Já Agora… Um Texto de 2012

Publicado no nº 2 da XXI – Ter Opinião, revista da FFMS. a propósito da composição muito “económica” e pretensamente “liberal” do novo executivo, assim como da tentação de aplicar as práticas do “mundo empresarial” aos serviços públicos e à deriva no sentido da sua privatização.

É a versão original, enviada para publiação, porque a revista não está disponível online.

Foi nos tempos da troika, quando muita gente voava baixinho e muita outra nem sequer de metia nestas confusões. Ao mesmo tempo, ajuda a explicar algum tédio com que encaro certos temas, a cujo regresso é intelectualmente penoso, pelo efeito de repetição.

Este Mês, No JL/Educação

Sem recurso à IA ou ao ChatGBT, como se nota, tantas vezes, pela minha crescente disortografia digital.

Ainda não consegui achar cópia em papel, que a distribuição cada vez anda mais fraca. Parece que enviei com redundância na citação inicial, provando o que acima afirmo, mas que aqui já corrigi.

O preço é muito alto

Atribui-se a Benjamin Franklin o aforismo, retomado por muita gente, que diz algo como “se a educação é cara, experimentem o preço da ignorância”. A sua aplicação é variada, mas poderíamos pensar que teve uma demonstração bastante evidente nas eleições do passado dia 10 de Março.

Já a Aristóteles deve-se outra citação muito glosada: “as raízes da educação são amargas, mas os seus frutos são doces”. São lugares-comuns, frases feitas, havendo para todos os gostos, um pouco como os ditos populares e provérbios, que podemos encontrar a dizer algo e o seu contrário. Mas, apesar disso, tal como nos provérbios, existe nessas frases um pouco mais do que apenas um aforismo sem substância.

É bem verdade que a ignorância pode servir para uma poupança imediata, mas só serve a quem quer uma população domesticada, por falta das ferramentas intelectuais para se emancipar de forma mais rápida e eficaz, assim como uma Educação instrumentalizada pode condicionar o pensamento das novas gerações, tornando-as mais dóceis à manipulação. O que nem sempre se consegue prever é que os custos da falta de conhecimento ou de uma Educação truncada podem ser devastadores a médio ou longo prazo.

Entre nós, embora num movimento partilhado com outras sociedades ocidentais que confundem a “modernização” e a “tolerância” com o desprezo pela herança cultural da Humanidade e gostam de a relativizar, acusando-a de ser eurocêntrica, começam a notar-se as consequências dramáticas de um conjunto de políticas educativas que menorizam o Conhecimento, nomeadamente as Humanidades, em favor de um saber tecnológico meramente instrumental.

Não adianta fazerem-se declarações pomposas em preâmbulos de decretos, “referenciais” ou mesmo “perfis”, se depois se substitui a Filosofia pela Educação Rodoviária ou a História pelo Empreendedorismo nos anos de formação dos futuros cidadãos. Se são minguadas as horas para as Ciências, enquanto se considera que deve ser reservado um crescente tempo para temas de relevância circunstancial; quando em vez de se investir em laboratórios para o ensino experimental, se acha que devem ser aplicadas verbas em bicicletas, sem que existam pistas para as usar nas escolas.

A menorização do pensamento abstrato e da capacidade de reflexão sobre temas com alcance universal, em favor do “concreto” e do “local”, reduzem de um modo crítico a capacidade dos cidadãos em formação, dos futuros eleitores, e cortam-lhes os horizontes, em especial dos que menos capital (económico e cultural) têm para escapar ao espartilho de uma Educação (Pública) reduzida ao “essencial” e mascarada com um “sucesso” de fachada.

O meu colega Paulo Prudêncio, em texto divulgado no Público em 28 de Dezembro de 2023 (“E eis que se apresentam os novos eleitores”), fez a análise da ligação entre a ascensão dos fenómenos populistas de extrema-direita e um eleitorado jovem, criado e educado num contexto que eu classificaria de desinvestimento no Conhecimento e de “Deseducação”. Ou de “descerebração programada” nas palavras de Jean-Noël Robert (De L’Ecole Ou La Deseducation Nationale, 2017).

Passo a citar, de forma extensa, o texto do Paulo Prudêncio:

“ (…) os novos eleitores portugueses não cresceram apenas num clima escolar autocrático e extractivo. A própria sociedade viveu tragédias bélicas, climáticas e migratórias e crises políticas, económicas, pandémicas e inflacionárias. E enquanto o mundo do trabalho associava à instabilidade profissional e financeira a sociedade do cansaço, a política mainstream tudo fazia para se descredibilizar.

