Tem sido muito partilhado hoje este texto de Marília Gago E Filipe Oliveira sobre o ensino da História. Tem algumas questões interessantes, mas não sei se foi alguma limitação de espaço (online, não faria muito sentido), se foi opção dos atores não responder às questões que os próprios colocaram: “porquê” e “para quê” aprender História?Mais complicado, não se percebe exactamente qual é aposição dos autores sobre a redução do tempo atribuído à disciplina de História (parece que tudo depende da “mudança (…) no espaço da sala de aula”) e menos ainda de salas de aula falam, em termos de níveis de ensino. Estão correctos ao afirmar que não existe uma “resposta certa”, mas é de igual modo verdade que é necessário mais do que fazer formulações que todos apoiarão, mas que nada de concreto trazem quanto à implementação das ideias em causa.
Por exemplo, poucos discordarão que:
Ensinar História envolve questões de identidade em diálogo com as culturas, os valores, os olhares acerca do passado e a relação entre passado, presente e futuro – Consciência Histórica. (…) Saber História, ser-se historicamente competente, articula o pensamento histórico e o conhecimento histórico. A História é compreendida através de um processo metacognitivo, é interiorizada pelo indivíduo e assim dão-se passos para a formação de uma Consciência Histórica mais reflexiva.
Mas isto, parecendo dizer muito, porque mobiliza muitos conceitos, acaba por explicar pouco, pois nem define os conceitos, nem como eles se articulam ou, ainda mais importante, de que alunos estamos a falar, com que idades, em que contexto curricular. Porque é muito diferente falarmos de História no 1º ciclo ou no Secundário, com todo o Básico pelo meio.
Por exemplo, o que quer dizer esta passagem (destaques meus)?
oncebe-se o ensino de História com a necessidade de educar historicamente em diálogo com o desenvolvimento humano. Mais importante do que saber conteúdos, é saber pensar de forma disciplinada. Não interessa, apenas, decorar datas, nomes, acontecimentos, etc. O que realmente importa é saber pensar cientificamente (no caso da História, pensar historicamente).
O que é “educar historicamente” ou “pensar historicamente”? Sobre isso poderemos ter uma discussão longa e sem “resposta certa”, mas convém saber do que falamos. Estamos a falar de pensar a vivência e acção humana no passado, em termos de estrutura, de relação sincrónica e a interacção entre as suas várias dimensões? Estamos a falar de relações de causalidade sequencial e, nesse caso, estamos a abordar a relação diacrónica das diferentes facetas dessa mesma vivência? Que unidades espaciais vamos usar para qualquer dessas abordagens? Estas são apenas as questões introdutórias não respondidas ou sequer afloradas pelo texto que se limita a remeter para uma metodologia de “aula-oficina” cujo “modelo” é apresentado como sendo uma proposta de Isabel Barca em 2004 (penso que a remissão será para este artigo), quando esse tipo de trabalho é muito anterior e a própria autora citada tem escritos que abordam a questão desde a segunda metade dos anos 90 do século XX (adaptando parte de um conceito introduzido alguns anos antes) , procedendo a uma síntese das suas ideias, por exemplo aqui e aqui (trabalhos de 2001).Mais recentemente, Isabel Barca foi bem concreta ao explicar as suas concepções a partir da investigação feita nas últimas décadas sobre a cognição histórica, assim como algumas das suas limitações práticas:
Para isso, dentro desta linha alimentada por trabalhos em cognição histórica e inspirada também pela ideia de consciência histórica, propõe-se que a atividade docente tenha em atenção e acompanhe:
- As experiências e ideias prévias dos sujeitos, para auscultar as suas carências na compreensão do passado e ajudar a responder às suas necessidades de orientação temporal;
- A busca de respostas significativas, no saber histórico, às necessidades e carências dos sujeitos sejam estas conscientes ou tácitas;
- O aprofundamento das ideias históricas dos jovens, para melhor os guiar na linha de um pensamento compreensivo e explicativo, fundamentado na evidência, empatia e pessoalmente significativo;
- O reflexo da cultura histórica na vida prática de cada um, a ser desejavelmente orientado numa perspectiva de Humanidade e (dentro de limites moralmente aceitáveis) aberta ao entendimento do outro, num esforço de descentração.
