Declaração prévia de interesses: o Matias Alves foi um dos primeiros a convidar-me para escrever fora do Umbigo sobre Educação, na altura para o Correio da Educação das Edições Asa. O outro foi o José Manuel Fernandes para o Público. Nunca, qualquer deles me criou o mínimo obstáculo aos textos enviados. Do JMF já explicitamente discordei fortemente em várias ocasiões. Relativamente ao JMA, apesar de ler muita coisa que me arrepela as sinapses e sensibilidades, em especial desde que abraçou a “municipalização” com as duas mãos, tenho tentado manter alguma reserva, por esse respeito com cerca de 15 anos. Mas há limites, em especial quando a argumentação, mais do que chamar falaciosas às posições de que discorda, é marcada por uma evidente falta de consistência e o recurso a um duplo padrão “moral” na análise das situações.
Eu explico: estamos de volta ao tema da “confiança” nos outros. JMA reserva toda a sua confiança para quem, nas escolas, ele considera líderes “legítimos” e qualifica como “forças de bloqueio” quem se ergue contra a vinculação directa de docentes pelas escolas. Repito uma passagem já abaixo usada, quando JMA afirma que duvidar da transparência e lisura das decisões das actuais lideranças escolares é “a evidência da desconsideração profissional, um atentado à autonomia organizacional e à liberdade de decidir e responder pelos atos que se praticam“.
Mas JMA já não se coíbe de lançar a desconfiança e desconsideração sobre as instituições do ensino superior que formam professores, ou pelo menos sobre algumas, quando escreve que “não é verdade que as classificações profissionais produzidas nas mais diferentes e díspares instituições sejam equivalentes. Uma classificação de 14 na instituição A não tem o mesmo valor que na instituição B”. Algo com que eu posso concordar, assim como concordarei que os processos de selecção de docentes podem ser transparentes em tantas ou mais escolas do que naquelas pnde serão profundamente opacos.
Mas sobre isso JMA não levanta reservas, apenas sobre a “igualdade formal” em que ficam os candidatos à docência com base na classificação académica. Ao que parece, nesse caso, não existe “a evidência da desconsideração profissional, um atentado à autonomia organizacional e à liberdade de decidir e responder pelos atos que se praticam” sobre quem trabalha nessas Universidades e avalia os alunos. Ou melhor, provavelmente as instituições A são boas e as B são más, só sendo pena que não nos diga quais são, porque sempre se poderia ficar a perceber melhor do que fala. Ou de quem fala.
E há ainda por aqui um evidente duplo padrão, que é agravado com uma passagem em que declara que “a existência de um sistema que coloca pessoas que vão cuidar de crianças e adolescentes sem garantir o equilíbrio mental, a capacidade relacional e formativa”.
E isto é algo que me ofende pessoal e profissionalmente, porque eu fui colocado (não propriamente para “cuidar de crianças”) por esse sistema que JMA (que durante muito tempo trabalho no ME e até foi professor no Ensino Secundário, mesmo se no seu currículo oficial isso não surja explicitado) considera que não garantiu o meu equilíbrio mental ou a minha capacidade relacional e formativa para exercer a docência (e não para ser “cuidador de crianças” por muito que a expressão possa comover algumas almas mais fofinhas do que a minha..
Isto é profundamente ofensivo, mas não apenas para mim, como é perfeitamente evidente. Porque a “lama” é atirada de forma indiscriminada neste particular, enquanto quando se fala das lideranças escolares, nada surge sobre a forma como essa escolha é feita e com que (falta de) garantias e (excesso) de intromissões externas ocorre em tantos casos.
Pior que falacioso, o argumentário de JMA é enviesado. Poderia ser lírico, mas duvido que ele desconheça os abusos que andam por aí. Aliás, ele até já escreveu sobre isso, mas agora achou por bem branquear por completo aqueles que apresenta, imaculadamente, como “órgãos legítimos e próprios”. JMA sabe que essa “legitimidade” é altamente contestável e que muita coisa má. Pouco transparente e, em casos que vamos considerar no “limite”, para evitar mais fricções, são de clara irregularidade e abuso.
Lamento, mas até a mim a paciência se esgota. Até porque só gosto da ‘Hallucinaville nos livros.
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