Por outro lado, os jovens habitam um ambiente digital com as categorias integradas – socialização, informação, entretenimento, politização e influenciadores – expostas à falta de esperança, que é, depois, usada na gramática eleitoral. O voto dos jovens na extrema-direita será também um protesto, mas com o risco de se entranhar como uma convicção.

Em suma, vive-se uma encruzilhada dramática devido a anos de interrupção da pedagogia democrática; e teima-se nos erros. Do ponto de vista educativo, recupere-se a escola da democracia, da razão e da ciência.”

A este diagnóstico eu acrescentaria as já referidas tendências transnacionais que se instalaram na governação da Educação e que combinaram a erosão do modelo democrático de funcionamento das escolas a um currículo esquelético e no qual disciplinas essenciais para a formação dos futuros cidadãos eleitores foram secundarizadas, amputando-se de forma drástica os seus conteúdos.

Nas eleições de 10 de Março, verificou-se como a amputação da Memória Colectiva e a degradação da transmissão geracional do Conhecimento sobre o passado, mais ou menos recente podem ter efeitos desastrosos.

De acordo com um estudo coordenado por Pedro Magalhães, o eleitorado do partido Chega é o que apresenta o nível mais baixo de frequência universitária (22%, contra 28% do PS e 29% da CDU) e o terceiro com maior peso de eleitores que não completaram o Ensino Secundário (24%, contra 32% da CDU e 35% do PS). O que significa que é, de longe, aquele que tem na sua composição mais votantes apenas com o Ensino Secundário (55%), muito acima do PAN (47%), da CDU (39%) ou da Iniciativa Liberal (38%).

Se cruzarmos isso com o perfil etário dos eleitores, podemos concluir que o eleitorado jovem, apenas com estudos secundários, é mais permeável do que o mais velho à atracção pelo voto numa organização política com fortes elementos securitários, de xenofobia, intolerância cultural e radicalismo político, para não estender mais a caracterização.

O mesmo investigador já alertava, na sequência do seu estudo Bases sociais das intenções de voto em 2023, em declarações ao Diário de Notícias (“Jovens eleitores oscilam entre a “atração pelo abismo” e a abstenção”, 18 de Janeiro de 2024) para este fenómeno, sugerindo que “a probabilidade de tencionar votar Chega diminui com a idade” e explicando que isso poderá dever-se ao facto dos mais jovens “não terem desenvolvido ideologias e afinidades psicológicas com os partidos existentes, estando mais disponíveis para optar por partidos de origem mais recente, novos, tais como os da direita radical”.

Fonte: https://www.pedro-magalhaes.org/bases-sociais-2023/

Para além da idade, a intenção de voto também se relaciona “com o facto de viverem em situações económicas mais desfavoráveis e incertas do que as anteriores gerações, com grande competição pela entrada no mercado de trabalho, que os faria tomar opções que expressam descontentamento e insatisfação com o status quo”.

Ainda de acordo com o estudo de Pedro Magalhães, o peso dos “jovens” (18-34 anos) nos votantes no Chega é bem menor do que no Livre ou IL (32% contra 44% ou 49%, respectivamente), mas não sabemos ainda como é a proporção entre o segmento dos 18 aos 25 anos, por exemplo. O que significa que jovens, pouco escolarizados, em contextos desfavorecidos tendem a optar pelo voto de protesto numa Direita radical populista, enquanto outras gerações o canalizavam para partidos da Esquerda tradicional, como o PCP, ou que jovens com maior escolarização encaminham, à esquerda, para o Livre (64% de eleitores com estudos universitários) ou, à direita, para a IL (56% com o ensino superior).

Estas tendências entre os jovens eleitores representam o fracasso de uma Educação que se pretende promotora da tolerância, do respeito pela diferença e pela solidariedade, em certa medida porque o esvaziamento curricular de matérias tidas como “arcaicas” (o desaparecimento quase total do confronto entre a democracia ateniense e a oligarquia espartana, assim como da fase republicana da Roma Antiga), deixa os jovens sem ferramentas intelectuais para compreenderem melhor as opções políticas que lhes são apresentadas no imediato, em especial quando o presente se percepciona como ameaçador. O mesmo se diga da forma passageira como agora se aborda o confronto entre ditaduras e democracias no século XX.

