O Texto Para O JL/Educação Deste Mês

Como encontrar a edição em papel deve ser muito difícil por estes dias (eu não consegui, tive de pedir o pdf ao JCVasconcelos) e não será por publicar o meu texto que as vendas serão afectadas, deixo em seguida o texto que está meio perdido por entre prosas de enorme entusiasmo com isto tudo, a começar por um do SE Costa que merecia ser “descascado” à boa maneira de antigamente, não tivesse eu mais do que fazer.

O texto foi entregue com uma semana de antecedência, portanto remete para o contexto de início da passada semana. Agora, naturalmente, já escreveria algo mais, retirando o primeiro parágrafo, por exemplo. É longo, eu sei, muito século XX, ou mesmo XIX. Mas nem é o maior que lá está… nem o mais “mobilizador”…

Que Ensino à Distância?

Nos últimos meses, decidi fazer alguns MOOC (Massive Open Online Courses) para experimentar o modelo de formação à distância, tanto por falta de tempo para sessões presenciais, como por assim ser possível aceder a uma oferta mais variada e interessante (em especial no plano internacional em que há imensas possibilidades). Esta experiência como utilizador, aliada a anos de trabalho com os alunos em suportes digitais em combinação com os meios tradicionais, tem-me sido útil para encarar com prudência algumas propostas feitas para o recurso a ferramentas de ensino à distância (e-learning) no contexto de emergência educativa que vivemos na sequência da expansão da covid-19 e da necessidade de suspender as actividades lectivas nas escolas.

Comecemos por fazer um resumo muito breve da situação: perante os riscos de contágio pelo vírus SARS-CoV-2 e depois de algumas hesitações, o governo decidiu encerrar as “actividades lectivas presenciais” a partir de 16 de Março, ficando sem se perceber muito bem se isso significava uma espécie de antecipação da pausa da Páscoa, se pretendia que continuassem a ser desenvolvido outro tipo de actividades “não-presenciais”. Foi nesse contexto que surgiu a indicação para que os professores desenvolvam modalidades de “ensino à distância”, que permitam manter o contacto com os alunos e que estes continuem a ter uma ligação à escola e a desenvolver as aprendizagens possíveis num contexto inédito.

As ferramentas disponíveis para esse ensino à distância são diversas, desde as que são passíveis de utilização em sala de aula, como as plataformas digitais dos grandes grupos editoriais (Escola Virtual, Aula Digital) com conteúdos que apoiam o trabalho com o manual, passando pelas que permitem uma espécie de verificação das aprendizagens em tempo quase real (ClassMarker, Kahoot, Padlet, Quizizz, Quizalize) até às que permitem criar um ambiente de sala de aula digital, com disponibilização de materiais, questionários, fóruns de debate e uma série de outras funcionalidades (Google Classroom, Microsoft Teams) que vão mais longe do que a transmissão de aulas por Skype, a partilha ou arquivo de materiais nos já muito comuns blogues de professores e turmas ou em grupos criados para comunicação em redes sociais (Facebook, WhatsApp). E isto é apenas uma escassa amostra de tudo o que está disponível para a constituição de comunidades educativas virtuais que dispensem actividades presenciais.

É um mundo quase novo, com muitas potencialidades, admirável em muitos aspectos e que se tem apresentado como uma faceta essencial da chamada “Educação para o século XXI”. Que permite transformar tanto as aulas convencionais, enriquecendo os recursos dos professores, como desenvolver uma espécie de prolongamentos virtuais quando existem situações excepcionais (alunos com doenças ou contextos familiares que implicam a sua ausência prologada da escola) como a que agora se vive.

Grande parte dos professores conhece estas ferramentas, embora seja arriscado afirmar que a maioria as domina, pois muitas são recentes, estão em constante evolução e, nos últimos anos, não foi feito um investimento importante na formação contínua nesta área, em virtude de outras prioridades. O parque informático das próprias escolas envelheceu, as condições de funcionamento das redes foram ficando cada vez mais desajustadas das novas exigências e, por isso mesmo, a exploração mais regular destes recursos foi-se tornando mais limitada.

Mas o que agora temos perante nós é o “desafio” de, em poucas semanas e porque parece óbvio que o ano lectivo “presencial” chegou ao fim, erguer uma rede nacional de ensino à distância ou, pelo menos, de redes locais que permitam a professores e alunos desenvolver actividades que transmitam um vago simulacro de “normalidade” ao 3º período.

Existindo, por certo, quem vá desenvolver o tema na perspectiva de tudo o que pode ser feito pelos professores e do trabalho que um grupo de especialistas ligado ao Ministério da Educação tem estado a desenvolver no âmbito da Direcção-Geral da Educação, talvez seja necessário que alguém apresente o que se pode considerar o reverso da medalha, ou seja, as dificuldades e obstáculos a ultrapassar para que se vá além da aparência de tudo ser possível e de ninguém estar de “férias” antecipadas.

