Mais Um Professor Arguido

Testemunho enviado pelo colega “arguido”, professor na cidade de Setúbal. A dias do mês de Abril. Por Oeiras não se passou algo muito diferente.

Como em 2008 e 2009, sinto que existe uma forma pouco subtil de intimidação, quiçá da tal “claustrofobia democrática” que alguns já esqueceram. Quem nos livra de um qualquer “cidadão denunciante” nos lixar a vida com uma queixa a que o MP até venha a dar ouvidos’ Já me aconteceu…

Quanto ao “denunciante” deste caso, espera-se um xalente na sua avaliação.

Eu professor, sou arguido!

Pois é, caros colegas. Finalmente vou ter direito aos meus 15 minutos de fama que Andy Warhol advogava para todos os cidadãos!

A história resumida:

Fui convocado para prestar declarações na Esquadra de Investigação Criminal de Setúbal, ontem pelas 17.00h. Como cidadão cumpridor que sou, compareci 15 minutos antes da hora, acompanhado pela respetiva identificação civil.

Atendido de forma cordial pelo agente responsável, fiquei a saber ao fim de poucos minutos, ter sido denunciado por um elemento das forças policiais (não me foi facultada a sua identificação). E fui denunciado por que motivo? Já lá vamos…

Muito bem! De facto, organizei uma marcha de professores pelas ruas da cidade, no passado dia 15 de dezembro de 2022, acompanhado por umas dezenas de voluntariosos profissionais da educação.

Ter-me-ei eu, esquecido de informar alguma das autoridades competentes, acerca da realização desta iniciativa, perguntam vocês! Pois, também eu me questionei, pois era a primeira vez que organizava semelhante evento!

A informação que me tinha sido fornecida uns dias antes, por um ilustre deputado da Assembleia Municipal desta cidade, tinha sido a da necessidade de informar (não é pedir autorização!) a PSP e os serviços camarários, coisa que fiz, tendo inclusivamente, um simpático agente, perguntado se já tinha enviado a informação para a Câmara Municipal, o que confirmei.

No dia da referida marcha, fomos acompanhados por um número significativo de agentes da PSP, que nos prestaram todo o apoio e deram inclusivamente, sugestões sobre o percurso a realizar.

E então? Perguntam vocês – de que crime estou eu a ser acusado?

O crime parece que se designa de “desobediência”, por ter desrespeitado um tal de artigo 4.º do Decreto-Lei 406/74 de 29 de agosto. E o que diz o artigo citado? “Os cortejos e desfiles só poderão ter lugar aos domingos e feriados, aos sábados, depois das 12 horas, e nos restantes dias, depois das 19 horas e 30 minutos”. Repita-.se a passagem para que fique bem registada:

“Os cortejos e desfiles só poderão ter lugar aos domingos e feriados, aos sábados, depois das 12 horas, e nos restantes dias, depois das 19 horas e 30 minutos”.

Ora, este Decreto-Lei está inserido num diploma que “Garante e regulamenta o direito de reunião” e foi promulgado durante um período de governação muito particular em termos históricos, que foi o período pós-revolucionário de abril de 74, em que as funções executivas estavam atribuídas ao Movimento das Forças Armadas, vulgo MFA.

Interessante artigo legal invocado pelo Ministério da Administração Interna! Porém, estou baralhado com uma coisa e, se calhar, vocês também… Se todos os participantes na dita “Marcha dos professores” foram acompanhados pelos garbosos agentes da PSP, qual o estranho episódio de “desconhecimento ou amnésia coletiva” que terá afetado os mesmos, ao ponto de nenhum deles me ou nos informar, que estávamos a desrespeitar a lei?

