Agora, No Público

O texto de há um par de dias, com ligeiros acertos, pronto para desagradar e gregos e persas. Mas fica desde já escrito, até para conhecimento presente e memória futura.

Cidadania e Desenvolvimento: uma polémica hipócrita

O que me incomoda mesmo é que as escolas tenham deixado de ser, nessa vivência quotidiana, espaços de Democracia e Tolerância e que acerca disso quase ninguém se indigne.

Quem Se Oferece Para “Ponto Focal”?

Todos estes documentos são feitos na perspectiva do que deve ser feito e baseiam-se no princípio de que as regras mais básicas (ou outras) serão cumpridas. Mas… e todas aquelas milhentas situações que eu sou capaz de imaginar e sobre as quais não vejo uma palavrinha ou frase nos Planos de Contingência?

#sócrioprobelmas

Pequeno Contributo Para Um Dicionário Terminológico Da Educação, Numa Perspectiva Histórico-Comparativa

  • Anos 60-90 do século XX: “Revisões”.
  • Anos 00 e 10 do século XXI: “Consolidação dos conteúdos/da matéria (do ano anterior)”.
  • 2020-21: Recuperação das aprendizagens não realizadas.

(a parte que ainda está por definir com clareza semântica acima de suspeita é como se “recupera” o que não foi realizado)

O Referencial Para As Escolas Da DGS

Chegou dia 4. Porque, embora os professores e pessoal não docente tenham voltado antes, parecem só estar em causa os alunos que, por outro lado, se diz serem os que têm menos riscos de contágio ou de ter sintomas graves. Gosto de, a 4 de Setembro, se recomendar um “planeamento meticuloso” e a “reorganização do espaço escolar”.

Testemunhos – Maria de Jesus Gaspar

Neste regresso à escola muitas são as incertezas e os desafios. Contudo, se algo seria necessário após um final de ano tão atípico e difícil, eram segurança e certezas. Mesmo que depois tudo tivesse que ser alterado após o começo…Mas pelo menos haveria a convicção que alguém pensou, planeou, e isso era reconfortante. Não é o caso.

Sou, como muitos de vós, pertencente a um grupo de risco. Logo, em maio, entreguei a declaração, de acordo com a lei, e não fiz atividades presenciais. A escola compreendeu isso. Todavia, neste momento, a mesma escola diz-me para entregar atestado médico. Contudo, (ainda) não estou doente. Aliás, considero grave que médicos alinhem nesta situação e que eles próprios, em defesa da própria classe, não venham ajudar a esclarecer esta situação, pois uma coisa é estar doente outra é ser portadora de um conjunto de patologias que, perante uma possível infecção por este vírus, terá consequências eventualmente mais graves para nós, grupo de risco, do que para a maioria dos restantes infectados. Saliento que não estou doente e não quero baixa médica. Quero regressar à escola, ao trabalho, mas com condições de segurança sanitária que me permitam, enquanto professora com fatores de risco acrescido, fazê-lo de forma segura. Hoje, num webinar dinamizado pela plataforma #somossolução o SE afirmou que a solução para o meu caso seria meter baixa. Reforço que não estou doente e que quero trabalhar. A afirmação e resposta do SE João Costa não são lei e poderão estar a incorrer, talvez, em muito desconhecimento … Não conhece os dados dos professores  com patologias de risco? Deveria, pois bastava ter pedido às escolas esse levantamento. Se assim fosse talvez as escolas e os seus diretores estivessem mais capacitados para organizarem as suas escolas e saberem que tarefas deveriam atribuir aos seus docentes.

