4ª Feira

Começam a generalizar-se as situações informais de tele-trabalho, em especial quando um aluno – ou um pequeno grupo – vai para casa e é preciso assegurar um ensino à distância extra-horário. Quando é coisa temporária fica à conta do “profissionalismo” docente, mas quando se estende no tempo, por serem alunos “de risco” permanente já é outra coisa. Aquelas horas que faltam a certos horários deveriam ser para isto, em vez de se sobrecarregarem os que já estão bem completos com sessões síncronas não previstas em qualquer horário.

Sincronias

Enquanto o pai faz uma formação online sobre Psicologia Positiva (sim, um destes dias ainda me apanham nos escuteiros), a filha descobre que a sua turma aumentou de 26 para 29 alunos do 11º para o 12º ano, enquanto a sala continua com um máximo dos máximos de 30 lugares, mesmo na modalidade ombro com ombro.

Olha para mim a focalizar a parte “positiva” de tudo isto…

Não Consigo Alinhar…

… com aquela atitude apresentada como inevitável em situação de “crise” que postula que todos nos devemos unir, numa frente comum, contra a “ameaça externa” que no presente momento é o “vírus” e a situação de pandemia. Considero de extrema demagogia a tentativa de condicionar qualquer tipo de críticas, como se fosse delito de lesa-majestade criticar esta ou aquela posição/decisão em nome de uma “unidade” que apenas serve para desresponsabilizar quem decide, através da co-responsabilização de todos por tudo e mais alguma coisa. É em situações difíceis que se torna mais importante fazer opções e essas nem sempre são consensuais. E tantas vezes as posições que prevalecem, podendo mesmo colher apoio maioritário, não são necessariamente as mais adequadas e o abafamento das críticas ou a sua qualificação como algo quase anti-patriótico é a negação de uma democracia verdadeira ou, pelo menos, que respeite o direito a discordarmos de quem tem o poder de mando. Estou cansado de quem acha que quem desalinha do discurso oficial normalizado e formatado pela maior denominador comum da vulgaridade só o faz para criar “problemas”. Assim como desgosto de quem acha que existem fórmulas ou soluções únicas para situações complexas, a partir do momento em que o debate em circuito fechado leva a uma dada decisão. situações complexas e com alto grau de imprevisibilidade obrigam a soluções “abertas” e à consideração da necessidade de se inflectirem rumos, sem que com isso venha mal ao mundo, excepto quando antes se afirmou que só podia ser daquela maneira e mais nenhuma. E estou muito farto de quem joga na erosão da memória e na justificação truncada ou desonesta de afirmações e actos praticados apenas com intuitos de oportunidade política ou conveniência pessoal.

Em resumo, estou mesmo sem paciência para a grande e pequena política, nacional ou local, praticada por quem tem escassa vergonha na cara e carácter a roçar a nulidade. Estando convidado a enfiar o barrete quem bem o sentir à medida.

A Dor Das Famílias

Uma leitura honesta do que foi o terceiro período deste ano letivo obriga, contudo, a reconhecer que a experiência foi dolorosa para as famílias e de resultados bastante duvidosos para uma larga maioria dos alunos.

Nada substitui o ensino presencial e a primeira boa notícia, nos anúncios de ontem em relação ao próximo ano escolar, é António Costa e Tiago Brandão Rodrigues reconhecerem isso mesmo. 

Onde se lê “nada substitui o ensino presencial”, no contexto de algumas prosas, poderia ler-se “não há [pi-pi] que aguente ter a petizada em casa a mexer-nos no computador a toda a hora e a fazer perguntas e a interromper-nos”.

Muito do que se lê está correcto, mas… o pessoal sabe onde e a quem doeu mais.

ChorarChorarChorarChorar

A Razão É A Mesma

Há uns anos praticamente parei de publicar fotos com repastos, iguarias e petiscos diversos do meu trajecto gastronómico. Porque, depois de variadas críticas iniciais (umas benignas e bem dispostas, outras nem tanto), reparei que grande parte das pessoas começara a fazer algo parecido, aderindo intensamente ao food porn, desaguando nas recentes e raramente agradáveis fotos de coisas que passam por ser pães (e derivados) de produção artesanal, que um mínimo de bom gosto deveria desaconselhar publicitação.

Agora, é aquela coisa de se dizer que o E@D falhou e que não se pode repetir tal como aconteceu nos últimos meses. Como desde a segunda quinzena de Março que fui escrevendo sobre as limitações de um “modelo” que não era mais do que um desenrascanço que deixava muita gente de fora, sinto-me agora mal acompanhado por algumas das pessoas que então me criticaram, embora nem sempre com a coragem da frontalidade (falo, claro e a título exemplificativo da flexibilidade vertebral, do doutor saudável, sem vinagre). E também noto que algumas críticas não são propriamente benignas, no sentido de se criarem bases sólidas para uma futura situação de crise (mantenha-se a actual ou surja nova), mas sim de evitarem passar pelo “inferno” de ser professores com 1, 2, 3 ou mesmo 4-5 crianças (são opções parentais, que parecem só se assumir até certo ponto) em casa.

