Esta Semana No JL/Educação

Quase me engasguei quando vi a primeira página e percebi que lá estavam textos de quatro ex-ministros da Educação e do actual titular. Apesar de, no conjunto, terem ocupado o cargo mais de metade dos últimos 25 anos, é interessante como se lamentam da falta de medidas nesta área da governação, nomeadamente na questão da formação de professores. Quem lê alguns dos textos fica com a sensação que, afinal, estiveram na pasta da Agricultura e Pescas ou que foram manietados por poderosas forças imobilistas e conservadoras (sindicatos, a própria classe docente, essa malandra, que manda em tudo. que os impediram de governar.

Enfim. Não me vou estender. Fica o que é meu.

No passado mês escrevi sobre algumas lições gerais da pandemia na área da Educação, quando ainda não tínhamos iniciado a segunda vaga de ensino remoto de emergência, sendo que a “emergência” deriva em grande parte da não aprendizagem de parte dos ensinamentos colhidos há cerca de um ano.

Desta vez, gostaria de abordar outro nível de lições, de tipo mais prático, sobre o funcionamento do ensino à distância que temos e que continua a insistir numa visão que privilegia mais a burocracia e o controlo do trabalho de alunos e professores do que na sua agilização e adaptação às novas cicunstâncias.

1. Cada nível de ensino e faixa etária tem características próprias, não devendo ser todos os alunos tratados da mesma forma em nome de um conceito deajustado de igualdade. Isto significa que é um erro tomarem-se medidas que não tenham em conta as especificidades e exigências de cada nível de escolaridade, não apenas do ponto de vista sanitário, mas de igual modo quanto à organização do trabalho a desenvolver com os alunos e com as pedagogias a aplicar durante o regime não-presencial. O encerramento de todos os estabelecimentos de ensino foi uma medida acertada, mas tardia. Teria sido mais adequado ter sido feito um encerramento faseado que, para além das questões relacionadas com o processo de ensino e aprendizagem, teria permitido uma mais fácil adaptação das novas rotinas familiares. Da mesma forma, seria importrante que a reabertura seguisse também uma lógica de faseamento, de acordo com os níveis de risco sanitário, a autonomia dos alunos em regime não-presencial e a importância do convívio social para as crianças e jovens de diferentes idades.

2. O ensino remoto não pode replicar o ensino presencial, tanto nos horários como nos métodos de trabalho. O que parece uma evidência não parece ter sido assumido com seriedade em muitas escolas nesta segunda vaga de confinamento geral. Em muitas escolas, os horários do regime de E@D (ensino a distância) procuraram replicar o mais fielmente possível o das aulas presenciais, não compreendendo que são ambientes de aprendizagem muito diversos, que implicam um tipo de interacção muito diferente, provocando um maior desgaste nos envolvidos, em especial quando as actividades se desenvolvem em permanente sincronia e em sucessivas vídeoconferências. Há a clara sensação de se ter querido transmitir a percepção que se deveria assegurar a mesma carga horária de trabalho semanal em sessões síncronas em relação à que existia nas aulas presenciais. Isto apesar de recomendações oficiais em sentido inverso, sugerindo-se que só no Ensino Secundário o trabalho síncrono deveria estar próximo do presencial. Há casos de cargas horárias semanais síncronas de 70-100% dos horários em sala de aula tradicional no 1º e 2º ciclos do Ensino Básico, com 3 e 4 sessões diárias por vídeoconferência, o que é uma verdadeira violência para os mais jovens e um claro desconhecimento da sua capacidade de concentração neste tipo de ambiente de aprendizagem. Igualmente grave é o facto de se ter confundido sincronia com vídeoconferência ou de não se ter compreendido que o ensino remoto funciona tanto melhor quanto sejam planificadas actividades assíncronas que respeitem o ritmo de trabalho diferenciado de cada aluno.