Contudo, deve-se reconhecer que, à partida, não é fácil desenvolver um processo contínuo de ensino e aprendizagem que envolva pensar historicamente. A interpretação das respostas dos alunos no plano do pensamento de segunda ordem é complexa. Como profissionais em ligação com o ensino da história urge, neste aspecto, aprofundar a reflexão
sobre o que implica “pensar historicamente” no ato de ensinar.
O que os autores do texto não fazem é explicar o que implica “pensar historicamente” e, muito em especial, como isso deve ser tratado em cada ciclo de ensino. E se é indiferente fazer esse trabalho uma, duas ou três horas por semana, mesmo se já percebemos que para “pensar historicamente” não consideram relevante ou decisivo conhecer nomes ou acontecimentos, mas sim compreender a História “através de um processo metacognitivo” (ou seja, auto-reflexivo), sem que se perceba a que se aplica o “meta” se a cognição parece ser meramente auto-referencial, o que nem chega bem a ser uma tautologia.
Mas aguarda-se novo texto que aclare exactamente como é que esta abordagem “metacognitiva” se vai aplicar nas “aula-oficina” do 1º ciclo ao Secundário, do Estudo do Meio à História, passando pela “minha” H.G.P.; pode ser o início de um debate interessante mas, por enquanto, sabe mesmo a muito pouco.
Concordo quando dizes que isto é algodão doce.
Anda aqui às voltas, mas não concretiza coisa nenhuma, talvez pela falta de experiência do que é ser “zeco” no terreno e lidar semanalmente com cargas horárias reduzidas ou com semestralidade duvidosa.
Se vires bem a Marília Gago é perita em apresentar conceitos muito pomposos que depois de espremidos…
Finalmente um pormenor.
É estranho apresentar-se frases inteiras que são retiradas de um trabalho já publicado. Um dos autores é o mesmo? Sim é, mas fica a sensação de … recauchutagem.
Click to access Flavio%20Filipe%20Soares%20Oliveira.pdf
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Não fui em busca dos autores, confesso.
Apenas da Isabel Barca, que conheci muito de raspão nos anos 90 e de quem tenho umas coisas dessa altura.
Tudo isto pareceu-me recauchutado, mesmo sem ter dado por esse detalhe.
Enfim… sabe mesmo a pouco e revela, pelos vistos, alguma preguiça.
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Fácil.
Uma das autoras é prof. da UMinho.
O outro autor é professor do básico e secundário e fez o mestrado sob orientação daquela professora.
O artigo é uma síntese do relatório de mestrado em ensino deste último.
Com sorte ainda publicam mais uns “papéis”, numa qualquer revista cientifica, sobre o mesmo assunto.
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Sapiências
E quando as mesmas tolices e vacuidades inundam os cursos “Ensino de…” ?
E quando essas tolices e vacuidades empestam os “cursos” de “ciências” da educação, com os formidáveis conteúdos “avaliados” através de trabalhecos em 15ª mão ?
E quando aquelas e outras tolices e vacuidades são transmitidas – entre gargalhadas alarves – em “cursos” de formação tipo dona ariana?
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Eu “só” vejo aí o desprezo pelos.conteúdos e pelo conhecimento.
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Quase interessante?
Porquê?
Não passa de discurso eduquês, redondo, pescadinha rabo na boca, que se desenvolve num círculo desenhando a partir do próprio umbigo. De tantas voltas dadas em torno de si próprio, torna-se tão inexpugnável quanto desligado da realidade. É um discurso vazio que se basta a si próprio.
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Quase interessante porque, a partir da sua desmontagem, de poderá chegar a qualquer lado diferente e interessante. 😉
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Totalmente de acordo 😎.
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