Claro que tudo isto é menos sensível para quem, nas escolas, vive em casulos, pacientemente erguidos em seu redor e depois pede aos outros o que fez tudo por não dar.
Dia: 18 de Abril, 2022
Por Cá Também
A semana passada cheguei a pensar que iam fazer uma peça sobre isto por cá, mas parece que não, que a quadra pascal recomenda assuntos mais suaves, tipo guerra.
NASUWT say tutors being contacted 24 hours of the day as job parameters become blurred amid pandemic
Números Vs. Impressionismo
Um dos aliados de quem gosta de lançar opiniões acerca das coisas, sem as sustentar em algum tipo de base factual é a ausência de informação, a informação truncada ou a mudança de critérios na organização dessa mesma informação.
Acerca dos professores em exercício há diversa informação relevante nos relatórios anuais do Perfil do Docente, mas há muitos dados que estranhamente não são considerados para publicação. É interessante que se publicam os números de professores sem funções lectivas, até se apresenta a definição, mas depois não se faz a distinção entre quem está nessa situação à espera de aposentação, por doença ou pelo exercício de cargos directivos. O mesmo se passa com a relação entre o vínculo contratual e as horas de componente lectiva. Sabem-se os totais, mas depois não se conhece qual o número de horas que têm, em média ou por intervalo, os professores contratados ou, adicionalmente, quantos contratos fazem ao longo do ano ou mesmo em simultâneo para conseguirem ter os 1100 minutos do cânone.
Por isso, há análises que valem o que valem, pois não temos todas as variáveis disponíveis, não sendo por falta de informação no ME. Estranhamente, não as usando, acabam por depois as facultar a terceiros que delas se servem para estudos que deveriam ser obrigação dos serviços públicos.
Apesar disso, mais vale alguma coisa do que nada.
Ontem, usei os dados da Pordata, mas hoje vou usar os dos relatórios do Perfil do Docente de 2010-11 até 2019-20 (último publicado) que cobrem a década que vai do final do socratismo ao primeiro mandato do costismo, com a troika pelo meio. Convém recordar que estes anos foram marcados pelo discurso acerca do excesso de professores e pela necessidade de regrar o acesso à docência e “seleccionar os melhores”, porque haveria muito por onde escolher, tamanho era o contingente de não colocados nos concursos externos. Agora, o que ouvimos é que são precisos mais professores, seja lá como for, nem que seja formados em pinceladas semestrais ou arrancados a qualquer outra desocupação. Na boca ou teclado das mesmas pessoas, pelo menos numa boa parte.
Vou incluir em seguida os quadros extraídos dos diferentes relatórios, para depois apresentar uma síntese destes dados:
Vamos lá agora ao resumo, sempre tendo em conta que para o Ensino Básico e Secundário, os dados não estão desagregados de forma a que se perceba quem, entre os contratados, está a tempo parcial ou tem horário completo, ou quem, entre os do quadro, tem redução e de quanto da CL.
O que se percebe, sem especial esforço, é que em 2019-20 existiam menos professores em exercício do que em 2012-13, ano de forte “encolhimento” no número de docentes, do quadro, mas em especial dos contratados, que passaram de mais de um quarto para menos de 14% do total, sendo a redução superior a 16.000 em números absolutos. Ao contrário do que alguns impressionistas afirmam, de acordo com os números oficiais sobre a rede pública, o número de professores não é maior agora do que em 2015, sendo a redução dos do quadro na ordem dos 10%, em parte compensada pelo aumento dos contratados.
A actual “falta de professores” resulta não tanto de um aumento das horas lectivas ou sequer da redução dos alunos por turma, mas sim do facto de existirem mais baixas médicas prolongadas e de, em virtude do envelhecimento dos docentes, acima dos 55 anos terem menos 2 horas lectivas em 2020 do que 2015. O que gera horários incompletos que, graças ao “brilhantismo” da SE Leitão, deixaram de ser atribuídos na mobilidade interna a professores dos quadros, sem que por isso se tornassem atractivos para professores contratados, exactamente por não garantirem contagem integral do tempo de serviço, inclusivamente para a Segurança Social.
