Gravado a meio da época dourada do homem. Sometimes It Snows in April…
(o meu exemplar não tem ali aquelas letras de lado a estorvar…)
Gravado a meio da época dourada do homem. Sometimes It Snows in April…
(o meu exemplar não tem ali aquelas letras de lado a estorvar…)
… surpreende muito os investigadores, quando chegam perto dela. Estes estudos têm o mérito de dar chancela “científica” a realidades mais do que conhecidas por quem vive fora de casulos, mas acabam quase sempre a irritar-me em certa medida. Porque depois há daquelas constatações que “surpreendem” os engomados de gabinete, por estimáveis que sejam. Parece que descobriram que ter um emprego, mesmo estável, não dá imunidade à pobreza. Logo pela manhã, fiquei a falar com o rádio do carro ao ouvir a peça da TSF e as declarações do principal investigador que descobriu que quem nasce em meio pobre, dificilmente se endireita ou passa de remediado, mesmo que seja “efectivo”. O problema de algumas tertúlias académicas certificadas é que tomam os seus conceitos, nascidos dos seus problemas pessoais (como os de pós-doutorados, com bolsas anos a fio, que ainda não conseguiram vaga nos quadros da Universidade e depois despejam raivas contra Básicos e Secundários), por uma realidade social que não existe. Sim, o “precariado” é indesejável, mas os baixos salários são uma chaga ainda maior. Por acaso, o período em que mais ganhei, em termos relativos, foi quando era professor contratado e tinha mais um par de biscates que me davam outro tanto de remuneração. Há precários a ganhar muito bem e “estáveis” a ganhar muito mal. O problema é estes últimos serem muitos. Mesmo muitos.
Pode andar-se anos ou décadas a fio a dizer que a desregulação das condições de trabalho (abusivas em termos de horário e remuneração) estão na base de muitos problemas, incluindo o insucesso escolar ou o “sucesso remediado”, mas há sempre aquela malta que teoriza a batata na perspectiva do contra-factual e do camandro ao cubo e conclui que a pobreza é apenas um estado de espírito. Sim, é verdade que há muita pobreza de espirito por aí. Mas essa tem uma distribuição transversal nos diversos escalões de rendimento. A pobreza material, daquelas pessoas que sobrevivem um mês com menos dinheiro do que custa uma bicicleta (ou uma roda, que as há a mais de 1000 euros e não necessariamente para profissionais) dos ciclistas chique que se pavoneiam ao fim de semana em leque por aí, é muito diferente. É aquela pobreza, como constatou com ar de alarme o investigador, para a qual uma diferença mensal de 10-20 euros pode ser decisiva.
Que em 2021 seja preciso um estudo com uma dezena de autores para o demonstrar revela muito sobre a tal “pobreza de espírito” de que falava mais acima.