“Efeitos Assimétricos”?

Será que o ministro Costa (ou que nem nele manda) não consegue esconder a acrimónia contra o pessoal que teve a coragem de levantar a voz em 2008, já estando na carreira? Porque é contra esses que é bem perceptível a vontade de fazer uma discriminação. Mas, afinal, não trabalharam todos? Não foram esses que levaram com as quotas em cima e os novos escalões da treta (como o 5º do índice 235 e o 7º do índice 272). Quem estava mais no início nem aí ainda chegou. Se todos trabalharam, que m€rdd@ de conversa é esta? Mesmo quem está no 10º merece ser compensado, nem que seja para efeitos de aposentação ou então termos uma carreira a várias velocidades, em que a tutela promove activamente ultrapassagens e um tratamento discriminatório dos mais “velhos” com base em “racionais” de vão de escada.

“Efeitos assimétricos” é exactamente o que o ministro Costa pretende provocar com estas suas “opiniões” asininas e de uma desonestidade intelectual que confrange.

O tempo de serviço vai ser um dos temas do novo período negocial entre Ministério da Educação e sindicatos de professores, que deverá iniciar-se no próximo dia 20. A informação foi dada pelo coordenador do Sindicato de Todos os Profissionais da Educação (Stop), André Pestana, à saída da última ronda negocial sobre um novo modelo de recrutamento e de gestão de docentes, que terminou sem acordo.

Como já tinha avançado anteriormente, João Costa terá precisado que as novas negociações não incidirão sobre a recuperação do tempo de serviço congelado para todos os professores, mas sim sobre compensações a atribuir a docentes que tenham sido mais prejudicados durante o congelamento das carreiras. Mais concretamente, confirmou o ministro da Educação no final da reunião, “a correcção dos efeitos assimétricos” gerados durante o descongelamento e que se prendem, essencialmente, com a posição na carreira em que os professores foram apanhados durante a suspensão das progressões.

António José Teixeira E Manuel Carvalho Esqueceram-se Que São Jornalistas?

A dada altura pareceram outra coisa. em especial quando Marcelo Rebelo de Sousa pareceu estar a ser demasiado lógico e razoável na apreciação da luta dos professores, decidiram introduzir daquelas questões que qualquer “livro de estilo” consideraria profundamente tendenciosas, pois foram formuladas com respostas incluídas. Ambos podem ter a opinião que bem entenderem como cidadãos acerca do conflito em decurso, mas estavam numa televisão pública a entrevistar o Presidente da República, não numa sessão de esclarecimento do PS com o ministro Costa. São momentos como aqueles minutos que me fazem desacreditar da lisura deontológica de quem se acha com autoridade para dar lições de moral a quem faz greves que lhes desagradam. Não é que sejam perguntas “incómodas”, mas sim perguntas que demonstram a resposta que se pretende ter de volta. Do género “mas não acha que…”.

Não é por acaso que o jornalismo nacional vive dias maus, por muito que esbraceje contra a maldade das redes sociais. O problema é quando nem existe a preocupação da isenção ou da busca da opinião do entrevistado, sem a querer condicionar desde o início, como se notou. Claro que MRSousa lhes explicou que não existe enquadramento legal para avaliar greves diferentes das tradicionais. Claro que o parecer da PGR já explicou que não existe base factual para falar em ilegalidade, mas em particular Manuel Carvalho pareceu mais interessado em arrancar uma declaração de “ilegalidade” da greve dos professores ao PR do que em ouvir a sua análise. Só não foi mais triste porque, infelizmente, não esperava outra coisa. Já António José Teixeira tende muito a adoptar a cor do ambiente que o envolve nestas coisas, pelo que fez parecido, só que em tons mais esbatidos.

Repito uma ideia: será que em relação aos médicos a atitude será semelhante?

E, por favor, não me venham com conversas de ressentimentos com isto ou aquele, porque se deixei por duas vezes de escrever para o Público foi por vontade própria. Porque não gosto de ficar onde e quando me sinto incomodado com certas atitudes.

Este Mês, No JL/Educação

Texto publicado exactamente 15 anos depois da manifestação de 8-3-8.

Uma Questão de Tempo

Please heed the call

Don’t stand in the doorway

Don’t block up the hall

For he that gets hurt

Will be he who has stalled

The battle outside ragin’

Will soon shake your windows

And rattle your walls

For the times they are a-changin’

(Bob Dylan)

O longo conflito que se desenrola na área da Educação, opondo os professores e a tutela tem um dos seus pontos críticos, de diversas formas, no “tempo”.

Em primeiro lugar, porque uma das mais antigas reivindicações dos professores relaciona-se com o tempo de serviço que prestaram e cuja contabilização lhes tem sido negada, em virtude de duas “idades do gelo” que travaram a sua contagem, a primeira iniciada no dia 30 de Agosto de 2005, prolongando-se até 31 de Dezembro de 2007, e a segunda cobrindo todo o período de 2011 a 2017. Esses dois congelamentos deram o muito citado número de 9 anos, 4 meses e 2 dias.

