6ª Feira

Pouco ou nada mudou em seis meses. O primeiro ministro insiste em mentir sobre os encargos que as reivindicações dos professores implicam e sobre a “justiça” ou “equidade” em relação a outras carreiras em entrevistas controladas, nas quais não se mobiliza a informação disponível sobre o tema. O ministro da Educação continua a mentir sobre a forma como as negociações têm decorrido e sobre a substância das medidas tomadas, usando a linguagem de forma cada vez menos dúbia e mais manipuladora da opinião pública. Os membros da sua corte política e pessoal – embora de forma menos pública do que em outros momentos – amplificam a sua argumentação truncada e “inexacta”, para não coloacr a coisa em termos mais explícitos. O actual presidente do CNE debita chavões com meio século e chama-lhes “inovação”, clamando um amor extremo pela Escola Pública, enquanto omite a sua passada ligação a grupos privados: claro que o presidente do CNE pode ter o trajecto que bem entenda… o que é menos compreensível é a cosmética que lhe aplica. A formação contínua de professores está completamente instrumentalizada e colocada ao serviço de cliques académicas que se ramificam pela oferta e pela certificação dessa mesma oferta.

O clima que se vive é de claustrofobia e tentativa de abafamento de qualquer debate ao vivo e a cores, preferindo-se proclamações públicas ou conferências de imprensa sem contraditório. Nos bastidores denigrem-se as vozes críticas com falsos pretextos ou coisas piores. Na informação, distorce-se quem faz o quê, alimentando-se a demonização de uma organização, com o apoio dos que em outros tempos sofreram isso, mas agora parecem pouco incomodados em colaborar num processo que antes criticavam. Tenta cortar-se a possibilidade de alternativas, para criar uma sensação de desânimo ou atitudes de maior desespero.

Como já escrevi, a armadilha está lançada para que a “radicalização” surja como necessidade imperativa em alguns discursos e propostas, por vezes a partir de agentes provocadores que se inserem nos grupos de professores para os minar, sacar informações e tentar influenciar a sua acção. Nada de novo. Em 2008, viveu-se isso, só que num ritmo menos acelerado, menos fragmentado na rede de contactos. Surgem os maiores disparates, as ideias mais mirabolantes, antes de serem, sequer, discutidas em pequeno grupo antes de serem lançadas para consumo generalizado. A desorientação cresce, à medida dos desejos da tutela e da máquina mediática do governo, que acha que a passagem do tempo está do seu lado.

Ler o mundo que nos rodeia é mais do que reagir de forma epidérmica, embarcar em coisas impraticáveis ou que podem parecer giras, Há que apostar na eficácia, sabendo que ela não é de curto prazo. Há que saber quando inflectir tácticas, mesmo mantendo o mesmo objectivo final. Há que perceber que não existem soluções únicas ou mágicas. Há que entranhar que a situação é complicada e que a diversidade de olhares é importante, sendo igualmente importante filtrar o essencial do acessório.

É importante que não se confunda imaginação com repetição do que já foi novidade. Há que saber surpreender, pelo inesperado. Isso não se consegue em dias ou semanas, mesmo se não podemos esperar pelo fim do ano lectivo, porque depois há quem vá a banhos, para as mesmas praias, tudo voltando ao remanso.

Nada disto apresenta soluções instantâneas? Claro que não. até porque não acredito que existam, em especial no contexto que vivemos, de pura ficção política.

9 opiniões sobre “6ª Feira

  1. Tudo tudo isso.
    Revejo-me em tudo o que dizes, tanto que até temo que me vejam como seguidista ahahah
    Mas, não, dá-se é o caso de saber bem do que falas e também o saber na prática.

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  2. Concordo e acrescento. O último reduto de resistência está aí à porta e começa em maio em regime digital. O disparate é de tal monta que se exige um murro na mesa independentemente do contexto de luta. Aderir acriticamente é compactuar, eu cá se tiver de fazer é sob protesto e com pedido de escusa de responsabilidades.

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  3. Queixa em instâncias europeias pela falta de equidade no tratamento dos profs (recuperação do tempo de serviço) e queixa nos tribunais nacionais por violação do direito à greve com serviços mínimos abusivos. Tudo o resto (desculpem-me o francês e as pessoas boas, com ótimas intenções que dinamizam outras iniciativas) é apenas folclore…

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  4. Excelente retrato da situação no actual momento. As perspectivas não me parecem muito positivas. Há no entanto, duas linhas de acção que devem ser consideradas doravante: 1. Fim das disputas entre organizações, formais ou informais, que dizem defender os interesses da classe dos professores (se fizerem muita questão nisso, ajustem as contas depois. No imediato ninguém quer saber do tema); 2. Operacionalização (sem falhas de planeamento a nível legal e comunicacional) da greve ao último tempo do dia e às actividades de carácter não curricular.
    De resto, é arregimentar as presenças mais marcantes entre os docentes na televisão e conquistar as chefias das redações noticiosas (digo isto pela simples razão de que os jornalistas não gostam dos professores — facto não explicável em poucas linhas e difícil de contornar dado que não dispomos de meios para contratar uma agência de comunicação, tal como faz o governo, com os honorários pagos por todos nós).

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    1. Há nas chefias de algumas redacções uma animosidade em relação aos professores que muito protestam, porque a classe dos jornalistas, depois de um apogeu material muito forte, experimentou uma crise – que ainda existe – com uma redução de encargos por parte das empresas que preferiram apostar no entretenimento e opinião.

      A sua irritação anda mal direccionada, quando se vira contra os professores.

      Em outros casos, são mesmo problemas pessoais de quem acha que, em tempos, percebeu o que era ser professor.

      Pode dizer-se em mais linhas, mas parte do essencial nasce daqui.

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