A afirmação de uma “Escola/Educação Inclusiva” tem sido uma narrativa retórica e legislativa, porque às práticas indispensáveis para a sua implementação em profundidade têm faltado os meios que têm sobrado em pretensas “formações” sobre o tema. De igual modo, de pouco adianta falar numa Educação para a Democracia, se o funcionamento da instituição escolar é a sua negação e os alunos percebem todos os dias o desrespeito dos políticos para com os seus professores e a relativização da noção de mérito e de responsabilização pelo próprio desempenho.

Sim, o preço da ignorância pode ser muito elevado. E a conta já chegou.

Secção De Dúvidas – 2

Há propostas que ganhariam muito em serem claras e fundamentadas na sua formulação e, já que são “unanimes”, que sejam revistas antes de serem apresentadas, pois corre-se o risco de se andar a debater assuntos em cima de enunciações sem demonstração empírica. Há alguns dias já apresentei os dois primeiros pontos de uma proposta de reorganização da matriz curricular que parece ter sido escrita com alguma pressa e muito “achismo” pelo meio, independentemente da ideia base ser mais ou menos positiva.

Só que, ao ler-se aquilo, confesso que esbarro com alguma “densidade sintática” (em especial no ponto 5, algo impermeável, quero dizer, impenetrável), inveramente proporcional à densidade substantiva. Passo aos pontos 5 e 6 porque os pontos 3 e 4 merecem análise isolada.

5 – Foi demonstrado por muitos encarregados de educação a preocupação, em os alunos terem em geral 3 tardes ocupadas, e limitar o estudo autónomo e responsável feito em casa.
6 – Num âmbito mais organizativo, mas igualmente benéfico está a melhoria da reorganização curricular, permitindo que as disciplinas com carga horária de dois tempos por semana, consigam abranger um maior número de turmas por manhã sem necessidade de dividir os blocos de 2 tempos em dias diferentes, fator igualmente negativo já verificado por alunos e professores.

Antes de mais, nesta proposta apresentam-se alguns dados que comprovem o “foi demonstrado por muitos encarregados de educação”? Onde se pode isso encontrar, quantos foram e em que termos? E terão sido “estimulados” a tomar essa posição ou lembraram-se de repente? É que me dizem que praticamente nenhum@ director@ de turma ouviu isso nas reuniões realizadas.

Consta mesmo que existem queixas recorrentes (casas de banho, refeições, comportamentos), mas esta das tardes ocupadas limitaresm “o estudo autónomo e responsável feito em casa” é uma espécie de miragem que pouc@s terão ouvido. Aliás, o que é comum é ouvir queixas no sentido contrário, do trabalho ser feito prioritariamente na escola, até tendo em conta as circunstâncias de disponibilidade de tempo das famílias de muit@s alun@s. Outra coisa, serão as conversas com responsáveis por negócios de ATL.

Já o ponto 6, mais do que impenetrável é um exercício que ganharia com a demonstração do que baseia a afirmação relativa ao “fator negativo já verificado por alunos e professores”. Onde? Como? quem? Em que termos? Há alguma documentação que demonstre isso? Foi feito algum inquérito a “alunos e professores” sobre tal matéria”? Ou é apenas porque dá um certo jeito a quem propõe e não terá, por diversas razões, de ter turmas durante seis tempos lectivos de 50 minutos em sala de aula?

Já agora… o que é determinado no Despacho Normativo n.º 10-B/2018 (anterior à pandemia, mas ainda em vigor, retomando o que já antes existia) é que deve existir a “distribuição dos tempos letivos, assegurando a concentração máxima das atividades da turma num só turno do dia;” (artigo 13.º, n.º 1 alínea b) não referindo qual o turno, se da manhã ou de tarde, até porque a necessidade de usar racionalmente os espaços desaconcelha a concentração de um grande número de turmas no mesmo turno e recomenda a sua distribuição pelos dois turnos.

Já que gosto de embirrar com ele de vez em quando, vou aqui recorrer aos critérios gerais para a elaboração de horários na Secundária Eça de Queirós, da Póvoa do Varzim, do anterior presidente do Conselho de Escolas, José Eduardo Lemos:

16. Nenhuma turma poderá ter mais do que 5 tempos letivos consecutivos nem menos de dois tempos em cada turno;

Passemos ao caso do Agrupamento de Escolas Ferreira de Castro, dirigido pelo actual presidente do Conselho de Escolas, no qual os alunos, no turno da manhã, permanecem menos de 5 horas.