3. Quantidade de trabalho não equivale a qualidade desse mesmo trabalho. Na Educação também se aplica uma variante da chamada “lei dos rendimentos decrescentes” ou da “produtividade marginal” da teoria económica. A partir de um determinado ponto, a adição de mais “unidades de trabalho” (que, neste caso, é de tempo de aulas) não traz vantagens em termos de produtividade e, pelo contrário, mostra-se contraproducente porque implica um esforço acrescido que não é compensado pelos ganhos. A sobrecarga dos alunos (e dos próprios professores) com mais aulas e sessões síncronas, não significa um equivalente ganho nas aprendizagens e, muito em especial, não se traduz em melhores aprendizgens. O culto de um certo “paradigma da quantidade” como elemento fundamental para se medir o trabalho é um erro comum que acaba por desprezar que a qualidade não se mede com descritores meramente quantitativos.

4. A definição clara de fronteiras entre tempo pessoal (privado) e espaço profissional (público) é muito importante para a manutenção de um equilíbrio decisivo para a saúde mental dos indivíduos e neste caso estou a pensar principalmente nos professores que se encontram no cruzamento de diferentes fontes de pressão, desde as chefias escolares aos encarregados de educação, passando pela opinião pública. Na primeira vaga de E@D foi notória a forma como o espaço da escola entrou pela casa de alunos e professores e as casas daqueles e destes umas nas outras. Assim como se verificou um quase total e pouco saudável desaparecimento do tempo privado dos professores, a quem todas as solicitações chegavam a qualquer momento. Muitas vezes por culpa própria, mas que na altura se compreendeu pela inesperada situação que se atravessava e pela urgência em comunicar com rapidez o que se estava a decidir e a fazer. Mas, quase um ano depois, já deveriam ter sido desenvolvidos mecanismos e canais de comunicação que impedissem que se repetisse o que foi um erro, mesmo que exista quem diga que não e que é assim que as coisas devem acontecer. Permito-me discordar, porque eu não mando mensagens a qualquer hora ao meu médico a perguntar-lhe se devo tomar uma aspirina ou um ben-u-ron ou se chega um cházinho de limão com mel, sempre que sinto o nariz a pingar e um certo desconforto no corpo. Muito menos é imaginável criar um grupo de whatsapp com os contribuintes cá de casa e o funcionário das finanças do meu bairro fiscal. Mas os professores aceitaram fornecer o seu número pessoal para o que desse e viesse e usaram os seus telefones pessoais para assegurar que a emergente rede pública de E@D funcionasse. E estão a voltar a fazê-lo.

5. Uma outra questão recorrente é a da burocracia que aumenta a cada nova situação, raramente desaparecendo qualquer camada de exigências de registo de informação, por mais arcaica que seja. O avanço do digital raramente levou ao desaparecimento do analógico. Ou conduziu a uma simplificação ou aligeiramento dos procedimentos. Em muitas escolas existe uma preocupação obsessiva em assegurar que se regista tudo o que se faz ou que deve ser feito ou que se pensa que fica bem ser registado que se fez. E esse registo deve ser monitorizado e o que se faz deve ser avaliado, monitorizando-se essa avaliação e avaliando-se se a monitoriação funcionou. Em plataforma local criada para o efeito ou aproveitando ferramenta central. Mas nunca descurando que convém deixar cópia em papel, não tanto pela consciência da vulnerabilidade dos suportes virtuais, mas mais por uma espécie de marca d’água do pensamento administrativo-burocrático que invadiu o exercíciuo da docência. Claro que isto nem sempre é assim, felizmente. E haverá quem diga que estou a exagerar. Talvez por reacção de defesa ou, de forma mais sicera, porque desconhecerão que em tempos de E@D há escolas onde até os sumários passaram a estar registados em duplicado e as actividades em triplicado (antes, durante e depois de acontecerem).

6. A avaliação dos alunos é outra matéria sensível e as teses em confronto são bem distintas e nem sempre o debate é pacífico ou tendente a uma troca de ideias que vise o equilíbrio da solução encontrada. Também aqui se fala muito em “paradigma” e na necessidade de o mudar. Sempre em nome do “sucesso”. Sempre com os olhos postos nas estatísticas de curto prazo, buscando nelas a legitimação das crenças transformadas em políticas de remendos. É outra área na qual os poderes locais replicam muitas das práticas do poder central. É raro que pensem para além da conveniência. Em tempo de E@D replicam-se mecanismos do ensino presencial ou verifica-se uma enorme dificuldade em repensar práticas. Eu, que admito ser adepto de procedimentos de avaliação que não sejam meras vias rápidas para aprovações de escasso mérito e um claro crítico das teses que transferem toda a responsabilidade de qualquer insucesso para os docentes, acho que este é um tempo que exige que se pensem formas diferentes de avaliar o trabalho dos alunos. Que sejam flexíveis mas com um mínimo de fiabilidade. Que sejam diversificadas sem se tornarem uma espécie de manta de retalhos. Que entendam que o actual contrexto é singular, mas que pode ser a ocasião certa para se ir além de oportunismos. Mas confesso a minha desesperança quanto a isso.

