Aguardo Estudos Sobre A Escassez Dos Médicos…

… e as opiniões iluminadas d@s economistas Peralta e Conraria sobre o seu impacto nas desigualdades de acesso à Saúde pelos mais desfavorecidos. Se passaram a perceber tanto de Educação nos últimos dois anos, é apostar também na Saúde que deve render ainda mais créditos.

Em 2020 e 2021, aposentaram-se 652 e 577 médicos, respectivamente. No ano de 2019, registaram-se 409 médicos reformados.

Domingo

Ontem, a novel tracking poll da novel CNN Portugal apresentou pela primeira vez o PSD à frente do PS. Tenho sérias reservas acerca da metodologia destas sondagens, mas isso já virá a seguir. Antes, conviria dizer que a descida acentuada do PS durante esta semana corresponde ao rescaldo das primeiras intervenções de António Costa em que ele falou em “maioria absoluta”, no que foi um erro crasso por parte dos seus spin doctors. Achando que maioria absoluta rimava politicamente com estabilidade, revelaram uma imensa falta de memória, ou então apostaram na falta de memória dos portugueses, a qual existe, mas de forma intermitente. Por outro lado, houve outros momentos em que António Costa falho por completo em termos comunicacionais, como quando tentou esquartejar ao vivo um debilitado Jerónimo de Sousa, mostrando a sua faceta de rufia a todos (mesmo eu que não vi o debate ao vivo, fui confirmar depois o que se tinha passado e, independentemente de simpatias políticas, o que aconteceu foi lamentável) ou quando quis acabar o debate com Rio exibindo para as câmaras o calhamaço com o Orçamento de Estado chumbado pela oposição (fazendo lembrar a insistência de Sócrates em culpar tudo com o chumbo do PEC IV). O resultado foi uma profusão de montagens em que o OE22 se transformou nas 100 melhores receitas de bacalhau ou na inesquecível revista Gina.

De qualquer modo, por muito que me digam que a metodologia das sondagens e em particular destas diárias é algo fiável, mantenho as minhas reservas. Li material suficiente sobre o assunto (por razões de trabalho que nunca passaram por participar ou montar empresas de sondagens com meia dúzia de estagiários e linhas telefónicas), para perceber como justificam as margens de erro e a representatividade da a ostra usada. O problema é que discordo por razões que penso serem de ainda mais simples compreensão.

Vejamos a ficha técnica da tracking poll referida. Uso um excerto extenso para que não se diga que tirei seja o que for de contexto.

Durante 4 dias (18 a 21 de janeiro de 2022) foram recolhidas diariamente pela Pitagórica para a TVI e CNN Portugal uma sub-amostra de 152 entrevistas representativa do universo eleitoral português (não probabilístico) tendo por base os critérios de género, idade e região. O resultado do apuramento dos 4 últimos dias de trabalho de campo, implica uma amostra de 608 indivíduos que para um grau de confiança de 95,5% corresponde a uma margem de erro máxima de ±4,06. A seleção dos entrevistados foi realizada através de geração aleatória de números de “telemóvel” mantendo a proporção dos 3 principais operadores identificados pelo relatório da ANACOM, sempre que necessário são selecionados aleatoriamente números fixos para apoiar o cumprimento do plano amostral. As entrevistas são recolhidas através der entrevista telefónica (CATI – Computer Assisted Telephone Interviewing).

A minha maior reserva prende-se naturalmente com a dimensão da amostra e a sua relação com a forma como representará a população, nomeadamente tendo em conta que os deputados são escolhidos por círculos eleitorais. Apenas 4 distritos representam 125 deputados (Lisboa, Porto, Braga e Setúbal). Por sua vez, 6 distritos elegem apenas 17 deputados no seu conjunto (todo o interior raiano de Bragança a Beja). Isto para não falar, em termos de assimetrias nos círculos da emigração que elegem 4 deputados e que duvido que tenham sido “sondados”.

Com uma amostra com 608 indivíduos, para 230 deputados, isso significa que cada deputado corresponderá a 2,64 entrevistas. O que significa que distritos com 3 deputados corresponderão a 8 entrevistas, mais ou menos, distritos com 4 deputados a 10,5 entrevistas e distritos com 5-6 deputados por 13 ou 16 entrevistas. O que significa que as entrevistas diárias com 152 indivíduos corresponderão a um quarto destes valores. O que equivale a dizer que de Bragança a Beja, diariamente, serão feitas apenas 1 a 2 entrevistas para determinar o sentido de voto desses círculos eleitorais. Mesmo em círculos eleitorais de maior dimensão (8 a 10 deputados, o que inclui Leiria, Coimbra, Santarém, Faro ou Viseu) por dia serão inquiridos 3 ou 4 indivíduos. Basta a mudança do sentido de voto declarado por um deles para alterar por completo o panorama desse distrito.

Ahhhh, dir-me-ão os “técnicos”, mas a sondagem agrega isso tudo e dá o resultado global da percentagem e não o cálculo dos deputados em concreto. Ssim, mas assim sendo ainda mais inútil se torna, porque podemos ter partidos empatados “tecnicamente” (o que se passa com o Bloco, o Chega, a IL e a CDU, por exemplo, ou o PAN, o CDS e o Livre) que, devido à concentração de votos em alguns círculos eleitorais, poderão ter um número de deputados muito diferente. 6% de votos concentrados em especial nos 4 círculos mais representativos podem corresponder a 7-8 deputados e 6% de votos dispersos pelo país podem representar apenas 1 ou 2 eleitos. 2% em Lisboa e no Porto e 0,5% no resto do país podem dar um par de deputados ou mais, enquanto 2% espalhados pelo país podem até nem dar nenhum.

Sim, as sondagens e as tracking polls são interessantes mas são muito mais falíveis do que afirmam ser, porque ou são vulneráveis a distorções com amostras tão magras ou acabam por não nos dar o retrato do país em termos de potenciais deputados eleitos. Em boa verdade, são mais indicadores de tendência do que previsores rigorosos dos resultados finais, até porque o erro de antes se usar os telefones fixos para as entrevistas agora é replicado por se usar quase exclusivamente telemóveis. Assim como há uma tendência para “esconder o voto” por parte de quem, mesmo por via remota, tem uma certa vergonha em revelar em quem vai votar. O fenómeno não é desconhecido em outras paragens, tendo o “voto escondido” sido uma das explicações para o falhanço das sondagens na disputa entre Trump e Hillary Clinton e chegou a ser um receio na disputa com Biden. Por cá, há ex-votantes no PCP que dificilmente admitirão ter passado para o Chega, mesmo se a geografia dos resultados o demonstra, no que seria uma variante nacional do chamado Bradley effect. Este tipo de distorção (embora possa existir a inversa, como o recente orgulho em se ser “liberal” em Lisboa, Porto e entre as elites de Odemira 😉 ) tem sido visível historicamente com o CDS que tem quase sempre resultados acima do previsto na generalidade das sondagens. Outra possibilidade é ainda a o dos respondentes serem sensíveis a outro efeito já estudado (e longe de ser novo) para vários contextos (incluindo os das sondagens) como Social Desirability Bias.

Que o PS e António Costa estão em queda neste momento, não duvido. Que estes indicadores sejam muito fiáveis em termos de resultados finais? Duvido.