O E@D foi uma espécie de coisa que aconteceu e de que muitos dos promotores andam agora a dizer coisas que outros escreveram meses antes, por perceberem em que terreno andamos e não aderirem à teoria das nuvens alvas em céus límpidos. Por isso, acho que vou deixar de dizer tão mal do ensino remoto porque (basta ver boa parte das ligações que o Livresco me envia sobre o tema) ainda posso ser confundido com alguns vira-casacões.

CatAlice

Três Meses Para Abrirem Os Olhos?

Estive a ver a peça na RTP1 sobre o que tem sido este ensino à distância desde meados de Março. Uma peça bem construída, com testemunhos interessantes do lado dos alunos e famílias. Sem alguns dos habituais “cromos da bola” a debitar prognósticos. Não sei se opção (acertada) editorial, se há quem ainda tenha um restinho de vergonha na cara quanto ao que andou a dizer e escrever durante a maior parte deste tempo. Parece que houve muita gente a “abrir os olhos”, mas isso não me espanta, pois sou dos que há anos se farta de dizer que a Educação é governada, não por sonhadores, mas por sonâmbulos. Ou funâmbulos. Ou as duas coisas.

(claro que me apetecia uma adjectivação mais contundente, mas não adianta, há cabeças bem piores que pedra dura…)

Tudo o que agora se constata, era perfeitamente previsível para quem conheça a realidade da maior parte das populações escolares do país. Claro que era necessário fazer qualquer coisa e claro que se deveria apresentar as coisas de uma forma relativamente positiva. Mas houve claro delírios demagógicos e muita asneira a sair como se fossem pérolas dadas a nós, povo comum e cépticos. Por estes dias, já quase toda a gente fala em “remendo” para caracterizar o que se tem vivido.

Agora anunciam-se 400 milhões de euros para a “Escola Digital”, o que equivale a obras em 25 escolas da Parque Escolar nos tempos áureos. Parece muito dinheiro? Não é. Não chega nem para tapar os pés frios, quanto mais chegar ao tronco e à cabeça. Se nem chega para 6 meses de prejuízos de um banco bom, acham que chega para perto de milhão e meio de alunos, professores e pessoal não docente das escolas?

O ME respondeu por escrito com aquela vacuidade típica dos comunicados rotineiros. O ministro Tiago não sabe, a secretária é amadora nisto e o secretário João sabe quando ficar na sombra. Fala.-se em diversos cenários, conforme a “situação epidemiológica”. Claro. Nem poderia ser de outra forma. Mas será que alguns dos cenários tem pés e cabeça? Mesmo se arrancar tudo em presencial e assim continuar em ritmo de “recuperação das aprendizagens”? Claro que andará, mas muito devagarinho e às apalpadelas.

No meio de tudo isto, termos ainda a cereja de perceber que, afinal, a “flexibilidade” só desajudou. Falta essa “abertura de olhos”, mas é complicada por é filha de pais extremosos. E o que dizer da “inclusão” em termos de pandemia? Nada menos do que um desastre, sendo que os progenitores do 54 não conseguiram, em três meses, dar um contributo público capaz sobre o tema e muito menos apresentar um plano de acção consequente para minorar as dificuldades dos mais necessitados de apoio de proximidade. Neste caso, tenho muitas dúvidas que exista a humildade de reconhecer a necessidade de “abrir os olhos”.

A pandemia teve muitas consequências. Uma delas foi perceber-se (quem o quer, claro) que a retórica dos últimos anos, em termos de Educação, não aguenta um abanão a sério. O castelo de cartas desmorona-se em semanas.

O próximo ano é uma incógnita e só pode ser encarado com uma mente aberta perante a realidade e os seus “problemas”. Porque em Educação, as “soluções” só o são se resolverem os problemas reais dos envolvidos. Não servem para nada quando são construídas no vazio. Ou para satisfazer vaidades.

sheldon-throwspapers

(só foi pena não terem incluído um naco do Preço Certo de sábado… foi, realmente, um programa de antologia… para quando com outros tele-profissionais?)

 

A Questão Da Fiabilidade

How to Prevent Contract Cheating in Remote Learning

(…)

Remote learning is a powerful platform for learning under many circumstances, affording increased flexibility for students with challenging schedules, access anywhere and anytime, and yes, access during a pandemic.

However, when undertaken under emergency circumstances such as the COVID-19 pandemic, the transition to remote learning can be stressful. And when students are stressed, lack connection to learning and to their teachers, and are struggling, they are more tempted to take short cut solutions like cheating (Park et al, 2013).

Paranoia about cheating is making online education terrible for everyone

A sudden switch to online learning reveals a slew of challenges for educators.

