricionária” pode ter cobertura “constitucional”.

Infelizmente, para além do salto atrás em termos pedagógicos, esta equipa ministerial mostra-nos agora que vale tudo para intoxicar a opinião pública.

Se mesmo só 10-15 milhões de euros são poupança suficiente para justificar a alteração das regras do concurso? Depende do preço que colocarmos no cumprimento das regras e boa-fé do Estado de Direito. O verdadeiro, não o de juristas oportunistas.

conta

(e, já agora, quanto tem gasto o ME em contratações externas de escritórios de advogados?)

16 opiniões sobre “Voltámos a 2008? (Actualizado)

  1. Bom dia

    Como certamente saberá todos os docentes profissionalizamos recebem neste momento pelo índice 167. A esses cálculos deverá acrescentar o valor pago pelo respetivo subsídio de refeição.

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  2. Já introduzi a correcção sugerida, que tem pouca influência no desfecho final,,pois o “truque” da SE Leitão está em aumentar artificialmente o número de não contratados no concurso de MI e depois ignorar que os horários, são incompletos, pelo que as pessoas recebem menos e nem sequer, em tantos casos, os 14 meses.

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  3. Típico dos xuxialistas! Dão com uma mão para tirar com a outra e fingir que viraram a página da austeridade. Não há censura, mas há uma opinião pública condicionada ao politicamente correto e à propaganda do governo e dos seus apoiantes de esquerda.
    São todos iguais, mas no caso deste governo e dos seus apoiantes são mais iguais que outros porque diziam-se diferentes e acabam por fazer o mesmo e pior. Vide a obsessão pelo déficit…
    Não se vê qualquer espécie de investimento público, especialmente no setor da educação e da saúde, ao contrário do que foi e continua a ser alardeado. É só propaganda para inglês ver.
    Só para dar um exemplo, veja-se a degradação dos transportes públicos em Lisboa. E a medida propagandística dos manuais gratuitos em Lisboa. Havia necessidade? Já não há o SASE para quem comprovadamente necessita de apoio?

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  4. Para ser sincero devo dizer previamente que no que ao ministério da educação diz respeito ainda não consegui sair de 2008.

    https://www.publico.pt/2018/04/27/sociedade/noticia/ministerio-mudou-regras-e-poupou-40-milhoes-1815472

    Esta secretária de estado tem uma notável criatividade matemática. Os 40 milhões propagandeados são conversa da treta.

    O facto de não ter atribuído horários incompletos aos professores da mobilidade interna a 25 de agosto não garante poupança de 1 cêntimo.

    Porque os horários que sonegou a 25 de agosto disponibilizou-os em 6 de setembro, na primeira reserva de recrutamento, a professores dos quadros de zona pedagógica que ainda não estavam colocados (que auferem o mesmo vencimento) mas estavam posicionados muito atrás nas listas de graduação.

    A única coisa que conseguiu foi promover injustiças e ultrapassagens nas colocações.

    Os professores colocados em horários letivos incompletos mal chegam à escola tem logo o seu horário totalmente preenchido com turmas dos cursos que o ministério só autoriza a abertura quinze dias antes do início das aulas, apoios aos alunos, etc. Que nenhum(a) fundamentalista da otimização dos recursos humanos fique preocupado.

    Não se compreende o cisma da secretária leitão com os horários incompletos na mobilidade interna.

    Se a secretária Leitão está tão preocupada com o orçamento do estado pode entregar metade do seu ordenado à tesouraria da fazenda pública. Haja coragem.

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  5. Nós professores, estamos à mercê desta gente que entra e sai dos gabinetes do estado sem um pingo de vergnha. As escolas estão cheias de professores acomodados e preocupados apenas com o seu umbigo. No outro dia a falar com colegas sobre a questão das cotas e a maneira de ultrapassar isso, dando os excelentes e os muito bons a quem estava nos 4º e 6º escalões, de modo a não serenm penalizados, eis que salta uma colega e diz, era o que faltava! dar os excelentes e os muito bons a quem não merece! Agora em silèncio que ninguém nos ouve, devia estar a falar dela própria! enfim, não gosto de estar aqui a dizer mal dos colegas, mas há muita gente que merece aquilo que tem!

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    1. Concordo a 200%.
      Alias quem não teve essas quotas na sua progressão (pessoal do 7° escalão para cima) deveria por principio ser o “organizador e facilitador” dessa defesa da honra perante a desfaçatez dos governos em criar essas barreiras.

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  6. Paulo,

    Se aos 36 milhões acrescentar os 23% que a entidade empregadora paga à SS, fica nos 44.

    De qualquer forma, não deixa de ser uma grande aldrabice.

    Cumprimentos.

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    1. Pois… mas esse dinheiro volta para o “Estado”.
      Eu sei que de acordo com as regras das Finanças Públicas os cálculos deles são outros. Já me “doutoraram” sobre isso numa conversa em off sobre outros cálculos feitos por um organismo muito “conselheiro”.

      Só que… tudo isso é uma ficção… a verdade é que o Estado recupera grande parte do que paga aos seus funcionários… aliás, nem chega a sair dos seus cofres… muda só de sítio…

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      1. Sem dúvida, daí a aldrabice.

        Só o dinheiro efectivamente recebido pelos professores é que sai dos cofres do Estado. O restante fica lá.

        Cumprimentos.

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  7. Mas o que não volta para nós é a tranquilidade e continuidade que era suposto uma colocação por 4 anos trazer!!! Por erro deles voltamos ao stress da incerteza de onde estaremos no ano que vem…
    E isso, que preço tem???????????
    Pois eu e os meus 3 filhos estamos FARTOS de andar constantemente a mudar de terra por incompetência de legisladores e de quem, supostamente, nos devia governar! As regras estão constantemente a mudar a meio do jogo e nós lá vamos na avalanche….
    Muita coisa precisa de mudar, inovar e melhorar na Educação mas para que isso seja possível é necessário que os professores tenham estabilidade, tranquilidade e ânimo para investir na profissão. Se nos esgotam com questões de sobrevivência económica, emocional e social, o que nos resta para investir?????

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