No dia 4 estive presente numa reunião de departamento que decorreu com segurança para mim. Caso assim não fosse, ausentar-me-ía. Contudo, não tenho a certeza se  após a mesma, a sala foi sujeita a algum tipo de limpeza. Aliás, talvez fosse de afixar em cada sala um registo de cada higienização, pois desconfio que muito se anda a vender aos pais e à comunicação social como verdadeiro… Questão diferente será estar numa sala de aula com 28 alunos…  Sempre que vou ao Centro de Saúde fazer a consulta de anticoagulacão vejo respeito absoluto por todas as boas normas de segurança: distanciamento amplamente divulgado de 2 m, etiqueta respiratória, linhas/marcas de controlo de distanciamento nos guichês de atendimento, acrílicos de protecção e separação nos consultórios, máximo de 3 ou 4 pessoas nas salas de espera, separação nas cadeiras, respeitando o distanciamento, medição de febre e perguntas à entrada…. Não sou a mesma pessoa quando entro na escola? Na escola, segundo a DGS e o ME, 1m, se possível.

Não tenho direito à mesma segurança e consideração? É por isso que me bato, e assim continuarei,  para  garantir o direito e a segurança  a que tenho direito no regresso ao trabalho. Quero regressar à escola e poder exercer a minha tarefa enquanto professora e Diretora de Turma, mas não sinto que possa fazê-lo, pois tenho imensas incertezas e ainda ninguém me disse que posso trabalhar com os mínimos de segurança. E isso já devia ter sido acautelado, tanto para  alunos como para  professores ou assistentes operacionais.

À falta de melhor, e perante as muitas dúvidas que surgiram após um conjunto de perguntas feitas ao SE João Costa, em que este referiu que os professores na minha situação teriam de apresentar atestado médico, recordo que está em vigor um regime excecional de proteção dos trabalhadores imunodeprimidos e portadores de doença crónica, quando considerados de risco de acordo com as autoridades de saúde, e que permite, em determinadas circunstâncias, a justificação das faltas ao trabalho – cf. artigo 25.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, na sua redação atual. Foi este revogado? A situação que levou a esse decreto-lei desapareceu? Estou doente para meter atestado médico? Não. O meu portátil e o meu trabalho serviram para o ME durante o período de ensino remoto, mas agora sou empurrada para atestado médico? Não. Recuso-me.

Então, o que me garantem o Estado e o ME?

Aos que tenham o desejo incontrolável de crítica, respondo: não quero continuar em teletrabalho. Gosto do que faço e sinto falta dos meus alunos e da dinâmica da escola, da agitação, do convívio. Já que não há desdobramento de turmas, pelo menos que não me coloquem em duas escolas (Tem lógica? Com declaração entregue na escola antes das férias e mesmo depois de conversar com a diretora do AE,   alertando para o risco acrescido que para mim representava, mas também para os alunos, deslocar-me entre duas escolas?). Há bom senso neste tipo de decisões ou sequer conhecimento básico de qualquer tipo de orientação relativa a questões de saúde? Não creio.  Que me coloquem a dar apoios, tutorias, o que quiserem, mas que  arranjem uma solução que não seja  penalizadora e quase um castigo, pois não escolhi ser portadora de uma patologia de risco. Para os que me criticarem com o chavão “Bolas para os professores! Só contestam, só exigem!” respondo que não devo nada a ninguém, pois nunca o estado me deu nada, nem abono de família para o meu filho. Sempre paguei os meus impostos e fiz todos os meus descontos. Roubaram-me muitos anos de serviço e a possibilidade de atingir o topo da carreira. Quero trabalhar, mas com segurança!

M.ª Jesus Gaspar, professora

A Impossibilidade De Um Debate (A) Sério

A “polémica” em torno da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento alastra, mas não melhora. A razão para isso, para além do atraso com que se faz e da hipocrisia reinante (ao ponto de enviar uma versão do post do outro dia para o Público), começa a deslocar-se para duas situações expectáveis, mas que nada contribuem para qualquer esclarecimento da opinião pública.