Batota

Um Desabafo

(…)

Acabei de ter um CT do 9ºAno, e que quis deixar a mensagem abaixo transcrita, para salvaguardar tod@s os/as professores(as) dos hipotéticos recursos no Conselho Pedagógico ou na DGAE, mas a DT desse 9ºAno, mais o secretário da reunião e outra professora, fizeram muita pressão, para que a não deixasse a minha opinião registada em ata. Alegavam que só vão para a Ata opiniões gerais. Relembrei que estamos em democracia, e que a Constituição garante-me expressar a minha opinião. Os compadrios instalados entre pares e quem está mais afeiçoado à Direção e ao CP, até porque há que garantir boas turmas, bons horários, boas classificações para a subida de escalão!
 
Desculpe os desabafos. se ainda tiver energia, continue até ao fim,…

Deixei na Ata de um  9ºAno o seguinte:

O professor de História: “Na minha modesta opinião, se o Conselho Pedagógico não definiu com absoluto rigor, como vai ser a avaliação/classificação deste Terceiro Período, no quadro do Ensino à Distância, como vai analisar com todo o rigor, justiça, equidade, os hipotéticos recursos interpostos pelos encarregados de educação?

Alunos que no 8º e 9º Ano (até ao 2º Período) tiveram nível 3, e agora, nas tarefas que resolvem no Teams ou noutras plataformas/ferramentas, tiram 95% ou 99%? Quando os alunos comunicam em chats, WhatsApp, et cetera, e obtêm excelentes resultados, quem nos vai defender nos Conselhos Pedagógicos?

Nós, os professores, somos os elos mais fracos e estamos a preparar o caminho para sermos humilhados pelos próprios pares (sim, aqueles colegas que nos nossos Agrupamentos/Escolas não gostam de nós) e que em teoria, até podem incentivar outros encarregados de educação de quem são amigos, a interpor recurso(s), para deixar o colega mal visto!

A exigir reflexão/ação urgente!

(…)

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Dia 67 – Não Chegam Rótulos

O ministro da Educação deu uma entrevista há um par de dias em que disse muitas coisas óbvias, mas muito pouco de concreto sobre o próximo ano lectivo. Afirmar que temos de avaliar “ tudo aquilo que não foi consolidado ou tão bem ensinado” ou que “a recuperação das aprendizagens tem de ser um dos pilares fundamentais no regresso às aulas” são evidências que se impõem desde dia 16 de Março. Por acaso, ao ministro faltou falar no que não terá sido “aprendido”, pois só referiu “consolidado” ou “ensinado”, o que é redutor.

Por outro lado, também é evidente que temos de nos preparar para vários cenários, pelo que quando afirma que “temos de nos preparar para uma conjugação entre ensino à distância e presencial” é como dizer que temos de nos preparar para a possibilidade de sol ou chuva, frio ou calor, vento ou calmaria. Sim, temos de nos preparar para quase todas as eventualidades perante a incerteza que nos rodeia.

Por isso mesmo é que é tão importante uma avaliação rigorosa, desapaixonada e não política ou demagógica do que se está passar durante estes meses. É fulcral que a análise do que se está a viver seja feita com rigor e não numa modalidade de ficção embelezada para efeitos de aproveitamento político. É tempo de ter a coragem de não se encomendarem estudos para gastar verba com cliques académicas que já sabem que conclusões devem tirar logo que conhecem o caderno de encargos. É muito importante que, já que se tornaram os quase exclusivos representantes das “escolas”, os directores optem por não querer apenas ficar bem na fotografia ou nas graças do poder, à espera de não comprometerem o futuro. E é decisivo que os encarregados de educação não oscilem entre o mais completo colaboracionismo sejam com quem for (através dos “parceiros” oficiais para estas matérias) e a reclamação descabelada e excessivamente emocional.

Porque já se percebeu que o ministro da Educação se aprendeu algo nestes anos foi a entrar no “jogo político” e a enunciar fórmulas vagas e números sem grande sustentação. Quando, na mesma entrevista, declara que se afirmou “dos cerca de 1,2 milhões de alunos, 50 mil não teriam acesso a computador ou meios de acesso, o que acontece é que esse número foi sendo reduzido”, percebe-se que ou descolou da realidade ou está a mistificar a opinião pública. Os estudos disponíveis indicavam-nos, de forma consistente, no início da pandemia, que cerca de 20% das famílias não estavam em condições de assegurar aos alunos condições para um ensino à distância em condições mínimas. Se é verdade que as autarquias (mais do que umas parcerias privadas que surgiram para consumo mediático) fizerem em certas regiões um trabalho muito meritório na aquisição e fornecimento de equipamentos, isso terá dado quase só para compensar o crescimento das bolsas de pobreza que resultaram dos despedimentos e quebra de rendimentos. A maior parte dos testemunhos indica-nos que, neste momento, o ensino remoto não passa de um remendo, que a “telescola” é um complemento muito fraco em termos pedagógicos, pois a partir do 1º ciclo são “aulas” tradicionais em que se tenta dar matéria a rodos em meia hora, e que o número de alunos “desaparecidos” ou “intermitentes” aumentou em relação às aulas presenciais.

Seria bom que tudo isso fosse avaliado, antes de nos quererem fazer acreditar que é possível, a começar pelo Ensino Básico, implementar um modelo credível de blended learning.

diario