Pelo exemplo atrás descrito, fica aqui o meu conselho para todos os organizadores das “Marchas do Coração”, “Marchas da Diabetes” e outras tantas que, todos os anos povoam as ruas das nossas cidades:

Preparem-se para receber intimações, notificações e outras formas de comunicação judicial, para serem ouvidos pelas autoridades policiais e até, talvez, pelo Ministério Público, por organizarem marchas em dias úteis, antes das 19.30h…

Um professor de Setúbal

11 opiniões sobre “Mais Um Professor Arguido

  1. Os xuxas medíocres, incompetentes e corruptos que tudo fazem para livrar Sócrates dos tribunais andam a perseguir quem trabalha.
    Estamos prestes a voltar ao tempo do padrinho do marcelo.
    Estes xuxas são os principais aliados e culpados da subida do CHEGA, tudo fazem para que o CHEGA aglutine votos à direita, sabem que assim fica mais difícil para o PSD.
    Os democratas cada vez em menor número que ainda existem no partido xuxa têm a mordaça na boca porque vivem dos tachos que o partido lhes arranja.
    Pobre país. Pobre povo. Roubado e vilipendiado por uns pulhas. Comem “porrada” e calam-se. Pior, na hora do voto, esquecem que estes GATUNOS é que os fazem pobres.

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  2. Tresli o título, de início: li “Mais um professor agredido”. Depois, porque o texto não se quadrava com tal título, reli-o e percebi a confusão que fizera. No entanto, o assunto efevtivo não é menos grave do que o suposto assunto que me motivara para a leitura no começo. Parece que, para os professores, a constituição está suspensa: multiplicam-se os atentados ao direito à greve, à manifestação, à segurança no local de trabalho, à estabilidade no emprego.

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  3. Nos últimos 28 anos tivemos duas desgraças que explicam isso: dois anos e meio de Tanga e quatro anos Além Troika.
    Mas nem tudo é mau: temos garantidos mais quase quatro anos de…
    de…
    disto.

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  4. O colega escusa de estar preocupado com as outras marchas…Obviamente que o o Ministério da Administração Interna só está preocupado com os arruaceiros dos professores! 😦

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  5. Interessante🤔 todos os anos se fazem caminhadas pelo coração…desfiles de carnaval…etc-organizados pelas escolas e desconhecia por completo essa lei !!!!

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  6. Sinto que cada vez há mais professores do espectro político que vai da esquerda até à direita com um sentimento de ódio visceral ao PS. Começo a sentir-me perseguido. Estão a tentar amedrontar os professores. Espero que resistamos de forma inteligente e assertiva até derrotarmos esta gente.

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  7. Ao ler, nem sei se rir, se chorar…

    O professor cometeu um crime gravíssimo, uma dezena de professores são uma verdadeira ameaça à ordem pública! Sim senhor, neste pais zela-se pela segurança e respeito pela lei como em nenhum outro. Estou encantada com esta eficiência.

    Teremos, brevemente, ações de formação para tornar extensivo este zelo pelo cumprimento das normas! As boas práticas devem ser difundidas. Venham uns dinheiritos a UE, formadores já temos!!!!

    Haja paciência!

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  8. Colega, tem a minha, melhor escrevendo, tem a solidariedade da maioria esmagadora da classe docente. É triste, saber que se questiona a “legalidade” das greves que estão previstas na lei, em vez de se questionar “as razões do (nosso) descontentamento?”.
    O(s) colega(s) não levava(m) armas? Não, levavam as armas da “razão”, da “indignação”, da “insatisfação” e da “reivindicação, alusivas não só aos 6 Anos, 6 Meses e 23 Dias (trabalhados) entre outras causas nobres, tais como a “Defesa da Escola Pública”!
    Intimidação? Persecução? Amedrontamento? Alerta? Aviso à navegação?
    Quem trata assim os professores/educadores, está a desrespeitar, a “mãe de todas as profissões”, e precisa de uma saudável reciclagem democrática.
    Parabéns pela coragem em expor o seu caso.
    Estou (estamos) consigo!

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  9. Desde 2008 que proclamo que não há democracia na tugalândia mas uma ditadura ‘travestida’. Conhecem a citação do Lampedusa, “É preciso mudar algo para que tudo fique na mesma”? ‘Cai que nem uma luva’ no regime tuga, cujo 25 de abril foi uma utopia…

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