A Lei Ainda Funciona? Ou Roma Cansa-se, A Dada Altura, De Tanto Proselitismo?

Director de escola de referência pede reforma “magoado” com o ministério

Uma greve de professores, marcada para um dia de exames nacionais, valeu-lhe um processo disciplinar por ter excedido os serviços mínimos que tinham sido decretados. “Os alunos tinham de ter garantidas todas as condições para poderem realizar os exames”, diz Manuel Esperança, director do Agrupamento de Escolas de Benfica. Foi dado com culpado.

Bigorna

(Esperança, pá, garanto que merecerias alguma compreensão se, em vez de te aposentares, fosses dar aulas nesse último ano de carreira…)

Tenho Um Sério Problema De Classe

Já me disseram isso. Deve ser porque, por ter origem no bom e velho proletariado aqui da margem sul, me irritam aqueles que gostam de fazer a associação linear entre pobreza, insucesso escolar, ignorância, incapacidade para distinguir o verdadeiro do falso e permeabilidade aos “populismos”. Deve ser por isso que me irritam os engomadinhos do sistema. Porque sinto que, com base numas análises estatísticas muito “humanistas”, explicam o maior insucesso escolar junto das classes socialmente desfavorecidas com essa condição e daí partem para a sua imbecilidade política. Sim, pode acontecer, mas acreditem que encontrei mais idiotas e aldrabões em gente com pergaminhos do que nas chamadas “classes perigosas”. Vejam este caso de tipo instruído, mas que deixa muito a desejar em termos de “radicalismo”.

Se a falta de cultura potencia a adesão a propostas simplistas? Sim e isso fica demonstrado pelo modo como o PS reduz qualquer questão complexa a slogans demagógicos (“quem é a favor do combate às alterações climáticas é contra a descida do IVA da electricidade”, quando na factura nós já pagamos uma boa contribuição para as energias renováveis e muita da electricidade consta já ser produzida por essa via), em especial na Educação em que o maniqueísmo é a regra dos “utopistas” de tertúlia académica e dos herdeiros vitalícios do “espírito de 68” que os levou a cadeirões nos círculos do poder que nunca largam de forma voluntária.

Aliás, as contas são simples… se temos uma massa de pessoas que vive abaixo do limiar da pobreza ainda superior aos 20% e se as taxas de insucesso foram durante tanto tempo tão elevadas, é paradoxal que certos “populismos” só cheguem ao Parlamento exactamente quando temos a votar a “geração mais qualificada de sempre”, como o actual primeiro-ministro gosta de afirmar em ocasiões solenes de agit-prop institucional.

Assim como é paradoxal que quem promove medidas mal disfarçadas de esvaziamento dos currículos depois ache que o risco esteja na “ignorância”. Dizem, em coro, que o contrário de chumbar é aprender, mas aprender o quê? História aos Semestres? Ciência do Quotidiano? Matemática dos Trocos? Inglês Camarinho para servir Turistas? Geografia de Proximidade?

Não será isso que levará a que acreditemos em “fontes obscuras de informação” ou declarações absolutamente patuscas como as de certos preclaros senadores do regime?

Mas volto ao início… o problema deve ser meu, de um qualquer complexo de classe por ter lido cedo autores “radicais” como Gorki, Steinbeck, Redol, Soeiro Pereira Gomes, Sartre, Ferreira de Castro, porque os ignorantes com a 4ª classe que me fizeram nascer e me criaram gostavam de ler e deixar ler em vez de acreditarem em determinismos da sociologia para totós de certos governantes.

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O Cúmulo Da Demagogia

Em prosa no JL/Educação de hoje, o SE Costa dá liberdade à sua faceta de demagogo, mesmo que com teses que parecem sedutoras e lógicas, Só que apelando ao senso comum mais simplório e sem qualquer fundamento sociológico ou histórico. Ou seja, que quem chumba são os pobrezinhos e que os pobrezinhos se chumbarem ficam ignorantes e se ficarem ignorantes vão alimentar os “radicalismos” e os “populismos”.

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Isto é tão errado a tantos níveis. Vou isolar apenas um punhado de argumentos acerca da falsidade deste raciocínio maniqueísta.

  1. Os pobrezinhos não são necessariamente ignorantes ou vítimas do insucesso. E se o são, nada como combaterem a pobreza a sério, em vez de o fingirem, especialidade maior deste governo que, nos momentos da verdade acha que mais 10-20 euros no rendimento mínimo podem comparar-se a mais 100-200 milhões para início de conversa num desfalque bancário.
  2. As manipulações de informação nem sempre têm “fontes obscuras”. Por vezes têm fonte oficial ou derivada. Veja-se a questão dos professores pretenderem “retroactivos” e a recuperação do seu tempo de serviço implicar uma “despesa” que se revelou falsa (até com demonstração pela UTAO), “notícias” colocadas em circulação por fontes “próximas” do ministério das Finanças, com a colaboração de articulistas doutorados e o silêncio sepulcral do SE Costa.
  3. Os “radicalismos” e “populismos” não são necessariamente alimentados pela ignorância mas pelo preconceito e esse encontra-se em todos os estratos sociais. Os neonazis que, ao que parece, andam pelo comícios ou encontros do Chega não têm apenas a 4ª classe ou chumbaram 3 vezes no Básico. Para além disso, há “populismos” altamente elitistas, como se pode comprovar por alguns dos seus líderes actuais. O Trump pode ser ignorante mas não chumbou na escola. O Boris Johnson tem uma educação acima de qualquer suspeita. E os que votam neles são todos os “descamisados” e enjeitados do sistema? Pelo contrário, nos EUA, o Trump desenvolve políticas baseadas no preconceito contra esses mesmos enjeitados, nomeadamente minorias étnicas.
  4. Historicamente, as derivas totalitárias não assentaram em movimentos de base popular e “ignorante”, mas exactamente no seu contrário, em elites e “vanguardas” que apresentaram o caminho “certo”. O “Mein Kampf” não foi lido por analfabetos. O Salazar chegou ao poder ao colo de militares, grandes burgueses e académicos cheios de leituras. Eu sei que a História é chata e “enciclopédica” para alguns, mas a sua ignorância ou desprezo, em especial por pessoas doutas, é triste.
  5. Há “radicalismos” e “populismos” de Direita e Esquerda. E todos eles manipulam a informação, da palavra à imagem. E há outros que até podemos considerar benignos, mas que continuam a vir dos dois extremos do “espectro político”. Será que o SE Costa está a falar de todos ou só dos que acha pessoalmente daninhos?