A reunião do soviete dos jantares prolongou-se muito, quase ao nível de uma do politburo nos anos 60. Eis que amanhece e o Acção Socialista do Norte, também conhecido como Jornal de Notícias, publica uma entrevista com o ministro da Educação em toda a sua sonsice argumentativa, explanada sem que lhe sejam exigidas fundamentações minimamente credíveis do que afirma. Nada de inesperado a esta altura, em que o ministro não fala para os professores mas para a opinião pública e alguma opinião publicada e porque estas entrevistas combinadas, não se fazem para chatear o entrevistado.
Por isso, nem que seja como exercício de contraditório à distância, vamos lá a alguns nacos das declarações daquele que gosta de chamar mentirosos aos outros, enquanto mente, acusando os professores de serem crédulos perante mentiras, enquanto aposta que a opinião pública seja crédula perante as suas mentiras. Lamento, não existe outra forma de colocar as coisas, quando temos de ler e ouvir barbaridades ditas com um ar de muito estudada candura.
Logo a abrir começa por afirmar que “não há nenhum momento na história do sistema educativo em que tenhamos tido um número tão elevado de vinculações como o que vamos ter já este ano”. Ora bem, como alguém que até estudou o sistema educativo português ao logo da História, gostaria que o ministro Costa demonstrasse isso com números e não com enunciações. Esta declaração é equivalente aqueloutra em que se dizia que este é o período em que a carreira docente esteve mais tempo descongelada. Coisas que se dizem, para produzir efeito, mas adequadamente sem qualquer tipo de apresentação de dados rigorosos. Fala-se, picareta-se os miolos alheios com o que que se quer passar como verdade. Mesmo que “vinculem” 10.000 professores aos quadros de zona pedagógica isso não é, de modo algum, comparável á vinculação de docentes a quadros de escola, como ocorria no passado. Ao contrário do que João Costa afirma, existirem 10. 63 ou 150, é indiferente se as regras para o concurso forem as que estão previstas e enquanto os candidatos estiverem numa zona do país e as vagas em outro. E há qzp que ficam iguais (caso aqui do da margem sul), sendo dos que mais professores necessitam, continuando a exigir a deslocação de centenas de quilómetros aos “vinculados”. João costa sabe disso, mas esconde, deturpa ou mente quando afirma que vai reduzir a situação de “casa às costas”, a menos que com isso queira dizer “mudem de casa, agora que os preços estão mesmo bons e os juros um rebuçado”.
Sobre o congelamento do tempo de serviço, as declarações de João Costa roçam o patético. Se não, leia-se e desacredite-se:
Aquilo que foi feito a seguir ao descongelamento das carreiras foi garantir que todos os funcionários públicos tinham o equivalente a 70% de cada módulo de progressão na sua carreira. Se um escalão são 10 anos, isto são 7 anos, se um escalão são 4 anos, como é o caso dos professores, correspondeu a quase 3 anos de recuperação.
O que na prática diz é que a recuperação não respeitou o tempo de serviço congelado, mas teve em conta a duração dos escalões das carreiras. Mas isto não é qualquer justiça, porque implica que se desrespeitaram as carreiras e a uns se deu mais do dobro do tempo do que a outros, sendo que os professores já tinham estado congelados entre o fim de Agosto de 2005 e o final de 2007 e não “apenas” entre 2011 e 2017. Os professores recuperaram 70% de um escalão e não 70% do tempo que lhes foi retirado. Se assim tivesse sido, teriam recuperado quase 7 anos e talvez não estivéssemos na situação actual. O que o ministro Costa diz é que a recuperação foi diferenciada e escalonada, desrespeitando o estatuto das carreiras, nomeadamente da dos professores. Ou seja, as carreiras com escalões mais curtos, mesmo que com progressão salarial menor (a passagem entre os 4º e 8º escalões é de pequenos saltinhos, aos quais foram acrescidas quotas), são mais penalizadas do que as restantes. O ministro Costa se vive nem com isso e lhe chama algo parecido a “justiça” é porque tem um tipo de valores e conceitos claramente diferentes dos meus. O tempo de serviço congelado no caso dos professores foi de quase 9,5 anos e recuperaram menos de 3. Houve quem tivesse 7 anos de congelamento e recuperasse muito mais e é a isso que ele considera correcto.