Desse tempo de serviço “congelado”, foi unilateralmente decidida a reposição de apenas 2 anos, 9 meses e 18 dias de acordo com uma “lógica” peculiar, que se pretendeu justificada em princípios de “equidade” e “justiça”, no que constituiu uma evidente tortura da semântica e um perfeito abuso não apenas da linguagem como da aritmética.

Se não, vejamos: em documento da Direcção Geral da Administração Escolar, datado de 23 de Maio de 2019 (1), que reproduziu a argumentação política então usada, explicava-se que “esta recuperação de tempo respeita ao período de congelamento da carreira entre 01.01.2011 e 31.12.2017”, ignorando por completo que tinha existido um período de congelamento anterior, que assim não entrava para o cálculo feito. Cálculo esse que se baseou numa alegada igualdade de condições entre carreiras, assim explicada num documento oficial do Governo de Portugal do dia 5 de Abril de 2019 (2): “O modelo de recuperação do tempo de serviço é o mesmo: 70% do módulo padrão necessário para progressão em cada carreira ou categoria”.

Ou seja, o tempo não foi recuperado de forma absoluta, mas relativa a um referencial específico de cada carreira, ou seja, trataram-se realidades muito diferentes pela mesma bitola, ao contrário do que ainda recentemente se tem afirmado. Por exemplo, nas carreiras em que os escalões têm 10 anos, os 70% corresponderam à recuperação integral dos 7 anos em que para elas existiu “congelamento”, enquanto que no caso dos professores, cuja carreira se estrutura em módulos quase todos de 4 anos, aqueles 70% ficaram reduzidos a 2 anos, 9 meses e 18 dias. Para além de que o cálculo incidiu, de forma explícita apenas nos anos de 2011-2017 e não em todo o período que realmente durou a paragem da contagem de tempo de serviço para a classe docente.

Tudo isto foi apresentado publicamente como fazendo sentido e sendo “justo”. Passo a citar o dito documento de Abril de 2019, onde se assume que há carreiras que recuperam todo o tempo de serviço congelado, enquanto aos professores isso é negado:

“A quantificação do tempo a reconhecer aos trabalhadores das carreiras especiais da administração pública foi definida com a seguinte lógica: nas carreiras gerais, um módulo padrão de progressão corresponde a 10 pontos que, em regra, são acumulados ao longo de 10 anos. Como tal, os 7 anos de congelamento correspondem a 70% do módulo de progressão de uma carreira geral.”

“no caso dos professores, por exemplo, o módulo de tempo padrão é de 4 anos, pelo que, aplicando o racional dos 70%, se obtém uma recuperação dos 2 anos, 9 meses e 18 dias”.

Porque a recuperação total do tempo “congelado” numas carreiras e a de pouco mais de um terço em outra (mesmo se tivermos em conta apenas o período de 2011 a 2017) se considera resultado de um “racional” e se qualifica como algo equitativo é um mistério por desvendar, mas foram muitas as vozes que o repetiram. Que ainda o repetem, parecendo ter abdicado de reflectir sobre uma situação evidentemente iníqua. Ou então fazendo algo pior que é distorcer os factos de modo consciente. Seja no seu “racional” muito particular, seja na forma como tenta apagar que os docentes já tinham visto o seu tempo de serviço congelado quase 2,5 anos antes de 2011.

O protesto dos professores a este respeito não é irrazoável, não pretende um tratamento de excepção, mas apenas que lhe seja dado o tratamento que foi permitido a outras carreiras: ter recuperado todo o seu tempo de serviço congelado. Sendo que no seu caso, até foi mais longo do que o dessas carreiras, pelo que se todo ele for considerado, o que foi reposto é bastante inferior a um terço. O tratamento discriminatório é evidente, por muito que se tente usar “racionais” sem qualquer tipo de racionalidade.

Quanto ao segundo ponto crítico em que o tempo tem jogado um papel central nesta questão passa pelo modo como o ministério da Educação e o Governo têm feito todos os possíveis por prolongar a disputa, na esperança de conseguir o apoio da opinião pública, através de um processo de demonização das formas de luta dos professores, a começar pelas greves e culminando em algumas organizações sindicais.

Existe um processo negocial em curso, em torno do regime de recrutamento e vinculação dos professores, cujos deméritos não me vão aqui ocupar, que se prolonga há seis meses de forma perfeitamente desnecessária. Tenha sido acordado um calendário prévio ou não, perante os protestos permanentes dos professores, enquadrados por um sindicato ou por uma plataforma de outros sindicatos, aconselharia o mínimo bom senso que se tentasse “mitigar” (palavra agora muito em uso) o tempo usado em negociações desenvolvidas a um ritmo mensal e só mais tarde quinzenal, sendo que em vários momentos, as reuniões entre os representantes do governo e dos sindicatos as iniciaram sem quaisquer propostas concretas, apesar de conferências de imprensa prévias destinadas a transmitir a ideia de que estariam a ser feitas “cedências às exigências dos professores”.

