Vamos no mesmo caminho?
Dia: 12 de Dezembro, 2021
Mais Um “Estudo”
Desta vez é o apuramento dos resultados daquele inquérito sobre Capacitação Digital dos docentes do ensino superior que se andou a preencher e que dava pela designação estranha de “Check In”. Uma equipa da Universidade de Aveiro considera-o um “estudo pioneiro”, o que fica sempre bem, em especial quando solicitado pela DGE.
Há um par de detalhes que deveriam ser tidos em conta, antes de se passar para o principal que é o facto dos resultados dos professores portugueses até serem melhores do a média europeia.
Primeiro detalhe: os investigadores da Universidade de Aveiro traduziram o inquérito para português, não o criaram. O original está aqui. O que fizeram foi coligir os dados recebidos porque, ao que parece, os serviços do ME são incapazes de o fazer. Neste caso, não sei qual o custo, porque não detecto nada na base.gov.
Segundo detalhe: o inquérito prestava-se a dúvidas, porque colocava questões sobre as práticas dos docentes e nem todos perceberam que havia lá uma introdução a explicar que se deveria responder acerca do que se conseguiria fazer se existissem condições ideais. Grande parte respondeu com o que fazia, com os meios efectivamente disponíveis.
Terceiro detalhe: por isso, algumas conclusões que foram retiradas quando à falta de capacitação digital da maioria dos docentes talvez merecesse uma melhor caracterização, que não apenas o já cansativo e preguiçoso argumento do “envelhecimento”.
Disto isto:
Margarida Lucas aponta que os resultados “estão em linha com resultados apurados noutros países europeus” sendo que, em alguns casos e em relação a áreas específicas de competência, são até melhores. “Há vários fatores que podem ajudar a explicar os resultados, sendo um deles o facto de termos um corpo docente envelhecido que não foi preparado para esta realidade e que pode não ter optado, ao longo da sua carreira, por investir nesta área”, explica.
Domingo
Têm-me pedido para divulgar esta posição pública de um colega de Educação Física que participou no “EstudoEmCasa” e que sente que, entre outras coisas, essa participação não foi devidamente tida em conta na sua avaliação do desempenho. Em primeiro lugar, como ele garante que vai reclamar, tenho quase a certeza que terá o Muito Bom que almeja.
Mas há por ali outras questões que me interessam e que não passam pela avaliação do colega que aceitou participar num projecto sobre o qual sempre tive dúvidas, independentemente do desempenho que teve ou acha que teve quem nele andou.
Interessa-me mais todo o subtexto que se extrai da indignação de quem descreve a situação assim:
Abracei o projeto acima referido com verdadeiro espírito de missão, porque foi um projeto que exigiu muito, mas mesmo muito trabalho e nenhumas regalias. Foram transmitidas, na televisão, aulas por mim totalmente planeadas e gravadas do 1º ao 12º ano. Já agora, convém referir que a minha/nossa remuneração foi sempre exatamente a mesma (contrariamente ao que alguns pensam), tal e qual como se estivéssemos a lecionar na escola em condições normalíssimas, exceção feita às despesas de deslocação. Quanto ao dinheiro avançado, que cada um de nós adiantou pelo Estado, importa salientar que o respetivo pagamento ainda não foi liquidado. Incrível…! Para mim e para os meus colegas de profissão, a palavra tem muito valor. Infelizmente, todos sabemos que o mesmo já não se pode dizer de alguns políticos, ou de pessoa/s com cargo de coordenação. Os professores que estiveram ligados ao projeto #EEC, no ano letivo passado (2020/21), trabalharam muito mais do que o horário semanal estipulado por lei. Além disso, foi-nos sempre dito que o Projeto daria lugar, via oficina de formação, à acreditação de 50 horas. Nunca aconteceu. Tenho colegas que necessitam dessas mesmas horas para progressão na carreira docente, não é o meu caso, mas é como se fosse. De referir também que apenas ontem ao final da tarde, tive conhecimento da minha avaliação de desempenho docente. A avaliação de desempenho docente é uma autêntica farsa desde há muito tempo, pois é um estímulo à mediocridade ao invés de refletir a meritocracia na educação. A minha avaliação foi “Bom”, apesar de todo o trabalho desenvolvido ao longo do projeto ter sido reconhecido como “Muito Bom”. Aliás, infelizmente até por causa de quotas, a grande maioria dos professores é avaliado com esta menção. Contudo, não aceito e vou contestar e lutar pela verdade e pela justiça.
Não sei a idade do colega, nem o seu contexto escolar. Só sei o que tem no fbook, ou seja, que é professor, personal trainer e gerente de uma empresa. Por isso, não vou dizer que tinha obrigação de saber com quem se estava a meter. Sou certamente mais velho e talvez seja por isso que nunca confiaria, sequer, o empréstimo de um livro estimado a um destes governantes da Educação ou a algumas das lideranças locais que empurraram docentes das suas escolas e agrupamentos para o “EstudoEmCasa” com promessas vãs de recompensas futuras. Promessas que, pelos vistos, existiram mesmo. Que não foram cumpridas. pelo menos, até agora. Ora bem, nada isto me espanta. Nem que a farsa da add só seja percepcionada quando nos bate à porta o que sentimos como injustiça.
Por isso, este é um testemunho que me deixa uma sensação “mista”, porque nada disto era inesperado. Desde as promessas ao incumprimento. O colega escreve que “O mais lamentável de tudo é que este comportamento venha, precisamente, daqueles que têm responsabilidades públicas e cargos decisores na política e na educação”. E é verdade. Mas já era verdade antes, quando aceitou participar. Concordo que a desonestidade é de denunciar e que estes colegas foram claramente abusados. O que me admira é que pensassem que poderia ser de outro modo, mesmo se acho que as horas de formação vão acabar por parecer, só restando saber se, por isso, passarão a acreditar que “a meritocracia na educação” existira antes e que estará de volta apenas por causa disso.
Não estou a ser completamente solidário? Talvez esteja a ser mais do que isso, porque talvez esteja a ajudar um pouco a que, para a próxima, entrem nas coisas de olhos abertos e imunes a seduções. Porque idas ao programa da Cristina ou ao Preço Certo (não foi o caso deste colega, acredito) não deveriam ofuscar a lucidez.