Primeira parte da análise enviada para a peça da Sábado de hoje. Dificilmente seria exaustivo, se a ideia era seleccionar apenas alguns pontos dos cinco partidos com maior representação parlamentar. E tem nota prévia com declaração de interesses.
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Nota prévia: o que em seguida escrevo parte de uma posição pessoal clara de oposição a boa parte das políticas desenvolvidas nos últimos anos na Educação, muito para além das questões laborais relativas aos docentes. Não é, pois, uma posição “descomprometida”, mas que tenta ser o mais objectiva possível dentro dos limites da minha discordância em relação à “municipalização” da educação ou ao modelo de gestão escolar unipessoal.
PS: quanto à Educação, é um programa de continuidade em que esta área de governação nem merece um capítulo autónomo, surgindo (pp. 101-104) integrado numa espécie de “políticas-ferramenta” do combate às desigualdades. A Educação deixou de ser uma prioridade por si só, para ser apenas um instrumento ao serviço de outras políticas.
No caso do Ensino Básico e Secundário o pior, em meu entender, é mesmo esta sensação de que se pretende apenas continuar o que se acha ter sido bem feito, mas que está claramente por demonstrar. Assim como a ausência de qualquer referência a uma alteração do modelo único de gestão escolar, do qual foram retirados praticamente todos os procedimentos vagamente democráticos. Quando se assume um objectivo a partir de cima de “não retenção” afirmando-se que isso será feito “trabalhando de forma intensiva e diferenciada com os alunos que revelam mais dificuldades” e conhecendo-se a prática governantiva do PS na pasta da Educação percebe-se que se tratará mais de uma imposição legislativa do que daquilo que está a ser afirmado. É ainda muito duvidoso o objectivo de “definir uma estratégia integrada de ação sobre a aprendizagem da matemática, uma vez que se trata da disciplina com mais insucesso” quando a pasta da Educação esteve em governos do PS desde 2005 durante cerca de 11 anos. Não se percebe o que significa, para além de um novo “emagrecimento curricular”.
Pela positiva, se for para levar a sério, pois pouco ou nada foi feito pelo PS nesta matéria no último mandato, destacaria dois pontos (p. 101):
- “Implementar um sistema de deteção precoce, ao longo da educação pré-escolar, de problemas de desenvolvimento da linguagem e da numeracia, acompanhado de um programa universal de estimulação da competência linguística;”
- “Promover programas de enriquecimento e diversificação curricular nas escolas públicas, nomeadamente assentes na formação artística, na introdução de diferentes línguas estrangeiras e de elementos como o ensino da programação, permitindo que as escolas especializem a sua oferta educativa (à semelhança do que fazem muitos colégios privados);”
Em relação ao Ensino Superior não encontro qualquer medida verdadeiramente identitária, para além da extensão da lógica de garantir o máximo de sucesso a todos, sem que se perceba se a aposta é apenas na quantidade do sucesso e não na sua qualidade.
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PSD: o programa do PSD deixa de fora a Educação das suas “cinco reformas inadiáveis”, pois o que surge no subcapítulo “mais e melhores oportunidades para os mais jovens” (p.39) não passa de uma subordinação das políticas da Educação e Formação aos interesses da Economia.
Quanto trata especificamente da Educação, o programa do PSD parece apenas distinguir-se do do PS pelo modo como pretende alcançar as mesmas metas, seja no plano da gestão escolar, seja no da continuação do esvaziamento de competências das organizações escolares.
A defesa (p. 71) da “instituição de três Academias (Norte, Centro e Sul) orientadas em exclusivo para a formação de futuros diretores, subdiretores, adjuntos e coordenadores de estabelecimento, de agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas, através de programas certificados de estudos pós-graduados” limita-se a levar mais além aquilo que desde 2008 é o modelo criado pelo PS, sem qualquer abertura para um modelo de gestão mais flexível. Por outro lado, é paradoxal afirmar-se que o “reforço de competências na gestão das escolas deve ser articulado com o processo de descentralização para as autarquias” porque estes são dois processos divergentes e contraditórios. Não é possível defender aquele reforço, quando se concorda com a transferência de competências para as autarquias.
Pela positiva, assinalo a preocupação em manter um sistema de avaliação externa das aprendizagens (p. 72) que abandone a ficção em que se tornou a implementação das provas de aferição no modelo em funcionamento, em particular as do 2º ano. Acho positivo que se reintroduzam provas finais, pelo menos, no 2º ciclo.
Quanto aos aspectos relacionados com a classe docente, acho negativo que a proposta de revisão do modelo de avaliação do desempenho docente (p. 73) reforce a componente burocrática (portfolio) e não a da prática pedagógica em sala de aula, assim como acho que avaliação final não deve ser por “um júri maioritariamente externo à escola a cujo quadro o professor está vinculado”. A questão da recuperação do tempo docente é apresentada de uma forma que quase a inviabiliza, concordando claramente apenas com o fim da penalização das aposentações a partir dos 63 anos.
Chamem o sr. Dr. Centeno que ele é que sabe fazer omeletes sem ovos.
No final acrescente-se uma pitada de ervas aromáticas muito séc XXI e coma-se.
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A ” Nota prévia ” ficou extraordinária.
Coloca logo os pontos nos iiis.
Julgo que traduz mesmo , o que todos nós pensamos destes devaneios educativos .
Muito bem ,Paulo !
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É triste este deserto que atravessamos. Se nós vivemos mergulhados na realidade das escolas, porque não se faz um verdadeiro debate sobre o que se deve fazer a seguir. Educar não é politizar. Enfim…
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Educar é um acto político.
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