A falsidade deste tipo de afirmações também não é o que aqui me ocupa, mas sim o modo como os governantes decidiram gerir a situação, não hesitando em fomentar a escalada da contestação, ao fazer declarações públicas atentatórias da dignidade de toda uma classe profissional (ao insinuar-se que tudo se deveria a acreditarem em “mentiras” postas a circular em redes sociais e grupos de mensagens), esperando que o prolongamento das greves e manifestações pudesse, nas palavras do presidente da República (declarações a 1 de Fevereiro de 2023), virar a simpatia da opinião pública contra os professores e, ao mesmo tempo, provocar o “esmorecimento” da contestação.

O que não se veio a confirmar, de acordo com todas as mais recentes sondagens feitas a esse respeito. A finalizar Fevereiro, constatou-se que “apesar de afetada pelas greves, maioria defende recuperação do tempo da carreira dos professores” e que uma “sondagem da Aximage para TSF-JN-DN mostra que 92% dos inquiridos defendem a recuperação, embora em grau variável”. (TSF, 25 de Fevereiro de 2023). No mesmo dia, no Público, confirma-se que “professores ganham ao Governo por KO e sindicatos levam nota positiva”.

Têm reivindicações “justas”, são os que mais têm feito para encontrar uma “solução” e registam um melhor desempenho. Sondagem da Católica mostra apoio à causa dos professores”.

Isto significa que o apoio da opinião pública aos professores aumentou desde meados de Janeiro quando “numa sondagem da Intercampus para o jornal Correio da Manhã, 60% dos inquiridos dizem concordar com os protestos e apoiar a “luta” dos professores” (14 de janeiro de 2023). O que demonstra o completo fracasso da aposta do ministro João Costa e do governo na manipulação da opinião pública, com o recurso a algumas intervenções desastradas de responsáveis parentais ou comentadores mediatizados, e na erosão dos protestos, sendo necessário desenvolver uma nunca vista investida contra o direito à greve.

Afinal, o que o tempo veio permitir foi que se demonstrasse a má-fé negocial da tutela, a falta de verdade dos seus argumentos e o modo como truncou ou deturpou muitos dos factos na base do conflito. Por uma vez, o tempo esteve do lado dos professores, até porque desenvolveram sempre a sua contestação com um elevado nível de civismo. Porque sabem que a razão e a justiça estão do seu lado e que o que reclamam nada tem de exagerado nem corresponde a qualquer privilégio. Pelo contrário, apenas reclamam o que é seu e o mesmo que a outros foi garantido.

(1) – – https://www.dgae.medu.pt/download/gestrechumanos/pessoal_docente/carreira/20190523-grh-progr-carreia-faqs-recuperacao-do-tempo.pdf

(2) https://www.portugal.gov.pt/download-ficheiros/ficheiro.aspx?v=%3D%3DBAAAAB%2BLCAAAAAAABAAzN7UwBQCnQDQvBAAAAA%3D%3D

Expectativas Mínimas

A menos que se dê uma grande surpresa na ronda negocial de hoje, a ideia que tenho é que a estratégia do ministro Costa mimetiza a da “reitora”. Encerramento num “quadrado” de intransigência, servido por uma estratégia mediática que passa por falar para o público antes das negociações, ufanando-se de completas efabulações sobre “cedências” e “aproximações”. A RTP tem andado a fazer o jeito e a dar-lhe antena praticamente sem contraditório, o que já seria de esperar, mas é lamentável. A aposta no desgaste da imagem dos professores e no facto de, perante a cascata de manifestações e afins, pouco haver de novo na algibeira da contestação. Pode ser que se engane, como se enganou até agora. Mas é preciso mesmo muita paciência para a desonestidade intelectual (em relação à política já a dou como adquirida) para se dizer o que ele diz, sem ruborizar ou cair-lhe o céu em cima. E é mais do que óbvio que, como com o “engenheiro”, tudo isto tem a cobertura do primeiro Costa, que deve ter como ponto de sua desonra, “ceder” aos professores. Nem que para isso tenha que alimentar mentira sobre mentira.

Quero ver como será com os médicos, que começaram apenas há dois dias a sua greve. Tenho mesmo alguma curiosidade em ver como será a reacção.

Isto Começa Mesmo A Tresandar

Colegas,

Informamos que o formulário que tínhamos concebido e que, a partir de 2f, divulgámos e apelámos ao seu preenchimento das mais variadas formas, foi alvo esta noite de um ataque informático (“golfinho anónimo “).

Os dados da amostragem bem como os 25 itens selecionáveis foram eliminados e, consequentemente, as 2962 respostas dadas até esse momento.

Resta-nos agradecer a vossa colaboração.

Bem-hajam!

Lígia Violas, Alberto Veronesi e Paulo Fazenda