  1. A questão passou a ser apresentada como um conflito de “Direita/Esquerda”, com este ou aquele trânsfuga. O pessoal de “Esquerda” considera que a disciplina é imprescindível ao currículo da petizada, porque divulga os “valores da Democracia” (menos a verdadeira tolerância, pelo que se vai entendendo) e quem está contra ela, está contra os valores da sociedade do século XXI; da referida Democracia e é uma espécie de cripto-fascista, um beato clerical digno da Idade Média e, no fundo, uma besta. Embora estas classificações se apliquem a alguns defensores da posição em causa, parece-me “ligeiramente” excessivo”. De forma simétrica, os críticos da disciplina, apresentam-ma como se os temas estivesse na origem do declínio da sociedade ocidental, da instituição familiar e do sagrado binómio biológico que permite a reprodução da espécie e as boas maneiras no leito, considerando que quem admite que se leccionem temas como a “identidade de género” ou a “sexualidade” são um grupo de homo-lesbo-pansexuais com tendências para a bestialidade e uns “radicais” que querem transformar transformar as criancinhas numa espécie de ratinhos de laboratório de experiências socio-sexuais que as tornarão todas homossexuais ou, pior, hetero tolerantes ao conceito de “espectro” na definição das identidades e  atitudes sexuais/de género. Como no outro caso, lá haverá gente assim (que a há), mas não me parece que isso se aplique à generalidade dos docentes da disciplina. Já agora, as linhas orientadoras para a Educação para a Cidadania, que contempla a generalidade dos temas que agora levantam celeuma, são de 2012, revistas em 2013. Que, por exemplo, Passos Coelho, não saiba que foram aprovadas no seu governo, é apenas um detalhe que não admira acontecer a quem parece ter levado o cérebro lavado em rotações máximas.
  2. O debate começa a ser monopolizado por pessoal que alia a ignorância à arrogância, mas depois larga “postas de pescada” (de um lado ou outro) como se fossem pérolas ao povo que não passam de falsidades ou verdades pela metade da metade. Um caso, que vi por manifesta inépcia quando me sentei hoje no sofá em busca do final da etapa do Tour na televisão, foi o de um dos especialistas instantâneos em tudo e ainda o seu contrário que têm assento n’O Eixo do Mal, o programa mais bronco entre os que se levam a sério na análise da actualidade. O protagonista em causa era o inefável Pedro Marques Lopes, uma espécie de gajo de direita com gostos de esquerda (como o Pedro Mexia, mas em péssimo), que começou por afirmar que se tinha ido informar sobre os conteúdos da disciplina (tadinho, só agora se lembrou disso?), que achou por bem enumerar. Claro que os enumerou de forma errada e incompleta (esqueceu-se, por exemplo, talvez de modo cirúrgico, da “Literacia Financeira” na sua listagem) e daí partiu para uma “análise” que envergonharia qualquer pessoa com um mínimo de pudor e forma de ganhar a vida que não competisse com a Clara Ferreira Alves na ignorância presumida. Mas há quem possa achar que aquilo é mesmo assim e que, como ele disse, a História está repleta de temas obrigatórios de que se pode discordar como (pasme-se!!!) a leitura dos Esteiros. Que ele disse, de forma irónica, que poderia levantar reservas porque é do tempo do neo-realismo e que pode cheirar a “comuna” e tal. E só foi interrompido em tamanho disparate, pela colega CFA, não para lhe dizer que estava errado e que os Esteiros não são de leitura obrigatório, nem em Português, mas apenas para dizer que a obra em causa até é das melhores da corrente neo-realista.

Antes que devolvesse ao exterior o peixinho grelhado do almoço, desliguei e procurei não fazer a promessa de ir de joelhos a Fátima até n’O Eixo do Mal se deixar de confundir “opinião” ou “bocas giras” com o mais absoluto disparate, servido a gosto de um elenco de ignorantes armados de uma quase infinita pesporrência, garantinda por avença balsemânica.

Assim, é impossível qualquer debate vagamente racional sobre um tema já se si complicado. Mas como é na televisão que apresentou uma montagem mal amanhada da 1ª página do New York Times como se fosse real, já não espanta.