Contra As Minhas Próprias Expectativas, Vi O Debate E Rui Rio Foi “Apenas Bom”

Vamos lá a um relato sumário do encontro disputado perante três árbitros nem sempre muito esclarecidos, sendo que Clara de Sousa até foi a que fez intervenções mais objectivas para além de ter os óculos mais giraços da sessão.

Início: conversa inconclusiva sobre salário e impostos.

20.39: Rio 1, Costa, 0 – quando aquele refere que, embora subindo em termos de desempenho económico acima da média europeia Portugal perde na comparação com os países com que concorre de forma mais directa. Golo confirmado com a questão da manutenção de uma emigração em níveis muito elevados. Costa destaca que também entraram emigrantes, mas acredito que é diferente virem nepaleses apanharem morangos ou mirtilos e saírem enfermeiros para Inglaterra.

20.44: Costa empata 1-1 com auto-golo de Rio acerca do aeroporto do Montijo, que Costa sublinha ter sido decisão do governo de Passos, subindo o resultado para 2-1 (20.45) a seu favor por manifesta inépcia do adversário.

20.46: período anómalo de risota comum entre as duas equipas acerca de qualquer coisa.

20.49 – Rui Rui chega ao 2-2 graças à demonstração de que os impostos indirectos cobrem a descida do IRS.

20.51: Rui Rio faz um 3-2 com remate em jeito acerca do maior investimento público durante o período dos cortes da troika do que durante o período do actual governo.

Segue-se um período de entediante anti-jogo durante o qual António Costa parece julgar que lhe basta defender o resultado e marcar golos fora.

21.04: António Costa desperta e ataca com barragem de números (reais, truncados? a verdade é que Rio não os desmente) sobre o SNS (3-3).

21.06: Rio reage com a denúncia das cativações e volta à frente do marcador por 4-3.

Segue-se jogo a meio campo em que Rio explica que só lhe interessa que o serviço seja melhor prestado, mas Costa reage com nova barragem com indicadores do SNS, embora utilize o termo “produção” para se referir a cuidados de saúde, desperdiçando a possibilidade que estava ao seu dispor .

21.17: Tema dos professores, no qual eu começo a perder objectividade, em especial quando Costa tenta fazer passar aquela treta da equivalência do tempo de serviço recuperado entre carreiras. Não valido auto-golo de Costa, por me sentir parcial.

21.19: 5-3 para Rio com aquela do governo ter tratado de forma diferenciada os juízes em relação a outras carreiras.

21.22 Costa faz um ataque interessante acerca do tempo de efectivação dos professores, mas ignora as próprias responsabilidades do PS na matéria. Consegue marcar em esforço ao prometer condições especiais para os professores em monodocência (5-4).

21.27: Rio puxa dos galões do início de carreira política/jurídica e denuncia os julgamentos mediáticos, mas é Costa que acaba por fazer auto-golo ao admitir uma quase inevitabilidade do conluio entre poder judicial e poder mediático (6-4).

21.30: Em súbita arrancada pela esquerda, Rio ataca o capitalismo, os monopólios e a falta de regulação do mercado, elevando o resultado para um inesperado 7-4.

Segue-se um período sobre as questões climáticas em que todos concordam e não passam de meio campo.

21.38: 7-5, golo de Costa quando se fala dos pactos que Rio assinou sobre fundos europeus e descentralização. 7-6 logo a seguir (21.40) quando Costa recorda desejos descentralizadores de Rio enquanto autarca, apenas concretizados com Rui Moreira.

Estranhamente o debate termina com a questão que José Alberto Carvalho considera como “impactante” da possível reintrodução do serviço militar obrigatório e fica-se com a sensação de que algo faltou algo, como seja uma visão global divergente sobre o futuro do país.

Mas, um Rio “apenas bom” ganhou (7-6) a um Costa que, com um ar ocasionalmente zombeteiro, acha suficiente perder por poucos, atendendo à vantagem que sente ter no campeonato.

tv_burro

 

O Debate Dos Debates?

Depois de um número que desconheço de debates sem qualquer interesse ou chama entre líderes políticos a jogar à defesa, estratégia do quadrado reforçado para não perder votos, sem qualquer ideia verdadeiramente mobilizadora, eis que nos anunciam “O Debate” entre os dois representantes de Portugal que Balsemão levou há uns anos a conviver com as figuras mundiais do Clube Bildeberg (sobre o qual não tenho uma visão especialmente tenebrosa, em especial depois de ter lido o que Jon Ronson escreveu sobre o encontro deles em Lisboa/Sintra).

Um debate entre António Costa e Rui Rio é mais soporífero do que a 214891ª edição da Quadratura/Circulatura do Triângulo Isósceles e menos variado do que as tiradas dos Dupondt. Porque eles, no essencial, concordam, pois Costa embolsou a esquerda “radical” durante quatro anos em que todos baliram à moda do Centeno, uma espécie de Vítor Gaspar grisalho e de uma Maria Luís Albuquerque gaguejante. Duvido que Rui Riuo se sentisse desconfortável como vice de um governo com a maioria dos actuais ministros e secretários, pois até o galamba se rendeu às rendas. Talvez mudasse o Cabrita por um autarca do PSD e na Educação há sempre ali o Justino à espreita. Quanto muito alargaria o leque de famílias a ser nomeadas, pois há uns quantos laranjinhas a precisar de lugar executivo no currículo para poderem “dar o salto” para uma qualquer empresa privada em regime de liberalismo monopolista ou de oligopólio firmemente cartelizado.

