Polícias E Professores

Sou um bom cliente de séries policiais (até vi alguns episódios do Duarte & Companhia) e é interessante a queixa recorrente, mesmo em ambiente ficcionados, sobre o tempo gasto em burocracias e relatórios, em vez de ser feito “trabalho policial a sério” (é capaz de se notar que estou já na temporada 5 do The Wire, com anos de atraso). Muita papelada, muito registo, muito arquivo morto e defunto. Muita necessidade de provas e evidências.

Faz-me lembrar o papel de professor e como “evoluiu” ao longo das décadas na forma de ocupação do tempo. Há quem – com a nossa velha “amiga” MLR à cabeça, mas muitos distintos colegas seus a querer ficar também com alguns dos louros – ache que foi um grande ganho os professores deixarem de ter “apenas” as 22 horas de aulas nos seus horários, para passarem a ter 25, 26, 27 (conforme os gostos) que devem estar na escola. Raramente dizem que, para os alunos, aquelas 22 eram bem mais empregues que agora 26, pois muitas delas são gastas a produzir, recolher, rever, verificar papelada em duplicado ou triplicado, que são uma enorme perda de tempo de trabalho de gente qualificada para um pouco mais do que verificar números de telefone, moradas ou mesmo mails.

Criam-se plataformas onde as informações dos alunos são colocadas, mas depois é necessário recolher tudo de novo em papel e colocar no dossier respectivo. E se muda o programa, lá se corre o risco de ter de verificar ou introduzir tudo de novo, porque a migração dos dados e coiso e tal. Estou devidamente informado que algumas das novidades são óptimas e que há sítios onde tudo (de)corre Às duas mil maravilhas. Acredito. Mas acreditem, também, que em muitos mais sítios tudo se tornou um emaranhado de procedimentos burocráticos que tira a paciência para o que importa.

A queixa não é nova. É reconhecido pelos decisores em tempos de discursos ou promessas que é necessário desburocratizar. Mais do que desmaterializar, seria mesmo importante alterar a lógica de procedimentos redundantes, repetitivos, desnecessários e que deveriam ser afastados das responsabilidades de quem quer ensinar e não andar a arquivar. Um director de turma, por exemplo, não pode passar a maior parte do tempo a fazer de amanuense. Todos os anos a repetir caminhos, com esta ou aquela alteração mínima ou média. A ter uma nova camada de registos a acrescentar aos processos dos alunos e aos seus próprios elementos de registo. Sei que há quem rejubile com isto e sinta um entusiasmo que me transmite a ideia que falharam a profissão. Ou não, se pensarmos bem. Porque agora é muito melhor quem faz um perfeito trabalho de auxiliar administrativo do que quem se preocupa em transmitir aos alunos uma visão do mundo que vá para além dos manuais e sebentas.

“Inovar” chega a ser usado, de forma indecorosa, como termo elogioso para quem se limita a mudar formulários e a torná-los mais adequados a cada nova tempestade (ou mera ventania) normativa.

Tal como o McNulty, o “Bunk” Moreland, o Lester Freamon ou o Ellis Carver querem fazer “bom trabalho policial”, eu também quero fazer “bom trabalho de professor”. Mas quase tenho de pedir por favor.

Uma Questão De Liberdade?

Sim, podemos prescindir de regras básicas destinadas a travar contágios e a maioria sobreviverá. Morrerão os mais velhos e mais frágeis, mas isso até apurará a raça, desculpem, a Humanidade, certo? A sobrevivência dos mais fortes. A destruição criativa.

Sim, podemos prescindir de fechar escolas ou de mandar a miudagem para casa, para que os pais possam trabalhar em paz. Ou ficar em paz, em certos casos, porque há entre quem protesta muito, gente desocupada, que não se deve confundir com desempregada. Ou que até pode trabalhar em casa, mas estar com os miúdos o dia todo é uma chatice. Até podemos, contra o “pânico injustificado”, reservar informação e dar espaço aos boatos, podendo tudo acabar nisto.

Mas, depois, se as coisas correrem pelo pior a quem defende isso, acham que ficarão calados e não quererão apurar “responsabilidades”? Sim, porque muitos dos primeiros a clamar por “liberdade” contra a conspiração global das máscaras e do confinamento, serão dos primeiros a apontar o dedo. Aos outros.

A Ler

Para quem tiver assinatura. Eu vou racionando os artigos disponíveis, embora colabore lá há mais de uma dúzia de anos.

Quanto ao tema, sou dos que há muito constatou que as “elites” muitas vezes auto-definidas, se baseiam mais numa posição económica e nas suas conexões do que no seu esclarecimento. Basta ver que o movimento anti-vacinação parte do topo e até tem muitos “legitimadores” entre a “classe médica” e “especialistas”. Lá fora e por cá.

A elite e os pais radicais (2)