Ainda pensei se valeria a pena (não) reagir ao rasgado elogio que João Miguel Tavares dirigiu aos professores portugueses, no Público de ontem. Há quem sinta bem o reconhecimento, qualquer reconhecimento e há quem goste de quem faz uma espécie de mea culpa em relação a prosas anteriores. Eu incluo-me nos que gostam de alguns reconhecimentos e nos que apreciam quando alguém admite que esteve mal e emenda a mão sem ambiguidades. Ora… o texto de João Miguel Tavares não cumpre nenhum dos quesitos, acrescendo o facto de não lhe reconhecer propriamente competência para avaliar o desempenho da classe docente e declarar “que [os professores] se comportaram de forma exemplar“. Lamento, mas o meu “comportamento” não é passível de avaliação por qualquer um, só porque fui dar aulas. Essa é a lógica da espécie de avaliação do desempenho que temos e acha que bastam duas aulas para se avaliar um professor ou que o preenchimento de muita papelada com conversa fiada é sinónimo de qualidade.
No fundo, JMT considera que os professores foram “exemplares” porque foram dar aulas. A mim, que também sou encarregado de educação, isso não me chega. É escasso. Não me chega que me metam a filha numa sala de aula, durante umas horas por dia.
O resto do texto também não ajuda a achar que é sincero – ou se sequer está lá – o reconhecimento de que a prosa escrita no início de Julho esteve mal e que não era mais do que a passagem de um atestado de menoridade cívica aos professores, mesmo se quem o escreveu já comandou o 10 de Junho a pedido do presidente. Eu não fui dar aulas – como tantos outros foram – por causa de “picadelas” da treta, mas apesar delas. Aliás, aquele texto esteve na primeira linha das justificações para não dar aulas, porque a minha dignidade profissional e o meu “sentido cívico” pré-existe em muito às prosas de JMT, pois é uma consequência da diferença geracional… o meu último atestado médico terá sido metido quando ele ainda estava a começar a sua carreira nas “ciências da comunicação” e eu andava pela idade de Cristo e apanhei uma enorme gripe (coincidências!). O texto de ontem é, no fundo, uma espécie de palmada nas costas dos professores, mas também nas do próprio escriba (que parece sentir um pouco como sua a “exemplaridade” docente), com uns remoques anti-sindicais lá pelo meio.
E, claro, há ainda aquela tirada sobre os efeitos “psicológicos e académicos” do período de regime não-presencial para o Ensino Básico, como se uns meses em casa com a família fossem uma “catástrofe”. O que nos explica muito sobre mais coisas do que aqui me apetece escrever quanto à relação entre a petizada, certos ambientes familiares e o papel dos professores.
Mas não queria acabar sem referir a crítica ao encerramento das escolas em Abril para o Ensino Básico que JMT considera ter acontecido “sem que houvesse qualquer sustentação científica para tal decisão”. Por acaso, existe sustentação científica para afirmar que a abertura das escolas é um dos factores que mais multiplica o risco de contágio. O que não tem sustentação, ou diz a verdade por menos de metade é que “não são as crianças as principais propagadoras do vírus, nem as escolas o centro dos surtos”. As crianças são efectivamente propagadoras do vírus e as escolas não são o “centro dos surtos”, mas tudo o que envolve o seu funcionamento é das variáveis mais activas na contaminação e no tal valor R. O JMT é que só lê o que lhe dá jeito e se possível prosas de opinião do Observador ou do Henrique Raposo.
Expresso, 20 de Agosto
Covid-19. As crianças podem ser um veículo de transmissão do vírus por mais tempo do que se pensa
Expresso, 31 de Agosto
The Lancet, 22 de Outubro
Elogios deste(s) são como loas dos nazis aos judeus…
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Republicou isto em Primeiro Ciclo.
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Se o André viver com elogios despeço-me.
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vier com elogios
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JMT é um filodoxo. Deve manter-se na crítica, gosto de ler algumas das sua crónicas.
Já capacidade para elogiar exige características muito peculiares (valores/conhecimento) que decididamente não vejo nele.
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Ouçam o “mal calibrado” em https://www.tsf.pt/programa/governo-sombra.html, na emissão de 18 de abril, ao minuto 41 e tirem conclusões sobre a sua credibilidade.
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Os miúdos lá da casa são, definitivamente, difíceis de aturar. O homem agradece-nos quando os aturamos por ele.
É um raciocínio normal em alguns meios com pretensões e coiso e tal!
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Absolutamente de acordo, Paulo.
Já nem me lembrava de ter lido o suposto de JMT.
Não senti rigorosamente nada porque o texto era inócuo e sem substância.
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Na mouche, Paulo!
Há tipos e tipas que, só porque são putativos jornalistas ou aparecem na TV, já acham que são gente cheia de sapiência. Não se enxergam mesmo. Haja paciência.
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Os filhos não devem dar “paz” ao Pai!
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Bardacaca para o JMT! E, de caminho, leve o comuna do RAP!
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