Ele É Que Soube Sempre De Tudo!

David Justino dá uma entrevista em que faz aquilo que o ouvi criticar a outros, com muito menos razão. Pelos vistos, ele é que sempre soube tudo e desde o início denunciou “uma clara rutura com as grandes linhas de política educativa que foram desenvolvidas nas duas décadas anteriores”.

Não é verdade que as actuais políticas sejam um “clara rutura” com as políticas das décadas anteriores, muito menos em várias das áreas que identifica. Para além de que oculta aquilo em que a continuidade é a regra. Dá como exemplos de mudança de rumo “a valorização das vias profissionalizantes, o alargamento da escolaridade obrigatória, o reordenamento da rede escolar ou a existência de provas de avaliação externa no final de cada ciclo”. Tirando a última, no resto não encontro qualquer ruptura, até porque não percebo se Justino, se fosse ministro, continuaria a fechar escolas ou a alargar a escolaridade obrigatória. Quanto às “vias profissionalizantes”, estes últimos anos têm sido de reforço das facilidades para o seu sucesso. Pura e simplesmente, não faz sentido o que afirma. Já quanto à manutenção da “racionalização” na gestão dos recursos humanos, do modelo único de gestão escolar, do estrangulamento da carreira docente ou da pressão para produzir sucesso a qualquer preço.

Não vale a pena apontar o exacerbado pessimismo quando prevê para anos e anos, ou mesmo uma década ou mais, os efeitos da pandemia na Educação, porque sabemos bem que há quem tenha pensos à venda para algumas das cicatrizes apontadas.

Mas a resposta que padece da maior carga de hipocrisia, em quem nunca se opôs de forma clara à proletarização e precarização da profissão docente é a que a seguir transcrevo e a qual nem vou comentar ade forma extensa s parcelas que revelam menor decoro, desculpem coerência, para não ser profundamente desagradável para com alguém que, afinal, acha que de 1995 a 2015 tudo foi feito da forma certa e sem sobressaltos.

Pelos vistos, embora tenha defendido, ainda jo CNE, que a redução dos alunos de turma era prejudicial pelos encargos (calculados de forma hiperbólica) que acarretaria, agora diz que a medida é errada por causa da falta de professores. Digamos que esta é uma “clara rutura” com o que afirmou no passado, mas só os burros é que não mudam de opinião, conforme as conveniências.

Especialistas alertam para uma grande falta de professores, sendo que alguns grupos de recrutamento já estão com carência de docentes. Como se resolve a questão?
Não temos alternativa: tornar a profissão mais atrativa. Mas isto, como é característico em educação, leva anos. Não há medidas mágicas para que os mais jovens entendam a profissão docente como algo de atrativo e socialmente reconhecido. Até lá temos de gerir melhor os recursos docentes que existem no sistema. A tentação mais perigosa é a de voltarmos a aligeirar os requisitos para se ser professor. Por isso teremos de ser mais exigentes e recompensar essa exigência com maiores benefícios e condições de trabalho para os professores. Percebe agora as consequências de reduzir drasticamente o número de alunos por turma? Se o fizermos, vamos criar mais turmas e depois não temos professores suficientes para as lecionar. Uma boa gestão de recursos humanos em educação pressupõe um planeamento minucioso e a longo prazo. Não se compadece nem com voluntarismos nem com medidas avulsas.

Sábado

A inconsciência de algumas pessoas chega a pontos perfeitamente impensáveis, dando a entender que existe um completo descolamento da realidade, como se sentissem imunes ao cumprimento de quaisquer regras, incluindo aquelas das quais deveriam ser a primeira garantia.

Enquanto numa escola um colega recebe a documentação solicitada em requerimento, com todos os dados detalhados (sem identidades) quanto às classificações no seu universo de avaliados, em outra pré responde-se a uma uma reclamação de outro colega, baseada na irregularidade dos procedimentos com a sugestão de uma nova irregularidade, do género “para bem de todos”. Será que acreditam que o que está mesmo em causa é a total rejeição de esquemas de nacional-porreirismo ao serviço do mais descarado amiguismo?