8. O início das aulas de todas as turmas dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e do ensino secundário, incluindo os cursos profissionais será às 08h30m. A conclusão do período da manhã depende da distribuição da carga horária e da gestão dos almoços na cantina. Será possível terminar o turno da manhã às 11h45, às 12h40 e as 13h25.

Ao contrário de quem funciona na base dos “arredores”, a verdade é que em escolas onde se privilegiam os critérios pedagógicos e de rendimento, não se exige aos alunos que fiquem quase seis horas seguidas com aulas e sejam obrigados a tomar o pequeno almoço pelas 7.30 (ou antes) e a almoçarem quase a cair nas 14 horas. Haverá algum@ alun@ que dê algum rendimento que se veja depois de mais de 5 horas consecutivas em aulas? Se perto das 13.00 já estão perdidos de fome e cansaço, mesmo se entrarem pelas 8.30, o que dizer depois das 13.30 para quem entrou às 8.00?

Ahhh e tal… mas afinal, os alunos podem ter apenas 5 horas e entrar mais tarde ou sair mais cedo do que os pontos terminais da “matriz”?

Mas então, sendo assim, para quê este tipo de “argumentação”?

É só porque “toda a gente faz assim”?

Será mesmo toda? E será que é quem faz bem?

E será que os alunos têm mesmo interesse em gramar com seis aulas seguidas de 50 minutos?

Já agora… pessoalmente, eu sou daqueles que, tendo apenas dois tempos semanais da minha disciplina, os gostaria de ter divididos por dias diferentes, para não ver os alunos apenas uma vez por semana.

É que o pessoal de História/HGP não tem “desdobramentos” e tem de levar mesmo com as turmas inteiras na sala de aula, ali em quatro paredes, a tentar trabalhar quando a barriga ronca (discentes) e a energia se esvai (docentes). E então turminhas com 28 ou mesmo 30 alunos não dá para os mandar dar uma volta ao quintal para se cansarem e irem falar lá longe. Rendimento em 50+50 minutos em disciplinas teóricas? Só para rir… Tanto tempo a criticarem-se os 90 e agora…

Mas, claro, são gostos… embora eu prefir os que se baseiam em algumas “evidências”.

Duas Ou Três Notas Sobre A Aparição De Passos Coelho Na Campanha Da AD

Não tenho lido grande coisa – muito menos com jeito – sobre a aparição de Passos Coelho na campanha da AD a manifestar apoio a Montenegro. O que mais leio oscila entre um certo histrionismo do tipo “ai que a troika vem aí outra vez e vão-nos cortar tudo” e o “com o Cavaco e o Passos a apoiar isto esta no papo”.

(encontrei agora este artigo de Ana Sá Lopes com o qual concordo em boa parte, como se lerá)

Dando uma de Pacheco Pereira… parece-me que “a questão essencial não é essa e eu já explico”.

Comecemos pelo mais óbvio: Montenegro tinha de se “limpar” daquela espécie de comparação com Sócrates no debate com Pedro Nuno Santos e isto serviu como uma espécie de desagravo público e manifestação de afecto mútuo, mais ou menos encenado.

Mas há outras partes da coisa que parecem escapar a quem muito ergue fantasmas e exercita hermenêuticas sobre o que Passos disse ou não disse, sem perceber que ele apenas fez o que convém neste momento ao PSD (e à AD), em dois tabuleiros:

Em relação à “Esquerda” estimulou a polarização e dramatização da campanha, de certa forma obrigando a reacções em modo automático e previsível, servindo para, como contraponto, mobilizar o eleitorado da “Direita”, dita tradicional e que lhe deu duas vitóriasem 2011 e 2015, o que nem sempre é devidamente recordado. Porque a vitória de 2015, depois dos anos de chumbo da troika, não era muito previsível e demonstra que não estaria tão mal visto por muita gente como algumas mentes iluminadas gostaria,. Infelizmente? Sim, infelizmente, porque o Passos Coelho de outros tempo, desapareceu por completo há mais de uma dúzia de anos, como se agora apenas tivéssemos acesso ao invólucro físico (ou nem isso).