Colaborações

Texto enviado por colega que optou pelo anonimato.

Pregar no Deserto em Busca de um Oásis

– A Senhora Ministra da Saúde, afirmou há tempos, que a ordem é “testar, testar e testar”. Então qual a razão que nos levou a cair há poucos dias para o 16 ou 17º país no ranking dos países europeus, no que concerne aos testes à Covid-19, sendo Portugal um país com mais casos na Europa há 4 ou 5 semanas? Para maquilhar as estatísticas ou algumas falhas?

– Palavra de Ministro, não é palavra honrada? É verdade que os computadores só foram encomendados no final de dezembro de 2020?

– Se voltarmos à Escola Presencial em março, o cenário do aumento de contágios de reinfecções, está de todo afastado, certo?

– Para além dos doentes infetados e acamados com covid-19, mais os médicos, enfermeiros, bombeiros, porteiros, auxiliares de limpeza, alguém tem a noção exata do que é estar infetado?

– Quais as razões porque o Estado não assinou acordos com as operadoras de telecomunicações para reforçar a potência e a velocidade da internet em setembro ou outubro?

– Porque não se instalaram em tempo útil mais antenas das operadoras de telecomunicações pelo País?

– Será que dos 400 milhões ou 500 milhões de Euros prontos para nova injeção no Novo Banco, não poderiam ser canalizados para a aquisição das tais antenas e reforço da velocidade da net?

– Porque têm os professores de investirem 800 a 1200 Euros do seu bolso para assegurar as aulas à distância, mais a eletricidade da sua própria carteira?

– Quais as razões que sustentam que os Diretores e as Direções dos Agrupamentos podem eternizarem-se nos seus cargos, quais dinossauros? 

Se os Presidentes da República (2 mandatos seguidos) e os Presidentes de Câmara têm os seus mandatos limitados em termos temporais, porque não se passa o mesmo com as Direções e com os Diretores dos Agrupamentos? 

– Se na política pública e na Constituição, existe independência dos três poderes, qual a razão para que um(a) Diretora) presida à Direção (lógico), presida ao Conselho Pedagógico (mais ou menos lógico) e também presida à SADD (Seção de Avaliação de Desempenho Docente)? Ou esteja presente, de modo a poder influenciar (em abstrato) as classificações? Não é demasiado poder numa só pessoa? Não há amigos[as) das Direções? Sim, aqueles que andaram com folhas a angariar assinaturas paras listas? E há também os Bufos (Reais) que querem ainda ser mais bonitos do que já são?  Quem duvida disto, consulte os sábios conselhos dos psicólogos, psiquiatras, neurocientistas, sociólogos, antropólogos, advogados? O trabalho multidisciplinar é muito importante!

– Porque razão, todos os docentes, todos os Encarregados de Educação, todos os assistentes operacionais e todos os alunos com mais de 14 anos (já têm idade para tirarem a carta de motociclo) não podem votar para escolher os seus Diretores de Escola/Agrupamento?

– Só agora com o Ensino à Distância, é que Vossas Excelências despertaram para as centenas ou milhares de jovens em risco, provenientes de famílias disfuncionais, desestruturadas ou muito carentes em termos socioeconómicos?

– Qual a razão que leva a que apenas 250 psicólogos (dos 24 000 existentes no País) exerçam no Sistema Nacional de Saúde?

 – Talvez alguém tenha razões reais, objetivas e solidamente fundamentadas!  

– Como disse John le Carré, ver o mundo atrás de uma secretária, pode ser muito perigoso!