Para que o raio do debate tivesse interesse, mais do que transmitido por três canais ou retransmitido nas homílias dominicais, seria preciso que Rui Rio, em vez de se achar muito bom, fosse mesmo apenas bom. Porque “apenas bom” dá para meter as vacuidades retóricas de António Costa no bolso, mas eu sou dos que sempre acharam que ele não consegue dizer duas frases sem assassinar a concordância e enterrar qualquer ideia original. Era preciso que Rui Rio percebesse que o país não vive na sua cabeça e que nem todos conseguimos perceber a sua genialidade. Não basta que ele enuncie virtuosas qualidades, mas que as possamos observar, não apenas nele mas na sua titubeante “equipa”.

Era preciso que Rui Rio fosse mais do que se limitou a ser, um líder transitório, útil para negociar subsídios europeus sem azedume e, no limite, servir de bengala a um eventual Bloco Central se o PAN desinchar.

Seria preciso que ele fosse “apenas bom”.

RioCosta

 

Lei Nº 116/2019

A que, com origem no Parlamento, revê o DL 54 em alguns aspectos relevantes (poucos) e em outros de detalhe de olho clínico. Publicada na 6ª feira, já com o ano letivo em arranque e muitos dos documentos elaborados após decisões tomadas com base na orgânica e parâmetros agora revistos.

O costume.

O meu artigo favorito é o 33º, que passo a transcrever, destacando as partes que me despertam maior curiosidade (que são quase todas:

Artigo 33.º

Acompanhamento, monitorização e avaliação

1 – O acompanhamento da aplicação do presente decreto-lei é assegurado a nível nacional por uma equipa, que integra elementos dos serviços com atribuições nesta matéria, a designar pelos respetivos membros do Governo, podendo ainda integrar representantes dos Governos das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.

2 – As escolas devem incluir nos seus relatórios de autoavaliação as conclusões da monitorização da implementação das medidas curriculares, dos recursos e estruturas de suporte à educação inclusiva.

3 – Sem prejuízo das competências gerais previstas na lei e no respeito pela autonomia de cada escola, cabe à Inspeção-Geral da Educação e Ciência acompanhar e avaliar especificamente as práticas inclusivas de cada escola, designadamente a monitorização e verificação da regularidade na constituição de turmas e na adequação do número de alunos às necessidades reais, bem como no modo como a escola se organiza e gere o currículo, com vista a fomentar a eficácia das medidas de suporte à aprendizagem, garantindo uma educação inclusiva para todos.

4 – Cabe igualmente à Inspeção-Geral da Educação e Ciência avaliar as condições físicas e todos os recursos de que as escolas dispõem para a aplicação deste decreto-lei, designadamente para dar cumprimento ao disposto nos artigos 9.º e 10.º

5 – A avaliação prevista no n.º 3 é objeto de um relatório de meta-análise a ser apresentado anualmente ao membro do Governo responsável pela área da educação.

6 – A cada cinco anos, o membro do Governo da área da educação promove uma avaliação da aplicação do presente decreto-lei com vista à melhoria contínua da educação inclusiva.

7 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, o Ministério da Educação promove a avaliação da implementação do presente decreto-lei no prazo de dois anos após a sua entrada em vigor, tornando públicos os seus resultados.

8 – O Governo publica, no prazo de 90 dias, uma portaria que defina, ainda que de forma não exaustiva, os indicadores estatísticos que servem de base à caracterização e avaliação das medidas e resultados da política de inclusão na educação.

Ora vamos lá descascar isto:

  1. Quais são exactamente os serviços “com atribuições nesta matéria”? Inclui serviços das Finanças para inspeccionarem os encargos» No espírito da “descentralização das competências” inclui gente da Administração Local? Ou fica tudo ao arbítrio dos “respectivos membros do Governo”?
  2. Ainda me estou a rir desta parte. As “conclusões” são obtidas com base em que parâmetros ou indicadores? Apenas os internos ou os tais a ser definidos centralmente?
  3. Ainda me lembro do SE Costa criticar a intromissão abusiva da IGEC em matérias relacionadas com a vida das escolas e a sua autonomia. Ao que parece isso só é válido para o que o desgosta, porque se for para impor as “suas” medidas, a IGEC já passa a “braço armado” do ME?
  4. De que “condições físicas” estamos a falar? Podemos começar pelos elevadores que faltam na generalidade das escolas para os alunos com problemas de mobilidade? De salas com equipamentos específicos para lidar, de forma permanente e não apenas “ao desenrasca” com esses mesmos problemas?
  5. Onde está o relatório da “meta-análise” para 2018-19?
  6. De cinco em cinco anos é avaliada a legislação para a melhorar, mas já foi melhorada ao fim de apenas um ano?
  7. O “presente decreto-lei” passou a ser uma “lei”. Os dois anos contam a partir de Julho de 2018 ou de Setembro de 2019?
  8. Sendo “de forma não exaustiva” a sua publicação, quais os critérios para a selecção dos indicadores tidos como relevantes? A opinião da tal equipa do nº 1, de um grupo de especialistas escolhidos a dedo ou apenas indicadores de “sucesso”?

Lamento, mas isto constitui um remendo que acorre a dois ou três fogos, mas deixa todo o resto em lume brando, pois em nada aligeira os pesados procedimentos que tornaram a aplicação do 54 um processo de muitos meses e dependente mais do que informalmente se foi decidindo e fazendo do que da literal aplicação de um normativo que vê parte das suas vantagens ser soterrada pela burocracia que desperta nos mais rigorosos seguidores da papelice com assento nas equipas multidisciplinares e que demoram mais tempo a produzir impressos para registar “evidências” do que a atengtar aos alunos.

Penso que, contudo, a revisão do DL não lhe retirou a seguinte passagem da antológica nota preambular.

Inclusão9