O Atraso

No Expresso escreve-se de novo sobre o atraso no tal decreto-lei sobre a recuperação do tempo de serviço docente que, por um estratagema curioso, foi a apreciar aos Açores  e à Madeira quando a própria RAM já legislou na matéria e assim só depois de dia 21 é que poderá estar despachado para ir para Belém. Ou mais tarde. Posso estar a perceber mal as coisas (não seria a primeira ou última vez), mas a mim parece que, aprovado o OE 2019, será alegado que nada poderá ser aprovado que o contrarie e muito menos “aumente despesa”. Pelo que ou a coisa fica prevista no OE (o que duvido, em especial depois da “habilidade” feita o ano passado) ou teria de ser legislada antes. Como ninguém se chega à frente com proposta própria fora do OE e a ILC está a ser devidamente burocratizada… quer-me parecer que… o atraso é mesmo voluntário.

spin

Pontos de Pressão

Tenho observado com alguma curiosidade a questão das touradas e as paixões que mobiliza. Cresci num concelho com fortíssimas tradições taurinas (Moita, dita “do Ribatejo” com rotunda com boi de ferro numa das entradas), que não partilho. Fui a umas duas touradas na vida, todas pela infância e julgo que uma delas de tipo cómico, com troupe de anões, na praça de touros Daniel do Nascimento. Largadas nas ruas da Moita terei ido ver, assim um pouquito, uma ou duas, porque amigos iam. Largada na praia, fui a uma, no Rosário, e achei-lhe graça, mas não voltei. Não sou vagamente aficionado, mas não sou fanático anti-touradas. Na televisão, via só as pegas e só me interessava mesmo por aquelas em que iam forcados pelos ares, porque eles estavam ali voluntariamente e os bois nem por isso. O mesmo se aplicava, enquanto morei em Alhos Vedros, à minha reacção perante o som das ambulâncias a caminho do hospital do Barreiro, na sequência das colhidas nas largadas das tardes ou noites de fim de semana.

O que significa que acho que os aficionados têm direito às suas festividades e tradições, embora ache muito relativa a sua “coragem”, atendendo à diferença de poderes em confronto com os animais que obrigam a estar ali e poderiam estar a pastar calmamente num prado. Mas não alinho com as elites engomadas das cidades que gritam “barbárie” perante as touradas, em especial malta que pactua com práticas como as que vimos descritas numa organização próxima do PAN. Assim como acho que as fotos de um deputado em calções de praia num sessão de biodanza são mais atentatórias do bom gosto do que o aparato inicial de uma “corrida à antiga portuguesa”.

E percebo que há causas e causas. Como o futebol, fátima e as touradas despertam entusiasmos desproporcionados. O grupo parlamentar do PS só se revoltou contra o grande líder da geringonça por causa do IVA das touradas, sendo um rebanho ordenado quando se trata de questões relacionadas com a Saúde. Justiça ou Educação. O inefável Luís Capucha, um dos braços direitos de MLRodrigues, conseguiu em recente artigo no Público, crítico de outro de António Costa sobre o assunto,  mais de 1500 partilhas em redes sociais em pouco mais de um dia, ou seja, mais do que todos os restantes artigos de opinião juntos, publicados nesse período. Ou mesmo mais do que qualquer outro artigo que tivesse publicado nos tempos em que era um dos pilares do poder no ME.

As causas mais emocionais, aquelas que despertam mais paixões e conseguem um impacto mais eficaz junto do Poder, nem sempre são as que quem pensa muito sobre os fenómenos sociais ou políticos consideram as mais nobres, “civilizadas” ou esclarecidas.

O IVA das touradas não desequilibra as contas do OE? Claro que não, como também não será por causa dele que os aficionados deixarão de ir assistir a elas.

A bem dizer… o que está em causa é uma questão de “princípio”, em que um grupo de cidadãos (de forma correcta ou não) se sente discriminado pelo legislador. E reage. E consegue aliados. E, quiçá, resultados inesperados. Parecendo que não, é a “cidadania” a funcionar. Com eficácia.

Melhor toureiro do mundo

(é muito possível que os professores só tivessem, perversamente, a ganhar se apresentassem as suas queixas como as de alguém que está no meio de uma tourada – em alguns momentos no sentido literal – e a quem não querem pagar a remuneração previamente acordada no contrato…)