O Ministro Tiago, Qual Anita, Foi Ao Parlamento

E levou muitos números, que apresentou de forma menos mortiça do que o habitual e, pelo menos nos excertos que apanhei nos noticiários da TSF e numa peça televisiva, até piscou menos os olhos e embrulhou-se menos nas palavras. Ouvi tudo aquilo, desde uns exactos 19% de ganhos salariais até 2 ou 3 mudanças de escalão para 90% dos professores até 2023 e perdi-lhe qualquer réstia de respeito, porque quem se presta a um papel destes, depois de tudo o que andou a dizer, é porque é “artista”, como diria o cavaco velho. Não vou já na conversa mole do “bom rapaz da província”, que até “estava muito bem em Cambridge como investigador” (as aspas não significam citações directas, mas o espírito da coisa) e decidiu vir “servir Portugal”. Não, o ministro Tiago ou já era ou tornou-se no pior que muitos políticos são, uns troca-tintas, sem qualquer decoro ou respeito por si mesmos, pela sua palavra ou pelas suas alegadas convicções. Já ouvi quem diga que “só depois de lá se estar é que se sabe mesmo como as coisas são”, já li que “é fácil criticar de fora, o difícil é governar, construir”.

Bollocks!

Estou farto, fartinho, de ver gente engolir uma narrativa que o PS serviu de forma bem pensada desde o início do mandato, agradecendo que boa parte da “Oposição” a engolisse sem crítica e associasse o ministro Tiago à Fenprof e aos interesses corporativos dos professores. Continuo sem saber se de forma tão hábil que a própria Fenprof  engoliu a narrativa, se com ela colaborou de forma voluntária, pelo menos ao nível das cúpulas, durante quase três anos.

TiagoNogueira

O ministro Tiago em nenhum momento teve qualquer acção concreta de defesa dos interesses dos professores de carreira, que nela estão integrados desde muito antes de chegar ao ME uma sucessão de ministr@s que oscilaram entre a agressividade ostensiva e a vacuidade absoluta, mas quase tod@s com o traço comum de recorrerem a factos “alternativos” e à “pós-verdade” sem qualquer pudor ou reserva ética quando se tratou de amesquinhar a classe docente ou de mentir com números martelados.

Os números que o ministro Tiago hoje apresentou, na ausência de qualquer legislação concreta que possa ser usada para avaliar como as coisas decorrerão, são mera fantasias, projecções sem qualquer sustentação na realidade. São exercícios propagandísticos servidos pelos gabinetes das Finanças a uma cabeça falante que parece acreditar que é o que nunca foi, como se tornou notório nas suas primeiras aparições, algumas delas a reboque de outros governantes que lhe fizeram a agenda, por muito que ele ache que decide alguma coisa. Como escrevi, o ministro de “cientista” tem pouco, mas de demagogo e “artista” tem muito. Porque o politicamente correcto me desaconselha que apenas o trate como um idiota útil, com umas viagens à conta, enquanto o secretário e a secretária governam no que lhes interessa.

Quase tudo o que foi afirmado pelo ministro Tiago em matéria de carreira docente, com todos aqueles números fantabulásticos é uma completa ficção, a começar por um aumento salarial médio anual de 3,6% ao ano, pois não existe qualquer decreto-lei a regulamentar o que se vai passar e a proposta que se conheceu é incompatível com o que hoje se anunciou para os próximos 5 anos, a menos que sejam eliminadas os estrangulamentos à progressão para os 3º, 5º e 7º escalões. Ou então está a pensar no aumento de 40% de uma minoria muito específica e no de 0% da maioria e faz “médias”. Até existirem elementos que todos desconhecemos, o ministro Tiago ludibriou o Parlamento e a opinião pública. Mentiu, portanto. Embora possa sempre alegar ignorância, que acreditamos.

tv_burro

(imagem do asno que somos quase todos nós, recolhida aqui)

E Por Falar Em Matarruanos…

Ontem apareceu-me no feed do fbook a publicação de um (actual? ex?) funcionário municipal vimaranense com nome meio estranho e claramente eufórico com o Bolsonaro (como acabou nas minhas amizades só demonstra que tenho fases muito pouco selectivas) a questionar quando é que apareceria entre nós um político a defender a trilogia “Pátria, Família, Religião”. Perguntei-lhe (raios, isto é mesmo coisa de feriado em que sobram 5 minutos de tédio) a  que “religião” se referia. Resposta imediata “a nossa” e agradeu a minha disponibilidade para “debater”. Repeti a questão de outra forma, ilustrando com o cartaz da velha trilogia salazarista “Deus. Pátria. Família”. Que se era aquela, eu dispensava. Replicou que o Salazar já desapareceu há 70 anos [sic] e que a “nossa” religião é a “católica” desde Afonso Henriques. Defeito de formação… anotei o erro de cronologia sobre a morte de Salazar e ainda que no século XII o “catolicismo” ainda estava longe da sua auto-definição mais cuidadosa no século XVI quando do confronto com as tendências reformistas. A reacção foi pouco amistosa, mandando-me visitar o Museu Alberto Sampaio onde estarão materiais que comprovam como o Afonso Henriques teve a bênção do Papa para formar Portugal e o seu agradecimento pela sua vitória contra os espanhóis em Aljubarrota.

Foi por aí que me perdi, talvez por ter visitado o Museu em causa há já muitos anos e por certo estar desactualizado sobre o seu espólio. Ainda tentei dizer que o Papa só aceitou Portugal como reino autónomo após décadas de tributos anuais em ouro, que os “espanhóis” não existiam na altura, bem como o Afonso Henriques só com muito boa vontade os teria vencido em Aljubarrota. Foi então que me mandaram estudar manuais de investigação científica e não lhe ir dar aulas de História no mural. Concordei. Os factos só atrapalham e são claramente desajustados perante convicções alicerçadas em muita ignorância. Há realmente momentos em que “debater”, esgrimindo “conhecimentos” (ainda para mais dos “empilháveis”) é um exercício mais espúrio do que apanhar alfinetes numa meda de feno com as duas mãos numa luva de boxe.

rafa matarruano

Post Reaccionário

No sentido de ser uma reacção à existência de duas greves a decorrer (uma desde dia 29 e outra hoje que parece feita à medida de entrar na contabilização das greves contra a geringonça promovidas por parte da dita) e a visibilidade do seu impacto ser nula. Por ser o dito impacto quase nulo ou por algo que me está a escapar?

matarruano