Em relação à “Nova Direita”, Passos surgiu a tentar recuperar parte do eleitorado que saiu do PSD por o sentir demasiado “centrista” e desorientado, em especial durante os anos de Rui Rio, algo que Montenegro ainda não conseguiu apagar, mesmo com as evidentes cedências nas listas de candidatos a gente que não passa de cobradores de fraque de favores, como se pode facilmente “observar” em figuras como o ex-assessor parlamentar do CDS e relações públicas do Observador para cativar articulistas em águas mais afastadas do esperado, na área da Educação. O que significa que Passos surgiu, não tanto para dar o sinal de abertura ao Chega, mas para esvaziar parte das causas de Ventura, tentando que voltem ao eleitorado do PSD/AD, quem dele se afastou nos últimos anos. Porque uma coisa é ter uma eventual relação de grandeza de 30-35% para 8-10%, outra da 25-30% para 15-18%. Ou mesmo pior.

Passos falou para “dentro”, para consolidar eleitorado, não para conquistar votos onde sabe que o PSD/AD não os conseguirá alcançar. O mítico “centro”, que ficou algo órfão, não se assustou com nada do que ele disse, porque o centro quer sossego e previsibilidade, assustando-se com empolgações. Portanto, a entrada passista na campanha, mais do que agitar fantasmas do passado, procurou agir sobre o presente, de forma a fazer o pessoal da Esquerda mais pavloviana hiper-valorizar a sua presença, ao mesmo tempo que tentou reduzir o espaço de manobra do Chega.

O que cumpriu. No meu escasso entendimento, nestes casos, o melhor que se pode fazer é demonstrar indiferença, desvalorizando a presença, como se fosse uma relíquia do passado, fora do seu tempo (até podiam usar as palavras do próprio), não um actor relevante no momento presente, sublinhando que recorrer a Cavaco e Passos é sinal de fraqueza e não de força de Montenegro. Deveria ter sido essa a resposta à esquerda. Dar demasiada importância à aparição é um erro táctico. À direita, Ventura sabe que Passos lhe pode roubar parte importante do crescimento que espera ter.. ele bem pode dizer que Passos foi dar uma lição a Montenegro… só que essa lição pode custar muitos votos ao Chega e isso não é necessariamente um mal. E Ventura tem consciência de que eventuais novas aparições de Passos, em especial se falar de causas próximas das do Chega, lhe podem levar milhares de votos. Os que a Iniciativa Liberal, por exemplo, já devolveu no seu processo de autofagia.

Pelo DOC SIPE

A primeira muralha contra a barbárie e o fanatismo

Não é por acaso que a etimologia grega da palavra “escola” (“scholé” ou σχολή, que nos chegou através do latim “schola”) a associa a um lugar ou tempo de lazer e recreio, pois o estudo, a reflexão, o convívio no sentido da transmissão ou troca de conhecimentos e ideias, estavam associados a pessoas de um estatuto social e económico privilegiado. A par disso, os gregos do período clássico não se preocupavam especialmente no ensino da sua cultura aos povos exteriores à Hélade, mesmo que sob o seu domínio, ao contrário dos romanos que faziam tudo por espalhar a sua, com destaque para a língua, que faziam ensinar a todos os habitantes dos territórios conquistados pelas legiões romanas.

(continua…)

Lamento se a minha visão da Educação continua a não se conformar com a mediocridade como critério suficiente para o “sucesso” de uma escola que se diz “inclusiva” e democrática, mas apenas o enuncia. Aliás, basta ver a prática de certos “democratas”, muito defensores da Escola Pública na teoria,mas muito pouco praticantes com a própria descendência. Com este ou aquele pretexto.

As minhas filhas fizeram o jardim-de-infância e a primária numa escola pública. E agora estão na Escola Alemã. E faço questão de explicar porquê. A opção pela Escola Alemã tem a ver com a opção por um currículo internacional. Para mim era importante que elas tivessem uma educação com duas línguas que funcionem quase como maternas, digamos assim. Se assim não fosse, andariam obviamente numa escola pública.

Este Mês, No JL/Educação

Desta vez, na versão impressa, colocaram as referências em notas de rodapé. No original, iam no corpo do texto, tal como a imagem que no dito cujo.

E se abordarmos este período de promessas pré-eleitorais de modo inverso ao habitual e, em vez de enunciarmos o que deve ser feito, apresentarmos o que não deve ser feito num novo ciclo de governação na área da Educação? Porque já se percebeu o esgotamento deste “paradigma”, para usar a novilíngua do neo-eduquês que preenche com terminologia pomposa, o vazio de realizações em efectivo prol das comunidades educativas. Infelizmente, a lista do “não deve” é longa e o que a seguir se elenca (outro termo que entrou na linguagem, enquanto se depilou a ortografia) é apenas uma amostra de tudo o que tem sido implementado, após teorização pouco substanciada, no quotidiano escolar.

