Dia: 20 de Abril, 2022
E Agora, Para Algo Mais Maçudo, Este Mês, No JL Educação
Perante a continuidade na gestão política da Educação, faz pouco sentido apresentar propostas ou conselhos para uma equipa que tem tudo menos novidade, pois o novo ministro é o velho secretário de Estado, que até parecia ter-se despedido de funções executivas nas páginas deste jornal há um par de meses, e o novo secretário de Estado é um antigo quadro de topo da administração educativa. Perante isso, dificilmente serão de esperar novas ideias, mesmo daquelas que se apresentam como tal, sendo coisa mais do que conhecida de outros tempos. O que significa, no meu caso pessoal, uma total ausência de esperança de mudanças no sentido que acho mais apropriado, se queremos que a Educação não volte a velhas práticas de opacidade e auto-congratulação. Portanto, resta ir fazendo a crónica do que temos, na perspectiva de quem não faz parte, nem quer fazer, daquele núcleo de pessoas muito positivas e optimistas que veem sempre o (seu) copo a transbordar.
Desregulação monitorizada
É raro passar uma semana sem que um@ colega me diga que a sua escola vai ter “uma inspecção” e que lá vai ter de ir verificar toda a papelada que os inspectores anunciaram que iriam, naturalmente, inspeccionar. E desde logo é uma azáfama imensa em busca das famigeradsas grelhas que são usadas para registar tudo e mais um par de coisas nas escolas, o que não deixa de ter o seu aspecto caricatural e contraditório, quase esquizofrénico.
Por um lado, temos um discurso sobre a acção das escolas e professores que assenta em termos como “autonomia”, “flexibilidade”, “inovação”, mas depois temos práticas das mais tradicionais quando se trata de ir verificar essas mesmas práticas. Temos a promoção de um pensamento que visa a “formação integral dos alunos”, criticando-se a rigidez das classificações que apenas servem para hierarquizar desempenhos e não é raro que surjam expressões em que se inclui a “perspectiva holística” como a mais adequada para a avaliação dos alunos, mas depois pede-se (leia-se, exige-se) que os professores apresentem registos detalhados e fragmentados até ao detalhe mínimo do desempenho dos alunos e, mais importante, de tudo aquilo que fizeram, pensaram fazer ou certamente fariam ou farão, assim os astros se alinhem na formação certa.
Encontro muitas personalidades a citar António Nóvoa em imensas matérias, incluindo na parte em que critica o excesso burocrático nas escolas, mas vejo muito poucas iniciativas na prática para a reduzir. Assim como observo pessoas ligadas a projectos muito preocupados com a avaliação integral dos alunos, mas que depois querem tudo isso demonstrado em múltiplas “ferramentas” de registo e “monitorização”. O curioso é que em muitas escolas onde essa prática existe, o que transparece da documentação usada não é propriamente uma preocupação com a progressão das aprendizagens dos alunos, mas na obrigação dos docentes registarem o que fizerem para promover essas aprendizagens. O mais curioso ainda é que se os registos forem de “sucesso” e no final as transições de ano e ciclo ficarem asseguradas, está tudo bem e ainda melhor porque se completou o processo de desmontagem de uma avaliação externa do desempenho dos alunos com o desaparecimento das provas finais no Ensino Básico.
Temos uma completa desregulação dos mecanismos de verificação externa das aprendizagens a par de um sempre crescente espartilho burocrático – que agora passou a ser designado por “monitorização” – que obriga os professores a demonstrar que o ónus de qualquer insucesso não é seu.
Um pouco de Ciência, por favor!
Tudo isto tem sido feito com uma fundamentação com teias de aranha, cheiro a bafio e muito pouca base empírica em estudos relacionados com a área da Ciência da Cognição. Por exemplo, as teses construtivistas sobre a necessidade dos alunos irem “descobrindo” o saber e não serem orientados (há quem critique isso como sendo um “método directivo”) no processo de aprendizagem, entram em choque frontal com estudos que destacam o equívoco que é forçar os alunos a refazer o caminho que foi feito antes deles, sendo muito maiores as vantagens de partirem do que já está estabelecido para, com essa informação, irem mais além ou exercerem uma crítica informada sobre esses saberes que lhes são transmitidos. Como escreve Greg Ashman em artigo publicado em 7 de Abril no seu blogue Filling the Pail:
“Os seres humanos são únicos entre as espécies na capacidade de aprender uns com os outros. Muitos animais podem imitar, mas levamos o aprendizado de outros ao nível de uma superpotência. Desenvolvemos sistemas complexos de comunicação para trocar ideias. Os nossos filhos têm uma infância prolongada na qual passam muito tempo a aprender. Em vez de começar do zero, cada indivíduo pode construir sobre o que existiu antes – e é por isso que somos capazes de tais feitos criativos. Nenhum indivíduo, por mais talentoso que seja, poderia começar do zero e inventar os antibióticos, a internet ou um filme de longa-metragem.