E há obstáculos reais que não podem ser desprezados como se fossem “residuais” ou como se quem os apresenta esteja apenas interessado em criar “problemas” e a não contribuir para as “soluções”. Pelo contrário, sem que se destaque o que pode correr mal é que se corre o risco de termos, como nem é novo entre nós, soluções truncadas ou em permanente versão beta. Ou, o que é pior, soluções que não tenham em consideração a realidade concreta em que vivem muitos alunos fora dos portões das escolas. A DGE esteve bem ao alertar para o “enorme cuidado para que todos os alunos, independentemente dos dispositivos que utilizem e do software instalado, tenham acesso aos recursos disponibilizados pela escola. Deverá ser utilizado software de livre acesso e não muito exigente do ponto de vista tecnológico ou de largura de banda”.

Mas é muito importante que se perceba que existe em Portugal um digital gap (ou digital divide) bastante acentuado e que, mesmo reduzindo o nível de exigências técnicas, de acordo com os dados da Pordata para 2019, existem 22% de agregados familiares sem banda larga, oscilando entre os 14% na Área Metropolitana de Lisboa e mais de 28% no Alentejo. E que quando apertamos a malha de análise, as disparidades ainda são maiores. Num estudo da Deco sobre a velocidade média permitida pelas diferentes operadoras (divulgado na edição de 29 de Outubro de 2019 do Correio da Manhã, pp. 24-25) verificam-se diferenças enormes, com a velocidade de download (no caso da Meo) a ser quase 30 vezes superior em Braga (58,2 Mb) do que Barcelos (2,4Mb), a 22 km de distância. E os exemplos poderiam repetir-se pelo país e com outras operadores. Como seria de esperar, são as zonas do interior a ter os piores serviços de acordo com a Deco, com destaque negativo para Celorico de Basto, Crato, Lousão, Montemor-o-Novo, Penacova e Valpaços.

Estas assimetrias não são exclusivas de Portugal, pois nos EUA, de acordo com um estudo do Pew Research Center, cerca de 15% dos agregados com crianças em idade escolar não têm ligação de banda larga, valor que sobe para os 35% nos grupos mais desfavorecidos do ponto de vista económico e em algumas comunidades étnicas minoritárias[i], dando origem a um homework gap.

Para além disso, há que considerar ainda outro factor relacionado com o tipo de competências digitais que a generalidade dos alunos tem, sendo um equívoco comum confundir-se o tempo que passam agarrados aos seus gadgets ou a fazer publicações em redes sociais e um efectivo domínio de capacidades que lhes permitam navegar em outro tipo de ambientes. Em muitos casos, os alunos acedem à net nas escolas, beneficiando das redes abertas disponíveis, e recorrem a jogos que descarregaram, não necessitando de estar sempre online. A proliferação de perfis em redes sociais e de publicações que aparentam o recurso a ferramentas de tratamento de imagem ou vídeo não deve confundir-se com competências de pesquisa, selecção e tratamento crítico da informação. Se com os mais novos até a inserção de um nome de utilizador ou palavra-passe fornecida pela escola (que contenha caracteres especiais como o underscore ou exija o recurso à tecla AltGr) para aceder ao perfil individual nos computadores escolares pode levar uma parte substancial de uma aula até toda a gente estar online, há alunos do Secundário para quem o mail já é algo do passado remoto e as etapas para a criação de uma conta numa plataforma desconhecida uma espécie de corrida com obstáculos. Embora os resultados dos alunos portugueses no International Computer and Information Literacy Study tenham sido globalmente acima da média, “o estudo mostra que dar aos estudantes e aos professores acesso a equipamentos tecnológicos não resulta automaticamente no desenvolvimento de aptidões de literacia digital sofisticada” [ii].

Tudo isto deve ser tido em consideração quando se prepara um 3º período em formato de e-learning. Vamos desenvolver actividades com reflexos na avaliação dos alunos quando a desigualdade de meios e de acesso aos meios digitais pode ser maior do que a que se verifica com os métodos convencionais? Ou vamos ser prudentes e usar este “desafio” com alguma ponderação e avançar com atenção aos tão propalados princípios da equidade, inclusão e justiça social?

[i] https://www.pewresearch.org/fact-tank/2020/03/16/as-schools-close-due-to-the-coronavirus-some-u-s-students-face-a-digital-homework-gap/ .

[ii] https://expresso.pt/sociedade/2019-11-05-Literacia-digital-dos-alunos-portugueses-e-boa-mas-o-que-aprendem-sozinhos-nao-chega .

PG JL25Mar20

 

Estaremos Então Todos Em Casa Com Professor@s E Encarregad@s De Educação A Partilhar Conselhos Sobre Decoração De Interiores

E os putos a fazerem provas de aferição… ou talvez não. E a preparar as provas finais… ou talvez não. Mas certamente estaremos a monitorizar o cumprimento dos cronogramas e dos indicadores e níveis de (auto-satisfação) que provocam orgasmos múltiplos aos tecno-excitados do ME.