Andar agora a “catar” soluções à pressa, quando andaram uma década a asneirar ou a apoiar sucessivas asneiras, por acção ou omissão, é ridículo e devia ser motivo para demonstrar alguma reserva e decoro. Infelizmente, não.
(quanto a existirem menos alunos, se fizermos uma análise de maior duração, percebe-se que nos últimos 15 anos, a quebra foi equivalente à de professores dos quadros… mas isso fica para mais adiante)
Mais Uma Ideia “Radical”
Eu sou “do quadro”, mas não moro ao lado da escola onde lecciono, nem sequer no mesmo concelho. O mesmo se passa com a minha caríssima melhor metade. Todos os dias, são 100 km de trajectos, saindo mais caro se forem dois carros a manter e pagar impostos. Se dão suplementos a malta que fica sentada ao lado de casa, quase sem dar aulas, o que deveria eu pedir, 35 anos e 1 mês depois de ter dado a minha primeira aula, tendo-se passado quase 20 até ser quadro de escola e agora a ser esmifrado mais de 10 euros o dia só para deslocação até ao local de trabalho (sim, não existem alternativas vagamente razoáveis em transportes públicos)? Subsídio de coiso? É que há gente que não se enxerga mesmo e devia enfiar um balde na cabeça de tanto se andar a choramingar, sem perceber que, bem espremida a situação, até deveriam ruborizar de tanto dizerem mal dos “outros”, sem verem que se calhar a origem do mal está em quem quer melhorar o próprio bolso, mas à custa do que consiga sacar ao desses mesmos outros. O tal nivelamento pelo sudão do sul.
2ª Feira
Aproveitem esta 2ª feira e a próxima porque me parece que ainda neste período vai regressar a tese do “mais com menos” ou a variação menos maligna do “mais com o mesmo”, a avaliar pela conversa de uns e o silêncio de outros. Do lado do PSD e circundantes, até se nota o salivar perante a oportunidade demonstrar – sem grande fundamento factual – que nos tempos da troika é que estava tudo bem e que é necessário voltar às práticas de outrora; do lado do PS, um certo silêncio perante a vontade de fazer algo parecido e o embaraço em serem apanhados com a boca na botija, mesmo com a desculpa da guerra, da pandemia e etc, pois fartaram-se de dizer que vinha aí dinheiro europeu a rodos para resolver tudo. Quanto às “esquerdas radicais” (PCP e BE), nesta matéria não adianta muito dar sequer atenção ao que dizem porque, podendo fazer ou influenciar algo diferente, andaram meia década a assinar de cruz o que era parcialmente “revertido” com uma mão e logo sacado num instante com a outra.
Estamos no 3º período de mais um ano lectivo (desde 2018-19 que me lembre, como professor e encarregado de educação) em que há falta de professores durante a maior parte do ano em vários grupos disciplinares. Nada de relevante foi feito e agora querem soluções “urgentes”, claro que “no interesse dos alunos”. Nesse interesse, sublinhando que a minha petiza já não tem de ter professores de Português contratados em saldos para fingir que teve a disciplina no 12º ano, eu volto a propor que @s mais de 800 director@s se dignem ir dar 5 horitas de aulas (ainda seriam umas 4000 semanais) e os restantes elementos das “equipas directivas” com direito a forte redução de horário (serão, pelo menos, uns 2500) façam o mesmo e assim conseguiremos mais 125.000 horas. Não digam que, com isso, as escolas deixariam de funcionar porque eu quero acreditar que com o cansaço que isso lhes causaria talvez deixassem de inventar “pintelhices” (linguagem à catroga) para os outros fazerem e quase todos ficaríamos mais felizes.