Para começar, não se devem continuar a enganar alunos e famílias com a promessa demagógica e populista de que o sucesso está ao alcance de todos, sem especial esforço que não seja o imputado aos professores. Pouco é mais prejudicial para o interesse dos alunos do que dar-lhes a sensação de que o sucesso é um direito sem deveres e que a sua responsabilidade no próprio desempenho é quase o último parâmetro a ser considerado. Em especial quando é apresentada uma definição de “sucesso” com uma base puramente estatística e economicista. Ou quando essa definição é feita de um modo que condiciona a forma como se calcula o próprio “sucesso”.

Embora a pensar no Ensino Superior, a passagem seguinte ilustra como a investigação é condicionada pelos conceitos usados:

A forma como o sucesso é definido afeta quase todas as facetas do processo de pesquisa, bem como políticas e práticas, e em última análise, afeta os resultados dos alunos. As definições dos investigadores sobre o que é o sucesso afectarão como eles escolhem medir o construto, o que, por sua vez, terá impacto na forma como os dados são interpretados e, portanto, no que recomendações são propostas. (M. Weatherton e E. E. Schussler, “Success for All? A Call to Re-examine How Student Success Is Defined in Higher Education” in CBE—Life Sciences Education, Primavera de 2021, p.2)

Não devem eliminar-se, sem demonstração sólida, as provas de regulação e avaliação externa das aprendizagens, sob risco de ficarmos numa terra de ninguém, onde vale tudo e nada tem valor. Os argumentos, contra a existência de provas externas com impacto no aproveitamento dos alunos, baseiam-se numa espécie de profissão de fé que raramente tem consistência empírica, para além dos indicadores quantitativos de mais transições, sem qualquer verificação das aprendizagens realizadas de acordo com um padrão comum. Os resultados das avaliações externas internacionais mais recentes demonstram como a queda no desempenho dos alunos portugueses foi a par da erosão da avaliação externa e afirmar que a queda dos resultados se deve à pandemia e seguiu a média da OCDE, é enganador.

“Estas perdas — como mostram os resultados de outros estudos internacionais, nomeadamente o TIMSS 2019 e o PIRLS 2021 — já se observavam antes do encerramento das aulas presenciais resultante da Covid-19. Notavelmente, Portugal era até 2015 o único membro da OCDE que revelava um crescimento positivo na literacia dos seus alunos de 15 anos. Esta tendência inverteu-se de 2015 para 2018, para a leitura e as ciências, e em 2022 para a matemática. (…) as estimativas de perda de literacia 2015-2018 foram, em média, de 1.7 pontos PISA/ano, tendo duplicado para 3.4 pontos/ano entre 2018 e 2022. A pandemia da Covid-19 agravou, para o dobro, o efeito negativo da política educativa em curso. (João Marôco, “Confinamento COVID-19: O vilão das perdas de aprendizagem dos alunos?”, Iniciativa Educação, 9 de Fevereiro de 2024, artigo online)

Não deve continuar a retalhar-se o currículo, sacrificando o tempo destinado à transmissão do Conhecimento, em favor da propagação de modas ou crenças passageiras, sem fundamentação científica, como se tudo fosse equivalente e o relativismo fosse a regra. Não devem misturar-se como equiparáveis, em alunos com 10-12-14 anos, princípios de prevenção rodoviária com a aprendizagem de uma História não retalhada ou uma introdução ao empreendedorismo com a compreensão de conceitos fundamentais das Ciências Naturais. O currículo do Ensino Básico não pode ser refém de epifenómenos conjunturais que seduziram este ou aquele decisor político.

Não deve manter-se um regime de gestão e administração escolar que é profundamente anti-democrático na sua essência e práticas, aos mais variados níveis. Seja no do poder hierárquico da tutela sobre os directores, seja destes em relação ao pessoal docente, não esquecendo que as lideranças intermédias passaram a ser pré-escolhidas, seguindo-se uma “eleição” em formato de cosmética, um pouco à semelhança do processo de escolha da pessoa que centraliza em si a Direcção Executiva, a presidência dos Conselhos Pedagógico e Administrativo, assim como da Secção de Avaliação do Desempenho Docente e ainda a presença no Conselho Geral das organizações escolares.