– O conhecimento, a transparência e uma boa comunicação, são fontes de credibilidade e de evolução a todos os níveis. O exemplo tem que vir de cima, porque o “peixe apodrece pela cabeça”;

– Houve Agrupamento(s) que retiraram 45 minutos à História no 8º Ano (com um programa muito extenso) e abdicaram de ter como opção no 12º Ano, a Disciplina optativa de História , Culturas e Democracia…E depois, admiram-se do crescimento dos extremismos, de atos violentos e do crescimento eleitoral de partidos que querem dividir portugueses, em vez de “unir” para que as mentes muito brilhantes que existem no País, brilhem no Mundo, como o CR7 brilha no desporto-rei!

– Viva a democracia, qual planta, que todos os dias tem de ser alimentada e é preciso muito cuidado com as ervas daninhas que possam crescer ao seu redor e também com os parasitas que podem infiltrar-se nela, apodrecendo-a!

– Uma última nota: por que razão a maioria dos pais, quer muito bons e excelentes professores para os seus filhos, mas não querem que os seus filhos sejam professores?

Um País que não aposta na Educação, é um País eternamente adiado! Todos os doutores, constitucionalistas, engenheiros, arquitetos, médicos, enfermeiros, comerciantes, jornalistas, carteiros, padeiros, motoristas, cozinheiros, jardineiros, funcionários dos super e hipermercados, etc. Tiveram que ter na sua formação professores para lhes ensinar as letras, os números, a geometria e a desenvolverem o cálculo, o raciocínio e…a inteligência!

Quase a finalizar recorro as algumas afirmações, quais pilares educativos e formativos, que arrancam do subsolo, atingem os céus (e toda esta galáxia):

“Educai as crianças, para que não seja necessário punir os adultos. “- Pitágoras.

 “Numa época de mentiras universais, dizer a verdade é um ato revolucionário.” – G. Orwell

A Cegueira da Governação

Príncipes, Reis, Imperadores, Monarcas do Mundo: vedes a ruína dos vossos Reinos, vedes as aflições e misérias dos vossos vassalos, vedes as violências, vedes as opressões, vedes os tributos, vedes as pobrezas, vedes as fomes, vedes as guerras, vedes as mortes, vedes os cativeiros, vedes a assolação de tudo? Ou o vedes ou o não vedes. Se o vedes como o não remediais? E se o não remediais, como o vedes? Estais cegos. Príncipes, Eclesiásticos, grandes, maiores, supremos, e vós, ó Prelados, que estais em seu lugar: vedes as calamidades universais e particulares da Igreja, vedes os destroços da Fé, vedes o descaimento da Religião, vedes o desprezo das Leis Divinas, vedes o abuso do costumes, vedes os pecados públicos, vedes os escândalos, vedes as simonias, vedes os sacrilégios, vedes a falta da doutrina sã, vedes a condenação e perda de tantas almas, dentro e fora da Cristandade? Ou o vedes ou não o vedes. Se o vedes, como não o remediais, e se o não remediais, como o vedes? Estais cegos. Ministros da República, da Justiça, da Guerra, do Estado, do Mar, da Terra: vedes as obrigações que se descarregam sobre vosso cuidado, vedes o peso que carrega sobre vossas consciências, vedes as desatenções do governo, vedes as injustiças, vedes os roubos, vedes os descaminhos, vedes os enredos, vedes as dilações, vedes os subornos, vedes as potências dos grandes e as vexações dos pequenos, vedes as lágrimas dos pobres, os clamores e gemidos de todos? Ou o vedes ou o não vedes. Se o vedes, como o não remediais? E se o não remediais, como o vedes? Estais cegos.

Padre António Vieira, in “Sermões”

…Continuo a acreditar (racional e emotivamente) na Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), na Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959) e na Constituição da República Portuguesa!

J.

P.S. Estas perguntas e as opiniões subjacentes às mesmas, não visam criar unanimidade!

5ª Feira – Dia 18

De acordo com uma sondagem conhecida ontem, mais de 80% dos inquiridos concorda com o fecho das escolas e que elas assim se mantenham nas próximas semanas. Este resultado entra em claro conflito com a atitude de grande parte da opinião publicada e mediatizada. Porque se lermos ou ouvirmos muito do que surge nos jornais ou nos canais televisivos de notícias, ficamos convictos que a maioria dos portugueses está contra o encerramento das escolas e as quer abertas o mais depressa possível.