Tantos Títulos Que Me Ocorreram

O primeiro, mais natural e óbvio, foi “A culpa é do professor!”. Porque só pode… se um@ alun@ a terminar o 6.º ano de HGP se sai com uma destas a culpa só pode ser do medíocre ensinante.

Seguiu-se “Recuperar o quê?”, pois isto trata-se de uma actividade para “recuperação” (a pedido dos alunos, atendendo aos resultados na avaliação sumativa) ou consolidação das aprendizagens ou algo a querer passar por isso.

Também pensei em algo mais pós-moderno e flexível, do tipo “A temporalidade é muito relativa”. E é bem verdade que o Einstein não discordaria.

“O Afonso Henriques é intemporal/atemporal/transtemporal” vai igualmente bem e até apela a uma concepção holística da História.

Ia ficando com “Mais vale rir, que chorar não paga dívidas e ainda gasta lenços…”, mas fiquei como o o outro na autoavaliação… já nem sei o que sei, se é que sei alguma coisa, até porque o saber é relativo (como o tempo), contextual, local e prisioneiro de paradigmas que limitam a imaginação e a criatividade.

Abriu Oficialmente A Época Dos Santos Milgreiros

Vulgo… época de avaliações de final de ano. Aquelas em que da pedra se faz pão, do deserto mais inóspito brota água fresquinha, do vazio aparece matéria cintilante e, em resumo, de vários meses de displicência, razoável irresponsabilidade e, para encurtar, evidente gozo, nasce um sucesso educativo sem igual, a merecer estudo internacional congratulatório e muitas palmadinhas nas próprias costas dos Santos Maiores deste Arraial.

Haverá sempre que me acuse de rigorismo anacrónico, de tentação docimológica, de falta de sensibilidade e tudo o mais, quiçá mesmo de caricaturar uma realidade, quando lhe retiro os traços mais a grosso. Haverá mesmo alguém, a começar por mim, a apontar que há pecados que identifico mas que também cometi e cometerei, sendo outras vezes cúmplice por quase omissão. Mas não consigo resistir a escrever, mais uma vez, sobre o modo como tant@s e tant@s professor@s se revelam taumaturgos e transformam a chaga em pele sedosa.

Há toda uma tipologia, desde os sonsos-mirins (aqueles a quem o costismo embalou como cântico celestial) aos proto-ditadores (a quem o rodriguismo “empoderou” e o costismo deu lugar fixo nas cliques dos poderes locais), passando por imensas variantes, sendo inútil o esforço por ser exaustivo, a menos que se aqueira arriscar exaustão forte.

Mas podem sempre retratar-se alguns comportamentos, que há quem ache que são argumentos, naquela perseguição do “sucesso” a qualquer custo, considerando-se que o insucesso é sempre culpa de quem o não garante a quem tem esse direito inscrito na pedra desde os 11 Mandamentos e em papel impresso desde a primeira Bíblia do Gutenberg, as 96 teses do Lutero e a Declaração dos Direitos do Petiz e do Cidadão.

Vejam lá se reconhecem.

Fala de DT (ou de alguém no CT que desempenha esta função de tipo passivo-agressivo):

‘O Manelinho tem sete níveis inferiores a três… isto não pode ser, @s colegas tinham de utilizar todas as ferramentas e intrumentos ao vosso dispôr no 54 para que o aluno conseguisse as desenvolver as suas aprendizagens’

‘Mas utilizámos!’

‘A sério? Universais, selectivas e adicionais?’

‘Sim.’

‘E vice-versa?’

”E vice-versa!’

‘E registaram tudo nas grelhas de observação, monitorização e avaliação, formativa, sumativa ou outra?’

‘Sim, registámos!’

‘E adaptaram os vossos instrumentos de avaliação, formativos, sumativos ou outros?’

‘Adaptámos!’

‘E diferenciaram a avaliação, desdobrando por domínios, ponderando as diversas rubricas?’

‘Diferenciámos, desdobrámos e ponderámos!’

‘Mas fizeram tudo isso, atendendo ao PASEO, numa perspectiva holística, aplicando uma visão humanística e inclusiva?’

‘Sim, claro… como nos mandaram, atendemos, perspectivámos, aplicámos e incluímos!’

‘Tiveram em conta que morreu um periquito de estimação ao vizinho da frente do Manelinho, quando ele tinha três anos e ele nunca mais conseguiu encarar a vida da mesma forma?’

Mas o que é que isso tem a ver, desculpe, colega… tivemos duplamente em conta!’

‘Têm a certeza… porque me parece que se fizeram tudo isso, seria impossível o Manelinho estar em risco de chumbar, chumbar, não, caraças, ficar retido…’vai de retro, que até me custa dizer isto…

‘Mas é que o Manelinho não veio quase a aula nenhuma e quando veio, fartou-se de gozar com os colegas e com a maioria d@s professor@s, nem se sentava no lugar e ficava sempre agarrado ao telemóvel a fazer apostas, com o registo do irmão que já tem 20 anos.’

‘Se não veio às aulas é porque não o souberam motivar e seduzir… a culpa não pode ser dele. Tentaram flipar a sala, digo, inverter a sala de aula?’

‘Ahhhh… ele invertia sempre as aulas … ficava do lado de fora ou saía pouco depois de entrar…’

‘É porque os colegas não a inverteram o suficiente, está visto… ou passam tudo a nível três ou isto vai a Pedagógico e temos de reunir outra vez… é isso que querem?’

‘Se tiver de ser…’

‘Ia-me esquecendo… e que turmas e horário querem ter para o ano?’

‘Passa já tudo a três e não se fala mais nisso, que o Manelinho, visto da janela até parecia bom moço e cheio de “potencial” e pronto a ajudar os colegas com aqueles calorosos empurrões para atravessarem o pátio e tudo… pensando bem, deveríamos incluí-lo no Quadro de Mérito, se isso não fosse uma prática selectiva e discriminatória.’

Winsor McCay, Little Nemo in Slumberland

Próximo retrato: O RECURSO!!!

“Professor, O Que Quer Dizer Com ‘Lado Direito’?”

Confesso que uso esta imagem há algum tempo (é de um manual de 6º ano de HGP, já com uns bons anos), mas só este ano tive direito (literalmente), em todas as turmas que fizeram hoje a ficha de final de período, à pergunta acima. Parece que o facto da imagem estar do lado esquerdo da questão, perturba a percepção da distribuição espacial das “personalidades”.

O outro problema foi a expressão “identifica a personalidade”.

Basicamente, tudo foi um problema, mesmo se imagem e questão estavam numa ficha formativa feita há umas semanas, que levaram corrigida no própria dia, para casa.

Fora o resto que amanhã talvez partilhe.,