Não gostei mesmo nada da estratégia de tomada do poder no PS pelo António Costa. E nunca lhe augurei grandes coisas, ao contrário daqueles que o empurraram, do centro à direita, para a liderança do PS logo que o Seguro não aceitou a proposta cavaquista de eleições antecipadas em troca do centrão.
E esse foi o primeiro momento-chave de Costa, quando o empurraram para o topo, anunciando-o como o messias que não era, mas que ele acreditou ser, com o apoio mediático indispensável e os compromissos bem preparados para o cenário pós-eleitoral.
Que se ganhasse com maioria absoluta seria primeiro-ministro absoluto, só não lhe dizendo que tudo estava preparado para que, subitamente, os “indicadores” aparecessem maravilhosos, a devolução da sobretaxa surgisse milagrosamente do nada e tudo se inclinasse para um de dois desfechos eleitorais diferentes do prometido: ou uma vitória com maioria relativa que levaria a turbulência no PSD e a uma eventual sucessão amigável para o PS, com o tal governo de aceitação central, ou a derrota que aconteceu, reservando-se a Costa e ao enfraquecido PS o papel de muleta do governo da coligação. Em qualquer dos cenários, verificar-se-ia a vitória, com benção balsâmica, da tese cavaquista de meados de 2013.
Esgotado Seguro, seguir-se-ia Costa para o papel de companheiro de estrada. Sempre com Assis como reserva.
O segundo momento-chave de Costa é quando, ainda na campanha eleitoral, percebe que vai perder e que se fizesse o esperado papel de muleta de uma coligação sem maioria absoluta, ficaria para a História como uma nota de rodapé do parágrafo reservado a Passos Coelho e Paulo Portas.
E então Costa decide romper com os compromissos esperados, lutar pela sobrevivência e pelo seu próprio parágrafo na História, anunciando desde logo o voto contra um qualquer programa de governo da coligação, o que exacerba o confronto e ameaça as tais pontes do costume sobre o centrão político.
Consumadas as eleições, a aritmética parlamentar acaba por entalar todos os partidos que tinham dito de um governo de direita o que a OMS não disse das salsichas e deixa-os com uma margem de manobra bem mais pequena do que se quer fazer crer, do PS de Costa ao PCP, passando pelo Bloco que, cedo, percebeu que era seu – e não de lebres apressadas – o tempo de avançar. Quem se encolhesse ficaria com o ónus da viabilização da continuação do governo mais de Direita dos últimos 45 anos (sim, 45 anos).
O Costa pode ter muitos defeitos e está longe de ser o líder cheio de qualidades que, em tempos, muitos dos que agora o criticam nos quiseram fazer acreditar. Mas tem uma qualidade, certamente ditada pela ambição política, que é a de ter percebido que os compromissos em que se enredara de forma implícita se destinavam apenas a manietá-lo.
O que agora se passa com ele – e só assim se explica que o tratem, do lado da direita, como traidor – e com a imensa promoção de alguma comunicação social às pretensas qualidades de Assis, apenas replica – com alacridade acrescida – o que se passou com Seguro quando não foi na conversa de Cavaco. A diferença é que Assis parece mesmo convicto dos tais compromissos responsáveis que se teceram nos bastidores, desde 2009, para que o PS ficasse sempre na zona de conforto alheia.