Do mesmo modo, não deve manter-se uma completa incoerência entre os princípios que se proclamam sobre a necessidade de transparência e rigor na avaliação dos alunos e o arbítrio na avaliação do pessoal docente, entregue a uma lógica fechada e quase impermeável a uma verificação externa independente em relação aos abusos e más práticas a que os serviços centrais do Ministério da Educação, em regra, dão cobertura. O actual modelo de avaliação dos professores, que resulta de uma deriva burocratizante, é perverso e apenas conduz ao desânimo crescente de quase toda a classe docente. O fenómeno não é exclusivamente nacional, existindo vários estudos que quantificam o sentimento de desrespeito percepcionado pelos professores:

Uma conclusão consistente da investigação é que a satisfação profissional dos professores está ligada ao seu sentimento de ser respeitado. Na pesquisa MetLife de 2011, por exemplo, 77% dos professores perceberam que as suas comunidades os tratavam como profissionais e 59% estavam muito satisfeitos com os seus empregos.

É, portanto, preocupante que o [actual] inquérito tenha constatado que apenas 46% dos professores sentem que o público em geral os respeita e os vê como profissionais.” (1st Annual Merrimack College Teacher Survey: 2022 Results, EdWeek Research Center, p. 6, online)

Quase a finalizar, é impensável manter uma lógica de hiper-burocratização do trabalho dos professores que retira horas e horas ao trabalho com os alunos, enfatizando a representação do acto pedagógico à sua efectiva realização e demonstrando uma extrema desconfiança em relação à profissionalidade docente no que se relaciona, muito em especial, ao acompanhamento e avaliação do desempenho dos alunos. No mesmo estudo, apresentam-se dados similares ao sentimento de grande parte dos professores portugueses quanto ao uso do seu tempo profissional.

Em geral, a maioria dos professores afirma que gostaria de passar mais tempo em atividades diretamente relacionadas ao ensino (planeamento, instrução) e menos tempo em tarefas mais auxiliares (trabalho administrativo, interações não docentes com os alunos, como tarefas de “sala de espera”, orientação e aconselhamento) . Esta sensação – de que se gasta demasiado tempo neste trabalho periférico, combinada com a realidade de que a maioria dos professores diz não ter controlo sobre o seu tempo e quase metade percebe que não tem controlo sobre o currículo que ensinam – levanta preocupações de que o ensino se está a tornar uma atividade desprofissionalizada, na qual os educadores são tratados cada vez mais como funcionários à hora, com autonomia limitada. (Holly Kurtz, “A Profession in Crisis: Findings From a National Teacher Survey”, EdWeek Research Center, 4 de Abril de 2022, online)

Mais do que não dever, não se pode continuar no caminho da desqualificação académica da profissão docente, como se a irresponsabilidade com que se tratou a gestão dos recursos humanos na Educação ao longo dos anos, possa justificar um novo modelo de formação de docentes que privilegia a rapidez à qualidade e o simplismo ao rigor. O que recentemente se apresentou como diploma regulador das habilitações para a docência é um recuo enorme, de várias décadas, em relação às exigências de natureza científica para se ser professor, como se leccionar uma qualquer disciplina resultasse quase em exclusivo da vontade para o fazer.

Pior do que fazer algo mal, é insistir no erro, quando as evidências nos demonstram à saciedade que o caminho não tem sido feito no sentido correcto e é indispensável, para o interesse primeiro dos alunos, mudar de rumo.

Confirmo, Apenas Com Uma Pequena Errata!

Até porque o jornalista gravou tudo, bem gravadinho, e tudo o que digo, incluindo algumas bocas mais rasgadinhas, fica em regra em on. Claro que disse mais, mas… o espaço em papel é finito.

Corrigi algo que pode ter sido ouvido de forma errada. Falei no IGeFE e não IGEP.