Por isso, parece estranho sugerir que não usemos esse poder – e que devemos deixar as crianças lutar e tentar descobrir por si mesmas as coisas.”
Também a crítica à memorização e à repetição enfrenta objecções que estão longe de serem meras opiniões. Por exemplo, sobre a leitura e a compreensão do que é lido, há contributos recentes que enfatizam a necessidade de repetir as mesmas leituras, não no sentido de as tornar mais rápidas, mas de ir extraindo de forma gradual o sentido do que lá se encontra explícito ou implícito (cf. Providing Reading Interventions for Students in Grades 4–9. Educator’s Practice Guide, relatório de Março de 2022 do U. S. Department of Education). E quanto à compreensão do que é lido, é importante que existam conhecimentos prévios que facilitem todo o processo: Como escreve Natalie Wexler, em peça publicada a 9 de Abril da revista Forbes:
“(…) a compreensão da leitura é diferente. Não é apenas um processo de leitura. Está inextricavelmente ligado ao processo de aprendizagem em geral. E os cientistas cognitivos descobriram que o fator chave para aprender novas informações é a quantidade de informações relevantes que já se possui”.
Ainda faltam professores?
Multiplicam-se diagnósticos, projecções, propostas acerca de uma falta de professores que pareceu ser descoberta do nada, com alarme, nos últimos meses. Quem passou anos a dizer que havia professores em excesso (é sempre bom relembrar que até se recomendou especificamente que os professores de Português, um dos grupos mais afectados pela actual escassez, procurassem oportunidades de emprego fora do país), agora surge a reclamar soluções urgentes e rápidas. Que quase sempre indiciam remendos pouco aconselháveis de desregulação do recrutamento e das habilitações para a docência. Fala-se muito em “atrair novos professores”, mas raramente se explica como.
Uma medida que seria de saudar, passaria por garantir aos professores contratados a anualidade da sua colocação com horário completo, mesmo que a necessidade que vão suprir é a de um horário de 14, 16 ou 18 horas. Ou por garantir que quem é contratado para substituir um docente do quadro com atestado de longa duração pode permanecer na escola até final do ano lectivo, para prevenir eventuais necessidades posteriores. Estas medidas são essenciais para reduzir a instabilidade e precariedade do exercício da docência pelos mais jovens.
Complementarmente, esquece-se que estamos perante a quase inevitabilidade de uma ruptura geracional nas salas de professores, porque mais do que a idade limite da aposentação, muitos dos professores dos quadros só conseguirão manter-se a dar aulas mais tempo se as condições em que exercem a sua profissão deixarem de se degradar. Só que algumas propostas que por aí andam são no sentido de lhes pedir ainda mais do que já é pedido. Curiosamente, às lideranças educativas locais, que reclamam mais poder na escolha e recrutamento dos “seus” professores, não tenho ouvido propostas no sentido de prescindir do usufruto de uma parte das horas de redução previstas no “crédito horário” destinado às equipas directivas, cujos elementos leccionam apenas uma ou duas turmas ou mesmo nenhuma no caso dos directores. Num cálculo por defeito, haverá pelo menos 3000 docentes nessa situação; se cada um desses elementos leccionasse pelo menos metade da componente lectiva “normal”, isso significaria um acréscimo mínimo de 5-6 horas semanais. Ainda por defeito, isso significaria o suprimento de 15-18.000 horas semanais, o que equivale a cerca de 500 turmas e mais de 120.000 alunos.
Esta sim, seria uma atitude prática e exemplar em prol do tão evocado “interesse dos alunos”.
Prémio “Latita D’Oiro”
Não foi a única, mas foi a que foi abrindo as portas todas para o descalabro, mas não se lembra, não sabe, não quer saber. Algo anda mesmo muito mal no nosso mundo universitário para termos “reitoras” assim. Verdade se diga que também tivemos “engenheiros” de domingo e outras maravilhas do género.
O Debate De Ontem
Um Bom Retrato Da Forma De Estar Dest@s Senador@s Da Treta Que Nunca Têm A Coragem De Assumir A M€rd@ Que Fizeram
Dá Para Perceber Que “Promessa” Ia A “Reitora” Pagar Com Aqueles Elogios À Acção Magnifica Do Governo?
Dotação centralizada do Ministério das Finanças garante contrapartida nacional a iniciativas que têm apoio comunitário. MCTES tentou, noutras ocasiões, ter verbas dessa rubrica para projectos do sector, mas levou sempre “nega” de João Leão. Quem o diz é o ex-ministro, Manuel Heitor.
4ª Feira
Nunca fui dos que andam a dizer que amam os alunos e que por isso é que coiso e tal. Basta que eles saibam que, hoje pela manhã, antes das 9, sou eu que lá estarei à porta da sala, ao contrário do resto de tod@s @s que falam do que não praticam ou de que fogem mal podem, excepto aquela colega contratada, deslocada em Almada. Tanto amor parece-me por vezes aquele tipo de fé muito profunda, mas tão pouco praticante.