Já sei… estão a tentar pressionar o máximo até serem mesmo obrigados a “mitigar” o desvario e reconhecerem o óbvio, justificando o atraso das decisões com a necessidade de não sei quê.

Coronavírus: pico do surto em Portugal “nunca será antes do mês de Maio”

CasteloCartas

Dia 9 – E Onde Ficam A “Equidade” E A “Justiça Social”?

Mesmo a propósito deste artigo que se baseia em estudos e não em voluntarismos a pensar nos ganhos políticos.

(…)

Imaginemos que conseguimos – por manifesta singularidade do génio da lusitana raça – colocar em funcionamento até meados de Abril uma rede de ensino à distância com recurso aos meios de educadores, professores e famílias dos alunos. Alguém acredita que essa solução não agravará a pré-existente desigualdade de oportunidades entre os alunos que a Escola Pública tenta combater todos os dias dos portões para dentro?

Alguém acredita que, mesmo que as operadoras de telecomunicações reduzam os tarifários e alarguem a banda em todo o país e que o ministério consiga parcerias favoráveis para distribuir equipamentos pelos grupos mais desfavorecidos, a situação será vagamente equitativa ou justa do ponto de vista social?

(continua)

diario

Um Plano Pouco Inclusivo E Socialmente Desatento

Ministério não acautela alunos sem internet no seu novo Plano de Ensino à Distância

Plano destinado ao 3.º período está já a ser enviado para as escolas. Não apontadas alternativas para os estudantes que não têm computador, nem acesso à internet em casa e cujo número, só no ensino básico, poderá chegar aos 50 mil, segundo alertam dois economistas.

profpardal

Também Lá Por Fora…

… são quase sempre os mais vulneráveis a serem os primeiros excluídos.

Students with disabilities deprived of crucial services because of coronavirus closures

 

She’s 10, Homeless and Eager to Learn. But She Has No Internet.

Thousands of students living in shelters and doubled up in overcrowded apartments have not received web-enabled devices for online learning.

 

‘We Can’t Afford To Have Him Left Behind’: Special Ed Students Struggle During School Shutdown

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Phosga-se! – Série “Pré-Escolar”

E agora o documento que me fez rir mais desde o início disto tudo… é um documento da DGE com um Exemplo de Planificação de Atividades para a Educação Pré-Escolar. Não me fez rir por existir, mas porque, em boa parte, assume que os pais das crianças são absolutamente ineptos com as mesmas em casa.

Repare-se no que é proposto nas “rotinas diárias”:

Solicitar a colaboração da criança para preparar as refeições, pôr e levantar a mesa, arrumar a loiça depois de lavada.

Fazer a cama; varrer o chão; limpar o pó, etc.

A hora das refeições e de ir deitar à noite devem ser estabelecidas e cumpridas o mais possível para estabilidade da criança.

Mas há mais, como a “hora do conto”:

Após o almoço, se a criança necessitar de dormir uma sesta, deve fazê-lo e a história pode ser contada antes de dormir.

Se a criança não tem necessidade de dormir a sesta, podem escolher um espaço cómodo, calmo e tranquilo da casa para a hora do conto.

A história pode ser lida ou contada pelo adulto, contada pela criança ou pelos dois.

Quando terminar de ler a história, converse com a criança sobre o que ouviu e observou, e deixe-a folhear o livro e recontar a história.

Deixar a criança folhear o livro e conversar com ela sobre o que viram.

Escolher diferentes livros, em suporte de papel ou digital com histórias, contos tradicionais, poesias, rimas, adivinhas, lengalengas, etc.

E ao fim do dia:

Diariamente, reserve um tempo para fazer a avaliação do que fizeram, do que a criança mais gostou, do que não gostou e o que gostaria de fazer.

Também é importante reservar diariamente um espaço para a criança fazer o que no momento lhe apetecer, sem qualquer plano.

Mas quase todo o documento é assim e, depois de muitos anos a queixar-me que as indicações para o resto da escolaridade tendiam para a infantilização dos alunos, percebo que os especialistas da DGE assumem que esse é o estado da própria parentalidade nacional.

Ok… não vou negar que realmente observo situações que o indiciam, mas não esperava que o ME demonstrasse de forma tão clara que acha que as famílias não sabem, pura e simplesmente, o que fazer com a petizada em casa.

Anexo: Planificacao_Educacao_Pre_Escolar (o original chegou em .doc, mas preferi publicá-lo assim).

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E No Meio Disto Tudo, Até Me Escapou A Abertura Do Concurso

Concurso Externo/Contratação Inicial e Reserva de Recrutamento

Aplicação eletrónica disponível entre o dia 26 de março e as 18:00 horas de 3 de abril de 2020 (hora de Portugal continental) para efetuar candidatura ao Concurso Externo/Contratação Inicial e Reserva de Recrutamento, destinados a Educadores de Infância e a Professores dos Ensinos Básico e Secundário.

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