Propostas dos partidos para a educação são “jogo de oportunismo político”

No momento em que quase todos os partidos já divulgaram os seus programas eleitorais – à exceção do PS, que divulga durante esta tarde, e o PAN, que deverá dar a conhecer as suas propostas nos próximos dias – é possível traçar um mapa das intenções políticas para cada setor. No que diz respeito à educação, o DN ouviu professores que, para além de interessados nas suas causas, conhecem os sistemas por dentro. “Quer o Rui Tavares, quer a Inês de Sousa Real, na esperança de serem agradáveis ao PS, esperam pela posição do PS, e este não quer romper, abertamente, desde já, com o que foi feito até agora”, afirma o professor de história do segundo ciclo Paulo Guinote, sobre os líderes do Livre e do PAN, respetivamente, e a sua perspetiva quanto ao calendário para a reposição do tempo de serviço dos professores, que, dizem, dependerá do relatório que será produzido pela Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO).

A origem desta questão remonta ao debate da passada sexta-feira, na RTP, que opôs o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, ao fundador do Livre, Rui Tavares. Ambos concordaram que só poderiam definir um período para a reposição do tempo integral de serviços dos professores depois de conhecerem o relatório da UTAO. 

“A UTAO não fez o estudo até agora porque não quis, porque não quis envolver-se no debate político e não quis fornecer dados que o Ministério [da Educação] tem em seu poder, seja no IGEFE [Instituto de Gestão Financeira da Educação], seja na DGAE [Direção-Geral da Administração Escolar], porque todos os meses são processados salários e o Ministério tem na sua posse os elementos mais do que suficientes para fazer um estudo num par de semanas”, continua Paulo Guinote, acrescentando que “o estudo da UTAO não foi feito por questões de oportunismo político”.

“Em segundo lugar, quer o PS, quer o PAN, quer o LIVRE, que me parece uma espécie de geringonça, uma neo-geringonça, optaram pela mesma posição, que é esperar pelo estudo da UTAO para definir uma posição”, defende Paulo Guinote, lembrando que “Pedro Nuno Santos, antes disso, já disse tudo e mais alguma coisa acerca desta questão. Ou seja, ele já garantiu que o tempo seria recuperado, depois começou a hesitar, depois voltou a dizer que sim e agora voltou a hesitar. Digamos que a posição do LIVRE e do PAN a mim não me influi muito, eles apenas estão à espera da posição do PS”, remata.

(…)

Para além do próprio sistema educativo e das condições em que a profissão de professor é exercida, a atratividade para esta via também tem sido abordada pelos partidos. No entanto, para introduzir o tema, há uma proposta, avançada pela Iniciativa Liberal no seu programa eleitoral que pode dar o mote para o seu próprio contraponto: o cheque-creche, que, de acordo com o partido iria permitir aos pais das crianças escolher o jardim de infância, seja no setor público ou no privado.  “O cheque-creche já falhou numa série de países, não diminuindo as desigualdades e apenas servindo para suprir alguma parte do orçamento familiar de quem quer ter os filhos num ensino privado”, explicou Paulo Guinote,  classificando esta proposta como “um mito, porque as creches e as escolas privadas selecionam e têm essa capacidade e legalmente não podem ser impedidas de fazer uma pré-seleção dos alunos e das crianças que querem admitir nas suas instituições”. “Portanto, o cheque-ensino e o cheque-creche, especialmente para os alunos mais carenciados, nas zonas mais complicadas, com menos meios económicos, é apenas a promessa de uma ilusão de que eles vão ter acesso a algo onde depois não são aceites”, continua o professor de história, que alerta para outro problema: “A falta de professores.”

“Se há falta de professores, como é que o ensino privado, que paga em regra pior, vai conseguir ter professores ou educadores para essas crianças que afluiriam teoricamente às suas instituições, a menos que passassem a recrutar um bocado de forma ad-hoc”, questiona Paulo Guinote, de forma retórica. “A menos que, de repente, eles começassem a pagar melhor e a dar melhores condições de trabalho a essas pessoas. Caso contrário, apenas o que existe é, volto a dizer, uma promessa ilusória que deslocará verbas, eventualmente do Ministério da Educação, para algumas famílias, mas que em muitos casos, e provavelmente nos casos de maior necessidade, terão que voltar ao ensino público”, defende.

Centrando o tema da educação em torno dos professores, um dos problemas identificados é precisamente os baixos salários no setor. “A questão salarial da carreira depende da carga fiscal, ou seja, formalmente os professores até podem ter salários brutos muito atrativos, aparentemente atrativos, mas depois a carga fiscal é brutal”, sublinha Paulo Guinote, propondo, por exemplo, que haja deduções em sede de IRS no que diz respeito a alojamento, Propostas dos partidos para a educação são “jogo de oportunismo político”no caso dos professores deslocados, e combustível.