Dia: 22 de Dezembro, 2020
Uma Verdadeira Pedagogia Da Autonomia…
… dificilmente se satisfaria com a validação de práticas de servidão burocrático-administrativa ou com uma lógica em que o professor é considerado um irresponsável se não registar tudo o que fez e não fez, com a devida fundamentação em duplicado ou triplicado, em grelha, tabela, plataforma ou questionário, para posterior análise e eventual puxão de orelhas porque falhou aqui um ponto final ou ali ficou um verbo que parece mal à cartilha da “autonomia”. Parece-me de uma imensa hipocrisia, sabendo que me repito, mas apetece-me repetir, porque é coisa que dura e perdura, que quem ande com certas retóricas emancipatórias e inclusivas sempre a cair-lhe do beiço, deveria ter o decoro de não estar sempre a fazer descarado negócio em modo de “formações” reaquecidas em banho-maria das sebentas de outrora, ou que esteja na primeira linha dos que querem amarrar toda a gente a uma concepção do professor como funcionário subordinado e temeroso em relação a qualquer desvio ao padrão dominante.
Já agora, também tenho direito a citação freirista, mas sincera, porque eu até o li, mesmo quando discordava da parte demasiado devedora ao contexto das sociedades pós-coloniais de desenvolvimento muito desigual.
Um Par De Problemas Recorrentes Nesta Época De Avaliações
O primeiro é aquele das pessoas que levam mesmo a sério a teoria da permanente construção do conhecimento, como se nada tivesse ficado adquirido com a experiência, e todos os períodos, todos os anos, colocam a mesma treta de questões, têm exactamente as mesmas dúvidas existenciais e, no fundo, empastelam tudo e mais alguma coisa, quando já deveriam ter idade e a bagagem suficiente para não parecerem recém-nascid@s a cada temporada. Uma das vantagens do regime não-presencial seria a limitação desse tipo de divagações filosófico-pessoais sobre o sentido da rama do nabo. O problema é que, pelo que me contam acerca das presenciais “residuais”, basta ser-lhes dada a oportunidade e esta malta aproveita logo para se estender, sendo muito pior quando fizeram qualquer formação com teorias requentadas do último quartel do século XX.
O segundo é o das pessoas que têm muito pouco a preencher-lhes a vida fora da escola, pelo que a socialização e os “afectos” ou o raio que nos parta ficam quase circunscritos ao tempo e espaço escolar, pelo que adoram esticá.lo até aos limites do razoável, para não terem de regressar ao “ninho vazio” (em termos físicos e/ou emocionais) e então adoram falar, falar, falar, porque gostam de saber que alguém, ou ainda melhor, um grupo, é “obrigado” a ouvi-las. E talvez este seja um problema lateral do “envelhecimento docente”, embora existam salpicos em todas as idades, por esta ou aquela razão que obriga terceiros a preencher um vazio existencial de que não têm responsabilidade. Que raios… o Natal não é para ser passado na escola, por muito que exista quem ache que professor não pode ter “férias”.
Que me desculpe quem acha que ando pouco caridoso, mas há vícios que nenhuma pandemia consegue eliminar, muito menos quando se pode beneficiar de uma proximidade imposta a quem até tem vida pessoal fora dos portões. E não há “renovação” à vista, porque é raro quem chegue novo de corpo e mente.
3ª Feira
Como pode a Educação servir para formar alunos críticos e futuros cidadãos activos e emancipados, se todo o sistema tem sido progressivamente desenhado para transformar os professores numa massa amorfa e cada vez menos capaz de se opor aos desmandos dos vários poderes, preferindo a “estabilidade” do remanso à agitação da defesa dos seus direitos, e nem sequer me refiro a questões salariais? Pode quem se transformou em parte de um rebanho ou pastor oportunista ensinar alguém a ser outra coisa? De que adianta tanto encherem a boca e as prosas de Paulo Freire se alinham pelo lado do “opressor” e quase tudo fazem para reduzir os outros a oprimidos? Pode a “libertação” acontecer numa sala de aula, quando toda a escola está sitiada por uma prática que desvaloriza e amesquinha qualquer tentativa de verdadeira emancipação? Poder, até pode, mas quase de forma clandestina, fugindo ao guião dos que travestiram o que dizem ter sido os seus ensinamentos. Acreditem, Paulo Freire, mesmo que estejam muito datadas as suas concepções, coraria de vergonha ao ver a prática de tant@s que o citam por aí, sem pudor e por simples conveniência.