Ver e ouvir o ministro Costa a falar da dádiva que alega estar a dar a “mais de 60.000 professores”, que lhes permitirá “acelerar a progressão” é deprimente. Não sei se é do ar condicionado do ME, mas nem a mudança da 5 de Outubro para as Laranjeiras e agora para a 24 de Julho conseguiu evitar que uma variante de solipsismo e descolamento da realidade atinja quem lá entra e ocupa o lugar. O ar de sonso, assim com as sobrancelhas e pálpebras meio repuxadas para cima, indicia que não é propriamente ignorância que está em causa, mas desonestidade intelectual.
Entretanto, no número 455, de Abril, da revista Proteste da DECO, vem uma inusitada entrevista a Domingos Fernandes, o mentor mais directo do ministro Costa e papá da abelha distópica, recompensado com a presidência do CNE, cargo de forte inutilidade na maior parte do tempo, mas que permite a algumas figuras perorarem sobre os dogmas que fizeram a sua formação há coisa de meio século. Se não fosse ter mais do que fazer, comentaria de forma alongada a entrevista, onde DF se repete e revela até que ponto não pratica o que enuncia, a começar pela tolerância e empatia, que lhe escasseiam de um modo evidente. E a coerência também não é o seu forte, porque se afirma crítico dos rankings, mas depois recorre de forma abundante aos do PISA Para legitimar algumas das suas opiniões. Acontece, muito em especial em mentalidades algo fanáticas, para as quais todo o argumento é bom se der jeito, mas mau se for em forma de contraditório.
Reparem nesta passagem:
O sistema português é muito bom em termos internacionais. Temos é dois problemas: um de qualidade das aprendizagens e outro das desigualdades.
`É muito bom, mas tem problemas gravíssimos.
Um deles é o das aprendizagens, diz ele numa parte, enquanto na outra considera que, afinal, está tudo fantástico. Quando lhe perguntam o que acha das críticas sobre a perda de qualidade do ensino, responde assim:
Tenho dificuldade em perceber isso. Ou damos alguma credibilidade aos dados internacionais, ou não. Os dados do PISA, por exemplo, que avalia as competências de alunos com 15 anos em literacia da matemática, da leitura e científica, indicam que Portugal agora está acima da média da OCDE. Quando começou, em 2000, tinha uma posição bastante modesta, para não dizer medíocre. Se isto significa alguma coisa, e significa, do meu ponto de vista, há uma evolução positiva nas aprendizagens dos alunos.
Eu não tenho problemas em perceber isto. É assim: se for para justificar planos e formações da treta, temos um problema; se for para fazer auto-elogio… estamos fantásticos. Depende da brisa.
Mas a parte melhor é quando lhe é dito que os professores se queixam da burocracia e aí não há qualquer dúvida: entra em cena o “especialista” com uma visão muito peculiar do que “pedagogia”. Pelos vistos, não se manifesta no trabalho em sala de aula, com os alunos, mas nos registos papelentos. Os professores é que se confundem, na sua douta opinião, ao não perceberem o que “se exige a um pedagogo”. A avaliar por ele, muita conversa fiada.
É capaz de haver um excesso de burocracia, mas também penso que haja uma certa confusão com aquilo que se exige a um pedagogo: trabalhar de forma diferente. E isso não é burocracia, é pedagogia.
Já agora… a petição anti-MAIA já conseguiu o apoio de 12.100 pessoas que, claramente, não percebem nada de pedagogia.
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