O Conselho Cientifico-Pedagógico da Formação Contínua de Professores foi destituído por despacho de 23 de Maio (com publicação em DR no dia 30) do secretário de Estado João Costa, quase dois meses depois de estarem no segundo mandato, sem qualquer explicação oficial para o facto. Ao que parece, as “queixas” teriam a ver com o facto do órgão em causa estar a “obstaculizar” a generalização de um tipo de formações muito queridas pela actual facção ideológica no poder no ME.
Aliás, isso é admitido com clareza no comunicado em que se comunica a nova constituição do CCP, presidido agora por um dos braços direitos do SE Costa na teorização do pafismo educacional.
Esta nomeação dá assim seguimento ao cumprimento das prioridades formativas dos docentes e dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas, tendo em vista a concretização dos seus projetos educativos e curriculares e a melhoria da sua qualidade e da eficácia, bem como da qualidade do ensino e dos resultados das aprendizagens, contribuindo, por essa via para reforço dos projetos educativos e curriculares como forma de consolidar a organização e autonomia das nossas escolas.
No entanto, no despacho em causa alega-se que:
Considerando que o mandato dos membros do Conselho científico–pedagógico de formação contínua designados pelo Despacho n.º 4635/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 63, de 31 de março, cessou por decurso do respetivo prazo, mostra -se necessário proceder à designação dos novos membros do Conselho científico-pedagógico de formação contínua.
Mas o despacho n.º 313/2015, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 8, de 13 de janeiro, determinava que:
2 – O mandato dos membros do CCPFC tem a duração de quatro anos, renovável por igual período.
3 – Sem prejuízo do previsto no número anterior, os mandatos dos membros do CCPFC podem cessar a todo o momento, por despacho fundamentado do membro do Governo responsável pela área da educação.
Ok, quase dois meses depois da data, vai dar tudo ao mesmo neste sistema de anything goes em que os secretário de Estado da Educação fazem o que bem entendem.
O que me aflige especialmente é que a reorientação da Formação Contínua que se pretende é num sentido que alguém que conhece tudo o que se passou me descreve de forma que considero assustadora:
(…) acrescentaria às suas elaborações sobre a dispensabilidade dos professores, a ideia de que, neste Ministério, existe uma sanha contra a ciência, como nunca se havia visto. Não faltará muito para que, na senda do Donald Trump, imponham a “pedagogia” Walforf nas escolas e, na senda do místico Waldorf e do visionário Donald Trump, comecem a gritar contra as vacinas porque podem “provocar autismo”. As também inéditas tentativas de ingerência nas decisões cientifico-pedagógicas do Conselho, tornam esta aparente ficção numa real possibilidade.
(…)
Um aspecto interessante nesta situação é que o João Costa está empenhado numa verdadeira cruzada ideológica. No caso do CCPFC, isto é tanto mais curioso quanto se trata se um órgão cientifico-pedagógico e não político. Por outro lado, eu jamais votei ou votarei à direita (o mais à direita que alguma vez cheguei foi ao próprio PS), pelo que a cruzada dele é mesmo ideológica mas não é política. E é ideológica porque ele é um pregador da anti-ciência e das ciências da educação, ideologia que é supra-partidária, atingindo partidos da direita à esquerda do espectro político. Na verdade o que ele não quer é um Conselho Científico-Pedagógico que utilize como critério de avaliação das propostas de formação de professores as meta-análises e as revisões sistemáticas da literatura. Ele sabe que, connosco, jamais seriam aprovadas acções de formação sobre “mindfulness”, “inteligência espiritual”, “mentes sorridentes” (não o viu aqui há algum tempo na televisão, num jardim-de-infância qualquer, de mãozinhas dadas com as professoras, olhos fechados, como se estivessem a pensar em alguma coisa?), “pedagogia Waldorf”, “meditação transcendental” , etc. E não seriam aprovadas por duas razões: a primeira é que, de acordo com o regime jurídico em vigor, isso não é formação de professores (só isto já arrumaria a questão); a segunda é que, de acordo com as revisões da literatura que efectuamos (e efectuamos diversas, sobre assuntos que desconhecíamos ou sobre assunto em que pretendíamos esclarecer as pessoas, com dados na mão, não com opiniões) nada disso é ciência nem pedagogia.
Na mais grave e directa tentativa de intromissão do João Costa nas decisões do Conselho, eu disse-lhe para publicar em forma de lei o que me estava a comunicar. Se ele assumisse politicamente a decisão, o Conselho naturalmente passaria a aceitar como formação de professores. Claro que ficaria ainda a faltar a decisão cientifico-pedagógica sobre propostas específicas de formação, em que ele nem deveria sonhar em meter-se.
Sinta-se à vontade para utilizar a informação da forma que entender. Agora que deixei as funções que exercia, sou inimputável e não tenho sequer qualquer problema de anonimato. Devo aliás dizer-lhe que este não foi sequer o primeiro cargo de que ele me afastou. E no anterior, nem sequer agradeceu o trabalho que fiz! O despedimento aconteceu por email enviado por uma pessoa que, ao que sei, nem sequer é dos quadros do Ministério (e deve ter-lhe custado um pedaço enviar-me aquele email, dado os contactos mais do que produtivos que tínhamos tido nos dois meses anteriores).

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