E depois há uma parte que, desde a primeira vez que a afirmou publicamente me deixou espantado, pela absoluta palermice (penso que é o termo técnico mais adequado a usar) e que“é perceber que uma coisa foi ter apanhado o congelamento das carreiras quando estava na base da carreira, estava no primeiro ou no segundo escalão. Outra coisa foi ter tido a carreira congelada quando estava no sexto, no sétimo ou no oitavo escalão. Em termos remuneratórios, de impacto, de expectativa de progressão na carreira, são situações muito diferenciadas.” Sinceramente, não percebo o que ele quer dizer com isto: a “expectativa de progressão” é/era exactamente a mesma: mudar de escalão ao fim de 4 anos (u de 2, para quem estava no “degrau” do 5º), numa carreira legislada por um ECD da responsabilidade do PS, de que era ministro o actual PM. Sei que João Costa andava a “tlebar” e a tentar “vender” a sua “gramática” ao ensino básico e secundário, pelo que pode não se ter apercebido disso, mas ao fim de mais de 7 anos no governo já poderia ter aprendido qualquer coisinha. Ou, no mínimo, não querer que os outros passem por parvos.
Quem estava no 2º escalão tinha a expectativa de chegar ao 3º e depois ao 4º e assim por diante. Quem estava no 6º de chegar ao 7º, 8º, etc. Curiosamente, quem estava no 8º é que tinha menor “expectativa”, pois só poderia chegar ao 10º, mas ess@s colegas já quase tod@s se aposentaram neste momento. A realidade é que, por exemplo, quem na altura estava no 7º escalão (índice 218) como eu passou a estar no 4º e em vez de ter um horizonte de progressão de 10 anos até ao mítico “topo” passou a ter 22 anos.
Sim, o ECD da “reitora” e do governo onde esteve António Costa “esticou” a carreira a partir do seu primeiro terço por mais uma dúzia de anos, isto antes de qualquer congelamento. Acrescentando o congelamento, houve quem visse a sua “expectativa” acrescida em 20 anos (sim, 20 anos!), enquanto foi desgovernado por gente sem qualquer tipo de pudor em distorcer os factos, enviar dados para a OCDE que permitiram fazer comparações erróneas, ocultando o peso da carga fiscal e o facto de, a dado momento, haver um desfasamento de quase 10 anos entre a posição teórica de um docente na carreira e a real. O ministro Costa oculta isso, mete-se por uns meandros explicativos mistificadores, mas beneficia da ignorância d@s jornalistas que, a bem dizer, também não estão ali para aprofundar as coisas, mas sim para usar expressões como “abrir a caixa de Pandora” numa pergunta, nem necessitando o governante de a usar, tão prestável que é o JN no seu modo de “entrevistar”, em modo de “recepção orientada”. Quando recebe a pergunta, o ministro Costa já tem a resposta meio dada.
Claro que agora, apesar de tantos números adiantados para a comunicação social durante meses e anos é necessário voltar a “fazer contas, estudos de comparabilidade com outras carreiras, estudos de projeção sobre o impacto em números de professores concretos, para depois então podermos apresentar propostas e dizer o que é que conseguimos fazer”.
Isto significa que com tanto estudo e tanta certeza nos números, é necessário fazer novos estudos? Para isso há dinheiro? a quem foram encomendadas as conclusões? Tenho quase a certeza, mas é esperar para confirmar, ao contrário do ministro Costa que fala e muita coisa sem ter a fundamentação factual. E o que quer dizer “projeção sobre o impacto em números de professores concretos,“? O ministro Costa não sabe quantos professores estão em cada escalão e é assim muito complicado avaliar quanto custa a progressão de, por exemplo, 3 ou 6 anos? A sério que não é coisa que se faça em menos de uma semana? Quer que lhe explique como se faz? E o “impacto em núemros de professores concretos” não é, basicamente, em todos os que estiveram em exercício nesses anos? Claro que não se aplica a quem entrou só depois de 2018.
Por agora, vou parar na parte em que o ministro Costa afirma que tem “uma lista de 18 pontos em que o Governo se aproximou dos sindicatos” pois tenho uma ideia muito concreta sobre o que ele pode fazer com essa lista e do impacto que gostaria que isso tivesse na sua futura escolha de cadeiras lá para casa e para o gabinete, mas penso que ficaria mal desenvolver aqui o tema. Quando me passar a “veneta”, tentarei ler o resto do relambório com que o Acção Socialista do Norte, desculpem, Jornal de Notícias nos decidiu mimosear este domingo, só lamentando que entre a equipa da entrevista não tenha estado o seu extraordinário director Barbosa. Porque ficaria tudo ainda mais limpinho, limpinho.
(já agora… que raio de fotografia é aquela a abrir a “entrevista”? foi num corredor das Antes ou do Restelo?)
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